História por trás das câmeras

Especial - Dos negativos à era digital

História por trás das câmeras

Empreendimento de Erhardt Meyer completa 45 anos no mesmo ponto comercial, na rua Júlio de Castilhos. Ele é o único fotógrafo na principal via de Lajeado. Relembra histórias de casamentos, batizados, festas populares, duas panes secas dentro de um ultraleve e a esquiva do ex-presidente da República, Ernesto Geisel

História por trás das câmeras
Lajeado

O sótão da acolhedora loja Fotocolor está abarrotado de negativos de rolos de filme. São milhares de fotografias acumuladas desde 1973, ano em que os irmãos Heinz e Gunther Meyer abriram o empreendimento e passaram a inovar a produção gráfica e fotográfica em Lajeado.

Antes do próprio negócio, os irmãos Meyer trabalharam para outro fotógrafo lajeadense. A experiência adquirida em casamentos, festas de debutantes, eventos sociais, políticos e esportivos diversos balizou a aventura de iniciar o próprio empreendimento. Erhardt começou a trabalhar no negócio da família no início de 1974, aos 13 anos. Nunca mais saiu.

“Quem iniciou estes 45 anos de história foram meus dois irmãos. Eu comecei aprendendo com eles, lavando fotos, secando fotos. Muito ou quase tudo que tem aí é obra deles.”

Os irmãos deixaram a loja sob o comando do caçula alguns anos depois da inauguração. Gunther foi morar nos Estados Unidos, em Miami. Heinz abriu um empreendimento semelhante na mesma rua, e expandiu o negócio com filiais em outras cidades da região. Ainda hoje, mantém uma loja H.Meyer na área central de Lajeado. Mas só a Fotocolor segue na Júlio de Castilhos.

Erhardt, aprendeu “na marra” a respeitar horários com o ex-prefeito, Alípio Hüffner. Hoje sente falta da sucessão familiar no comércio central de Lajeado e ainda celebra a nostalgia. “Filmava com Super-8 e fotografava clm filme de 36.” Ao lado, ele com 13 anos.

Erhardt, aprendeu “na marra” a respeitar horários com o ex-prefeito, Alípio Hüffner. Hoje sente falta da sucessão familiar no comércio central de Lajeado e ainda celebra a nostalgia. “Filmava com Super-8 e fotografava clm filme de 36.” Ao lado, ele com 13 anos.

“Direita. Esquerda. Para cima. Para baixo. Não pisca. Olha o passarinho!” Dentro da loja, Erhardt mantém as mesmas características de anos atrás. Simplicidade. Atendimento personalizado. E aquele cheiro dos antigos álbuns com as fotografias recém-reveladas das férias ou de um aniversário.

Mas os clientes mudaram, relata. “Antigamente, conhecíamos as famílias de quase todos que vinham aqui. Sempre rolava um bate-papo antes e depois das fotos. Hoje, com o crescimento de Lajeado, a impressão é que conhecemos menos pessoas. Éramos 30 ou 40 mil na década de 1970. Hoje somos quase 80 mil pessoas.”

“A fotografia perdeu o charme”

O serviço e os anseios dos consumidores também mudaram. “No passado, íamos para a praia com um filme de 36 poses. Era caro, tinha que pensar muito nas fotos. Hoje, nem câmera usam mais. Com um celular, é possível tirar mais de mil fotos em um só dia”, compara. A venda de rolos de filmes despencou. “Logo que vieram as digitais, as vendas caíram mais de 70%”, conta. “Hoje vendo cinco rolos por mês, no máximo.”

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Para ele, a arte de fotografar está “vulgarizada e banalizada”. Diz, também, que a fotografia perdeu o charme. “Antes se juntava a família, todos se arrumavam. As fotos tinham um propósito maior. Hoje, em qualquer churrasco, se faz 50 imagens, de tudo que é coisa, e pouco se guarda. Antes era coisa de artista. Mas não podemos lamentar. É o desenvolvimento tecnológico.”

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Duas panes secas. Uma queda

Erhardt já passou por maus bocados enquanto se aventurava na fotografia aérea. O primeiro susto aconteceu há mais de 15 anos. Ele estava de carona em um ultraleve e voando sobre o bairro Alto do Parque, em Lajeado. O objetivo era fotografar a Clínica Central, a pedido do então presidente Roque Lopes. Quando sobrevoavam a av. Alberto Müller, o motor desligou.

“O piloto, que era de Arroio do Meio, conhecido por Senhor Pardal, disse que ficou sem combustível. Por sorte, ele conseguiu planar, cruzar o Rio Taquari e ir até o aeródromo de Estrela, onde pousamos na contramão da pista”, conta. “As fotos ficaram boas”, acrescenta.

O segundo susto foi pior. Em agosto de 2008, também estava de carona em um ultraleve. Sobrevoava o bairro Florestal, na região próxima ao presídio. “Disse ao piloto que havia finalizado o serviço. Ele pediu mais uma foto no centro e, no momento em que tentou mudar de direção, o motor desligou. Eu, já com experiência, sugeri aplanar até uma roça, no bairro Coahb/Moinhos.”

A queda em meio a algumas árvores, em um antigo descampado próximo à rua Carlos Spohr Filho, destruiu toda a pequena aeronave. Erhardt machucou a coluna. “Ele aplanou. Mas a asa bateu em uma árvore e o aparelho girou e se quebrou todo. Eu senti uma dor na coluna”, detalha. “Logo após, chegou a BM, fortemente armada. Vai ver pensaram que era tráfico de drogas, ou algo assim”, complementa com bom humor.

Após mais de uma década voando a cada dois meses de ultraleve, o susto em 2008 fez com que ele procurasse aeronaves mais seguras. “Perdi a conta de quantos voos já realizei para fotografar. Mas depois do acidente eu passei a voar em Gravataí, com aeronaves maiores. Hoje, porém, estou com os pés mais no chão”, finaliza ele, que pretende trabalhar por mais cinco anos no mesmo ponto. “Quando fechar 50, eu paro.”

Antigo cartão de Heinz, irmão de Erhardt, nos primeiros anos da Fotocolor

Antigo cartão de Heinz, irmão de Erhardt, nos primeiros anos da Fotocolor

“Não tira foto do presidente comendo”

Diversas celebridades e pessoas públicas passaram pelas lentes dos irmãos Meyer nestas quase cinco décadas. Políticos e jogadores da dupla Gre-Nal, por exemplo. Na década de 1970, lembra Erhardt, os irmãos mais velhos foram contratados para fotografar a inauguração do Porto de Estrela.

Era novembro de 1977. Quem estava presente era o então vice-presidente, Adalberto Pererira dos Santos. Gunther é quem relembra aquele momento. “Eu e o Heinz fomos lá bem cedo e uns militares pediram: ‘O que vocês querem aqui?’ Respondemos que era para fazer fotos para a prefeitura. ‘Vestidos assim não. Vão colocar terno e gravata’, nos disseram. E lá fomos nós trocar de roupa ligeiro para poder entrar”, relembra. Em outro momento, os irmãos ficaram frente a frente com o ex-presidente, Ernesto Geisel, que buscava se esquivar de algumas imagens. “Tiramos fotos em inaugurações, mas havia instruções: ‘Não tira foto do presidente comendo ou bebendo, e não te mete no caminho dele.’ Os fotógrafos da capital nos avisaram quem eram os agentes mais duros. Diziam que batiam com um jornal. Mas nada disso aconteceu”, conta.

Eles passaram pelas lentes dos Meyer

Celebração do amor

Há 42 anos, a Fotocolor inovava com a criação do convite de casamento de Paulo Isam e Liane Maria dos Santos. A ideia foi do noivo. “Eu vi em um anúncio de revista. Então pedi para eles criarem algo semelhante, juntando as faces e criando um só rosto. Para a época, era muito inovador. E eles eram muito criativos”, relembra.

“Demorávamos um dia inteiro para fazer.”Hoje basta um minuto no computador”, brinca Erhardt. O casal permanece junto. Teve dois filhos, também fotografados pelas mesmas lentes, e netos.

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Ciclo de gerações

Em 1982, Erhardt fotografou a pequena Marjorie Kauffmann para criar um convite de aniversário. Nestes 36 anos que se passaram, ciclos de gerações se formaram. Ela, aos 15, mandou revelar as fotografias da festa de debutantes na Fotocolor. Hoje a loja quase não realiza mais tal serviço. Mesmo assim, novos ciclos se fecharam. Semanas atrás, ela levou os dois filhos – Mathias e Davi – para fazer as tradicionais fotos 3×4. “Fui fazer as fotos necessárias para documentos da escola”, conta.

Rodrigo Martini: rodrigomartini@jornalahora.inf.br

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