Com a experiência de quem já esteve duas vezes à frente da associação, Marcos Tang defende a criação de mecanismos para elevar o consumo de lácteos e formas de divulgar o rigor ao qual o produto é submetido desde a propriedade até o supermercado.
Definição de um preço médio, formação de sucessores e gestão do negócio estão entre os desafios citados.
Como elevar o consumo de leite e derivados?
Marcos Tang – O brasileiro consome cerca de 170 litros de leite e derivados por ano, quando o recomendado pela Organização Mundial de Saúde é de 250 litros. Logo existe espaço para crescer. Precisamos de campanhas consistentes que esclareçam os benefícios e principalmente passem segurança ao consumidor quanto à qualidade do produto. Tivemos a imagem prejudicada com os episódios da Operação Leite Compensado. Houve uma pulverização de notícias negativas e sentimos falta de lideranças do setor ocuparem a mídia e tranquilizarem o consumidor, uma vez que tais episódios foram pontuais, envolvendo algumas marcas e que tais flagrantes só foram possíveis por termos uma vigilância atuante.
Qual a importância do rigor na fiscalização?
Tang – Nós produtores não somos contra a vigilância, muito pelo contrário, queremos o imediato afastamento e punição de qualquer pessoa que macule a imagem do leite e derivados. Acreditamos na qualidade do produto que oferecemos e esse é um ponto fundamental para estimular o consumo com segurança. Fizemos muitos investimentos e melhorias para atender a normas sanitárias e de qualidade. Hoje nenhum litro de leite sai do tanque sem que se colha uma amostra para atestar a qualidade e descobrir eventuais desvios. Então é muito triste ver alguém falando mal da qualidade do nosso produto, que é o mais rigidamente controlado entre todos os produtos agropecuários. Tudo isso para garantir a tranquilidade do consumidor.
Quais os principais desafios?
Tang – O mais urgente é reequilibrar o setor, ou seja, repartir o bolo com uma fatia justa para todos os componentes e na hora das perdas que sejam também equilibradamente divididas. O que vemos hoje é que todos tiram a sua parte, (indústria, mercado, fabricante da embalagem e até o transportador), mas o produtor entrega o leite sem saber ao certo quanto receberá e, muitas vezes, fica no prejuízo. Os elos fracos são as pontas: o produtor e o consumidor. Esse último ainda pode procurar por promoções, mas quem produz precisa entregar diariamente sem poder trabalhar com estoque ou trocas seguidas de comprador. Muitos produtores não suportam os altos custos e acabam por fechar a propriedade. É evidente que todos precisam ter retorno financeiro, mas o produtor muitas vezes subsidia o leite que é consumido pela população.
Como atrair os jovens?
Tang – Para atrair alguém para um setor, em primeiro lugar, ele deve ter gosto e afinidade com a atividade. Em segundo lugar, essa pessoa deve ter a possibilidade de auferir ganhos financeiros. Desse modo, começamos a ver o quanto é difícil manter o jovem na atividade, pois trabalhar com gado leiteiro significa serviço garantido de domingo a domingo. Quem gosta da lida, precisa ter dinheiro para fazer suas aplicações e lazer, mesmo que no futuro herde a propriedade, sob pena de seus amigos, mesmo com um salário mínimo trabalhando na cidade, terem dinheiro para o fim de semana e ele não. Fazer escala de trabalho para cada um ter folgas. Tudo isso deve acontecer com muito diálogo e planejamento. Talvez o mais difícil para as nossas famílias, que na sua grande maioria são descendentes de alemães ou italianos, seja a conversa calma e equilibrada entre os membros. Os pais tendem a achar que os filhos são preguiçosos e os filhos acham que os pais só sabem trabalhar e reclamar e não entendem nada de estratégia e planejamento. A família que conseguir sentar e planejar junto tem grande possibilidade de prosperar e manter o jovem na atividade, praticando a tão falada sucessão rural.
E a importância da gestão?
Tang – Ela deve vir antes do investimento. Uma gestão consciente e realista pode nos indicar que certo investimento não deve ser feito, pois a propriedade não terá como pagar. O leite é um negócio que envolve centavos, então, você não tem margem para erros e o que pode ser um bom investimento para uma propriedade, talvez não seja para a outra. Geralmente os grandes investimentos acontecem quando a remuneração do leite está melhor, esquecendo-se que as prestações também devem ser pagas quando o preço estiver ruim. Sem dúvida, qualquer negócio para sobreviver precisa ser modernizado e equipado tecnologicamente.
Considerações finais
Tang – O produtor deve entregar um produto de alta qualidade para a indústria. Essa deverá agregar valor e trabalhar com qualidade e marketing para incrementar o consumo, abrir novos mercados e expandir horizontes. As autoridades político administrativas devem facilitar a conquista dessas metas ou, ao menos, não atrapalhar. Além disso, precisamos de políticas sérias que diminuam um pouco a carga tributária voraz que abrange todo o setor e que possam equiparar o preço pago ao litro de leite conforme o aumento dos preços dos insumos necessários para produzi-lo.