“O povo condena os outros sem saber a história real”

Lajeado - DISCURSO DE ÓDIO

“O povo condena os outros sem saber a história real”

Mauro Gonçalves foi acusado de abandonar um cão no canil municipal. Um vídeo foi compartilhado na internet e ele passou a sofrer ofensas e críticas

“O povo condena os outros sem saber a história real”
Lajeado

Como costuma fazer aos sábados, Mauro Gonçalves, 42, colocou a filha de 2 anos na cadeirinha na frente da bicicleta e, junto do filho de 9 anos, saiu para pedalar nas imediações de onde mora no bairro Conventos, distante 200 metros do Canil Municipal.

Seria mais um dia de pedalada em família, quando Gonçalves viu um Corsa azul indo e voltando no entorno do loteamento onde ele passeava com os filhos.

“No início achei que eram jovens usuários de drogas procurando um local afastado da cidade para fazer essas coisas”, conta.

No entanto, quando viu o veículo desaparecer em direção à avenida Benjamin Constante, Gonçalves constatou que eles haviam ido até o loteamento para abandonar uma filhote de cachorro de cerca de 90 dias.

Por volta das 15h, perdida no bairro, a cachorrinha veio na direção de Gonçalves.

A trama

“Filhos, vamos subir no Canil Municipal porque lá tem um tio que vai ficar com essa filhote”, disse Gonçalves para as crianças.

Junto da família, decidiram batizar a cachorrinha de Bolinha. E assim foram chamando a filhote durante o percurso que fizeram do loteamento até o canil.

Gonçalves cogitou, inclusive, ficar com Bolinha, tamanho afeto os filhos demonstraram pelo animal. Mas como trabalha como técnico em Abate de Animais e Inspeção Sanitária e viaja muito achou melhor deixá-la aos cuidados de quem tivesse mais tempo.

Ao chegarem em frente ao Canil Municipal, um vigilante disse que não poderia receber o filhote no local. Sem saber o que fazer, Gonçalves pediu algumas sugestões de telefone ao guarda para conseguir solucionar o problema.

Primeiro tentou com a Brigada Militar, depois o Corpo de Bombeiros, uma senhora de uma ONG de proteção animal e, por último, pediu a uma vizinha se ela não poderia ficar com a Bolinha pelo menos até segunda-feira.

Eram 17h, já havia se passado duas horas desde que Gonçalves iniciara a tentativa de salvar Bolinha.

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Câmeras do canil

“Tive a boa intenção de não deixar esse cachorro na rua. Ele poderia ser atropelado por um carro ou algo assim”, diz Gonçalves.

Decidido a voltar para casa, resolveu deixar a filhotinha dentro do canil.

“Vi um cachorro solto dentro do canil e umas casinhas, deixei ali e voltamos para casa”, conta.

No entanto, na terça-feira à noite, recebeu uma ligação da madrinha de sua filha.

“Estão detonando contigo no Facebook”, disse ela ao telefone.

Ao entrar em uma página da rede social, do programa Adote um Amiguinho, organizado pela Secretaria de Meio Ambiente, Gonçalves viu que pessoas comentavam sobre um vídeo da câmera de monitoramento e repudiavam o ato de ele ter abandonado um filhote no canil.

Diferente do que mostrava nas imagens, apenas Gonçalves e os filhos sabiam o que realmente tinha se passado naquela tarde. Entre os comentários, internautas o chamavam de “bandido”, “criminoso” e diziam que “os filhos iriam ser bandidos iguais ao pai”.

Com o apoio de testemunhas, como a Brigada Militar que atendeu ao encaminhamento de Gonçalves e da própria Secretaria do Meio Ambiente, sua inocência foi comprovada.

Ódio nas redes

“O povo condena os outros sem saber a história real”, desabafa Gonçalves. Segundo ele, tamanho foi o repúdio que recebera injustamente na rede social que até mesmo os filhos receberam ameaças de perseguição.

Ele afirma não ter interesse em abrir processo contra a prefeitura ou às pessoas que lhe ameaçaram ou ofenderam, porém, exige que o município se retrate sobre o caso.

“Quando uma pessoa chega ao Canil Municipal para ajudar, eles deveriam receber os bichinhos ou pelo menos orientar sobre o que fazer. Não foi o que presenciei com meus filhos na semana passada”, justifica.

Erro reconhecido

O coordenador do Centro de Controle de Zoonoses e Vetores (CCZV) de Lajeado, que administra o Canil Municipal, Juliano Pelegrini, afirma que a intenção do grupo ao postar o vídeo de Gonçalves foi de mostrar às pessoas que existem câmeras de monitoramento no local justamente para flagrar crimes de abandono animal.

“Nosso intuito não foi de acusá-lo. Por mais que ele tenha tentado agir de boa-fé. Já nos retratamos quanto a isso”, afirma Pelegrini.

Pelegrini orienta que, se alguém quiser auxiliar no encaminhamento de animais abandonados, procure uma ONG.

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(SEM LEGENDA)

Adote a Bolinha

Embora tenha chegado ao Canil Municipal como Bolinha, a cachorrinha foi registrada pela equipe da prefeitura como Fane. Com 90 dias de vida, ela é uma vira-lata dócil e amigável.

Se for adotada, será castração e receberá três doses de vacina e vacina antirrábica.

Além dela, outros 126 cães aguardam adoção no Canil Municipal, que enfrenta superlotação de pelo menos 25 cachorros.

Cristiano Duarte: cristiano@jornalahora.inf.br

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