O crescente êxodo de jovens agricultores para os centros urbanos faz o número de propriedades sem sucessores crescer após a aposentadoria dos pais. As áreas são vendidas a terceiros para se tornarem campo extensivo de gado de corte, grãos ou viram sítios de fim de semana.
Conforme índices do Censo Agropecuário do IBGE, os produtores com mais de 65 anos passaram de 17,5% para 23,1% em 11 anos, enquanto o número de jovens decresceu – de 1,9% para 1,2% na faixa etária de até 25 anos. Na região, existem apenas 4% de jovens com idade abaixo de 30 anos nas propriedades.
A redução nas propriedades alcança 17,5% em comparação com 2006. São mais de cinco mil a menos nos últimos 11 anos. De 27,7 mil, caiu para apenas 22,9 mil.
A cada cinco pessoas que trabalhavam no meio rural há 11 anos, uma deixou o campo no RS. Diogo Tormest (foto de capa), 18, de Alto Conventos, Lajeado, faz parte desta realidade.
A família, natural de Farroupilha, onde trabalhava empregada em pomares, se mudou para uma área de um hectare faz três meses. Apostam na produção de hortigranjeiros.
A instabilidade do preço e das vendas fez Diogo buscar emprego na cidade. “Não queria ter a vida sofrida dos meus pais. Trabalhar debaixo de sol e chuva, sem incentivos e valorização. Prefiro ser empregado, ter o salário garantido todo mês, direito a férias e décimo terceiro, sem depender das condições climáticas para obter lucro”, avalia.
A mãe Neninha, 49, apoia a decisão. Além de Diogo, os outros dois filhos do casal decidiram sair da propriedade. “Não temos como garantir um rendimento fixo para eles ao mês. Plantamos, mas nem sabemos se vamos conseguir vender. Inexistem projetos para oferecer aos jovens a oportunidade de ficar. Só permanecem aqueles com estrutura e capital, sem depender dos incentivos públicos ou de empresas”, comenta.
De volta ao interior
Tiago Flach, 27 anos, de Poço das Antas, é proprietário de uma agroindústria de cachaça. Está feliz com a decisão que tomou há três anos: voltar para o interior. Ele havia se mudado para Caxias do Sul, onde se formou em Administração pela Universidade de Caxias do Sul (UCS). Estava empregado, mas se deu conta de que não era bem o que queria. “Sentia saudades tanto de estar com a família quanto de botar a mão na massa na roça”, explica.
O desejo ganhou mais força quando ele conheceu o atual sócio, que também queria retornar para casa. Juntos, procuraram a Emater e decidiram abrir o próprio negócio. “A gente tinha o apoio da família, mas precisava de orientação técnica e jurídica. Graças a Deus, deu tudo certo. Eu vou dormir bem cansado, mas hoje sou um cara muito feliz”, resume com um sorriso.
“Ficamos sozinhos”
A mesma realidade é vivenciada pelo casal Dalci, 61 e Lelia Coberllini, 63, da Linha Sete de Setembro, interior de Sério. As duas filhas saíram para estudar e nunca mais voltaram. Trabalham no ramo imobiliário em São Paulo.
Os pais “penduraram as enxadas”. A área de 130 hectares foi reflorestada com eucaliptos, cedro australiano e erva-mate. O aviário foi desativado por falta de mão de obra. Do leite é produzido queijo e a criação de suínos ajuda a complementar a renda da aposentadoria. “Produzimos apenas mais nossos alimento”, comenta Dalci.
Embora lamente a decisão das filhas, entende ter sido a escolha certa. “Aqui não tem emprego”, argumenta. A cidade perdeu desde o ano passado 198 habitantes, o maior número das 38 cidades do Vale do Taquari.
Gestão e conhecimento
Para Fernanda Sindelar, graduada em Ciências Econômicas, mestre em Economia pela PUCRS e doutora em Ambiente e Desenvolvimento pela Univates, é necessário que os pais incentivem os filhos a permanecer nas atividades e permitam que, desde cedo, participem da gestão. “Observamos conflitos de gerações. Os jovens têm visões alternativas e, quando não podem implementá-las, sentem-se frustrados e desistem”, constata.
Para ela, diante das exigências do mercado, apenas se mantêm as propriedades administradas como empresas rurais. “Nem todas elas estão preparadas ou dispostas a fazerem inovações na gestão e nos processos produtivos. Quem não se adequar tende a ser excluído”, aponta.
Segundo o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lajeado, Lauro Baum, a evasão dos jovens na produção primária cria oportunidades para os que apostam de forma planejada permanecer na atividade. “Agregar valor, ter qualidade e procedência garantida é o caminho. A profissionalização é uma consequência para ter retorno financeiro”, opina.
Baum diz que a tecnologia, alicerçada ao conhecimento, cria oportunidades para atender nichos de mercado, principalmente na produção de alimentos.
Segundo o gerente regional da Emater/RS-Ascar de Lajeado, Marcelo Brandoli, o índice de sucessão na região é de apenas 4%. Entende ser necessário diversificar, buscar formação, garantir acesso ao crédito e agregar valor à matéria-prima. “O produtor do futuro terá que ter conhecimento, ser um profissional de excelência. Aos pais, cabe dividir as funções, delegar o poder e dialogar, para que os filhos possam ficar”, ensina.