Vegana, nutricionista com especialização em Nutrição Comportamental e integrante da Sociedade Vegetariana Brasileira, Jéssica Schuster esclarece algumas dúvidas para quem está pensando em parar de comer carne.
Como carne todos os dias. Consigo me tornar vegetariano?
Quando alguém quer se tornar vegetariano, oriento que, primeiro, fortaleça suas razões para isso. Procure saber como os animais que comemos são tratados e mortos, os impactos que a criação de animais causa no meio ambiente e os benefícios à saúde de uma alimentação vegetariana. Dois documentários importantes e que abordam esses aspectos estão disponíveis on-line: A Carne é Fraca e Terráqueos. O próximo passo é pesquisar receitas e organizar um cardápio vegetariano (nisso um nutricionista especialista pode ajudar) e se desafiar a ficar pelo menos uma semana sem consumir qualquer tipo de carne. Eu me propus a ficar 21 dias e nunca mais quis colocar o pedaço de um animal morto na boca. Em menos de um mês, parei também com os laticínios e com os ovos. Acredito que a transição para o veganismo é uma evolução natural.
Mas quando não como carne, fico com fome…
Isso só acontece quando a pessoa não faz as substituições corretamente. Montando um prato vegetariano equilibrado e comendo até ficarmos satisfeitos, a saciedade permanece por até seis horas. Sugiro que quem se sente assim inclua alguma leguminosa no prato, como feijão, lentilha, grão-de-bico ou ervilha. Com esses grãos, podemos fazer hambúrguer, estrogonofe, molho bolonhesa, maionese, etc.
Quais os benefícios de uma dieta sem carne?
Proteção contra todos os tipos de câncer, redução da incidência de obesidade, redução do risco de doenças cardiovasculares e diabetes. Além da saúde física, há o aspecto emocional e espiritual de não consumir animais e derivados de animais, que percebemos de forma mais sutil: mais consciência, leveza, energia, alegria, empatia, clareza mental, tranquilidade.
Mas parar de comer carne não causa deficiências nutricionais?
Esse é o maior mito da alimentação vegetariana. Com o devido planejamento, a alimentação vegetariana, mesmo a vegetariana estrita (vegana), é segura, saudável, completa, promove o crescimento e desenvolvimento adequados e pode ser adotada em qualquer fase da vida, inclusive na gestação e na infância. Os cuidados demandados são os mesmos de quem come carne e outros derivados de animais. Se houver alguma deficiência, todas são fáceis de diagnosticar por meio de exames de sangue, e então, tratar.
Vou me tornar dependente de suplementos alimentares?
Esse é outro mito. Suplementos só são necessários quando há diagnóstico de deficiências. Nunca atendi um paciente vegetariano deficiente de proteínas. Quanto a vitaminas, uma deficiência que ocorre em 60% dos vegetarianos e 40% dos onívoros (pessoas que comem animais e derivados) na América Latina é a deficiência de B12, uma vitamina essencial que é produzida somente por micro-organismos como bactérias, fungos e algas (animais e plantas não sintetizam). Animais e derivados só serão fontes de B12 quando a ração é enriquecida ou quando foram criados em sistema aberto e se alimentaram de vegetais diretamente do solo e sem contaminação com agrotóxicos, pois o uso de agrotóxicos causa a morte das bactérias e fungos que produzem B12. Por isso, essa vitamina deixou de ser uma preocupação apenas entre vegetarianos. Independente da alimentação da pessoa, o diagnóstico e a suplementação são iguais.
Como fazer as substituições?
As leguminosas são as substitutas ideais para as carnes e ovos. Isso inclui todos os tipos de feijões, lentilhas, grão-de-bico, ervilhas e soja. Por serem mais nutritivas e ricas em proteínas, são escolhas mais adequadas do que a proteína texturizada de soja (a “carne de soja”). Substituir a carne é simples: 1 porção de carne (1 bife do tamanho da palma da mão = 80g) tem o mesmo teor de proteína de 2 porções (2 conchas = 240g) de feijão ou lentilha. Já para substituir o leite e derivados, pensando na ingestão de cálcio, podemos incluir na alimentação gergelim, chia, feijão-branco, rúcula, lentilha, brócolis, grão-de-bico, amêndoas, couve-manteiga e chinesa, repolho ou ainda leites vegetais fortificados. É importante também uma exposição semanal ao sol para a síntese de vitamina D na pele, que participa da absorção e da fixação do cálcio nos ossos.