Uma fração da obra do escritor, professor e médico psiquiatra Augusto Cury será apresentada neste sábado no Centro Cultural da Univates, em Lajeado. A peça O Vendedor de Sonhos é uma adaptação do best-seller de mesmo título. A estreia nacional ocorreu nessa sexta-feira, em Porto Alegre.
A trama conta a história de Júlio César, que tenta o suicídio, mas é impedido por um mendigo, o Mestre. Esse personagem lhe vende uma vírgula para que César continue a escrever a sua história. Em seguida, os dois encontram Bartolomeu, um boêmio boa-praça. Os três se unem com a missão de vender sonhos e despertar a sociedade doente.
O texto para o teatro tem roteiro assinado pelo próprio Cury, em parceria com Cristine Natale e Erikah Barbin. Completam o elenco os atores Adriano Merline, Luiz Amorim, Marcos Veríssimo, Maurício Colatoni, Anisha Zevallos e Guilherme Carrasco.
O espetáculo inicia às 20h30min e tem duração de 90 minutos. Assinantes A Hora ganham desconto de 50% no ingresso, basta apresentar o cartão Clube do Assinante. Os ingressos variam de R$ 60 a 100.
A promoção é da Academia do Conhecimento, com apoio da Escola da Inteligência, A Hora e Univates. A realização é da Applaus.
Entrevista
A sociedade moderna, imersa no mundo tecnológico, cria uma sensação de urgência. A mente não descansa. As pessoas ficam propensas a doenças psicológicas por essa dificuldade em lidar com as próprias emoções. Essa é uma parte dos estudos de Cury.
O médico psiquiatra e escritor alerta para esse esgotamento mental como o principal fator para casos de depressão, ansiedade e diversas outras síndromes. Nas obras, oferece aos leitores uma série de ferramentas para ajudar na gestão emocional do indivíduo. Cury avalia a transformação do livro em peça de teatro e o impacto dos comportamentos e hábitos na saúde mental das pessoas.
A Hora – O Vendedor de Sonhos, um best-seller que vira peça de teatro. Como foi esse processo?
Augusto Cury – Completou o ciclo. O livro foi para o cinema e agora para o teatro. Isso me encanta muito. É uma surpresa, mas também não é. Eu esperava que algumas obras ganhassem adaptações para o teatro. O Vendedor de Sonhos talvez se torne a primeira peça mundial com ferramenta de gestão da emoção que o público vai assimilar vendo a interpretação dos atores.
O teatro é diferente. Ele é mais provocador do que o cinema ou o próprio livro. Na leitura, o indivíduo constrói os personagens e faz uma ambientação subjetiva. No cinema, tudo está pronto. Nos palcos, as falas dos atores, a presença deles, faz com que o espectador tenha uma outra viagem. O mais importante, uma viagem para dentro de si mesmo. Talvez ajude cada um a encontrar o endereço da própria mente no território da emoção.
O livro aborda questões atuais com relação ao controle de emoções e às crises de consciência. Como as pessoas chegaram nesse abismo, da dificuldade em gerenciar a própria mente?
Cury – A sociedade moderna está adoecendo rápido e coletivamente. Isso não é só no Brasil. A humanidade virou um grande manicômio global. Estamos na era dos mendigos emocionais. Muitas vezes, pessoas bem resolvidas financeiramente mendigam o pão da alegria. Não conseguem fazer das pequenas coisas um espetáculo aos olhos e nem conseguem proteger as emoções dos estímulos estressantes. A mente virou terra de ninguém. Pequenos problemas, críticas e ofensas, invadem e infectam o prazer de viver. Vivemos em um mundo ansioso, consumista e saturado de informações.
Como o mundo moderno impacta sobre o indivíduo?
Cury – Muitos pensam que é a depressão a doença do século 21. Para mim, é a ansiedade, devido à síndrome do pensamento acelerado. Isso atinge de crianças a adultos, de pessoas das classes mais humildes às classes mais abastadas e se deriva do excesso de estímulo, de informação, de atividades e, em destaque, o excesso de uso de tecnologias digitais.
Esse excesso de informação é registrado por um fenômeno inconsciente chamado Registro Automático da Memória (RAM), saturando o córtex cerebral numa dramaticidade jamais vista na história da humanidade. Uma criança de 10 anos provavelmente tem na memória mais informações do que Sócrates, Platão e Aristóteles tinham. Todo esse excesso de informação estimula a leitura da memória gerando uma hiperconstrução de pensamentos, que gera uma ansiedade, angústia, sofrimento pelo futuro, autocobranças, dificuldade de conviver com pessoas lentas, sintomas psicossomáticos, inclusive fadiga ao acordar.
Com relação à imersão tecnológica e ao comportamento nas redes sociais. Como o senhor avalia isso?
Cury – O artificialismo das relações interpessoais é uma grande preocupação. As pessoas têm contatos com centenas ou milhares, mas raramente de forma profunda com alguém ou consigo mesmo. Vivem a tese dramática da solidão. Estamos assistindo a uma explosão de suicídios no mundo. Nos EUA, aumentou 100% o índice de suicídio entre crianças de 10 a 14 anos nos últimos três anos. Isso é muito grave.
E as redes sociais, o mundo digital, são um dos fatores importantes. Criança deve brincar, se aventurar. Adolescentes devem passar por perdas, se reinventar, proteger sua emoção.
Quais comportamentos podem ajudar?
Cury – Algumas ferramentas podem melhorar a vida das pessoas. Entre elas, temos que entender, é preciso elogiar mais e criticar menos. É preciso aprender que ninguém muda ninguém. Temos de desistir disso. Aqueles que tentam mudar os outros pioram as coisas. A melhor maneira de contribuir é ser agradável.
Outro comportamento importante é contemplar o belo. Ter o fim de semana exclusivo para um caso de amor consigo, com a família, com aqueles que amamos. Não usar o smartphone, se desligar.
Por fim, aprender técnicas de relaxamento. Interiorizar e refletir. O que tenho feito da minha vida? Sou uma máquina de trabalhar ou um ser humano complexo? Mapear esses fantasmas mentais que nos fazem sangrar emocionalmente é o primeiro passo para ter autocontrole.
Filipe Faleiro: filipe@jornalahora.inf.br