O acaso uniu um renomado escritor brasileiro com um famoso músico português em um mesmo palco. Foi assim que surgiu o projeto Duetto da Vida, com o palestrante Gabriel Carneiro Costa e o cantor Gil do Carmo.
Há dois anos, Costa voltava de Portugal após lançar um livro. Segundo ele, no evento em que palestrou sobre o tema da obra, participaram apenas 15 pessoas. “Fiquei em dúvida se, ao chegar no Brasil, contaria ou não que pouquíssimas pessoas tinham prestigiado o lançamento de meu livro em Portugal”, conta.
A bordo
Porém, enquanto viajava de volta para Porto Alegre, passou a procurar por músicos famosos de Portugal para ouvir no trajeto. Eis que Costa se deparou com Carmo. Simultaneamente, apesar do pouco público no lançamento de seu livro em terras lusitanas, recebeu um e-mail de uma mulher daquele país que havia prestigiado seu evento.
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“Nós precisamos constantemente de reconhecimento. Mas quando os elogios vêm da mesma fonte acaba perdendo a graça. Mas, quando vem do inesperado, de alguém de outro país, como foi o caso, tem outro sabor”, lembra Costa.
Retribuído
Movido pelo mesmo espírito de prestar reconhecimento internacional, Costa resolveu mandar uma mensagem a Carmo tecendo elogios sobre suas canções.
Com o contato feito, logo estabeleceu-se uma amizade regada a “muita conversa e vinho tinto”, como relata a dupla.
Em seguida, falou para Costa que tinha muita vontade de fazer shows no Brasil. “Lembrei da vontade que eu também tinha, no passado, de viajar a trabalho para outros países. Logo articulei com meus contatos alguns shows dele no Brasil”, comenta Costa.

Gil do Carmo entrou no palco cantando à capela no auditório do CTC
Duetto da Vida
Em outra viagem a Portugal, teve início o que se tornaria o projeto Duetto da Vida. Com a recíproca amizade entre Carmo e Costa, perceberam que tinham o mesmo propósito: de proporcionar, cada qual em sua devida especialidade, reflexões interiores de autoconhecimento, a descoberta do próprio eu e a valorização da vida.
Em uma livraria portuguesa, nasceu o que tornou-se e foi consolidado nesta semana com o projeto Duetto da Vida. Enquanto Costa explanava sobre o que estuda ao longo dos 15 anos – amor sem legendas (dizer que ama, ao invés de apenas demonstrar) e execuções de planos com motivações próprias – Carmo intercalava as falas do escritor com canções de sua autoria.
Tamanha afinidade entre os dois faz com que as músicas de Carmo e o conhecimento de Costa fluam de maneira harmônica. O show com sucessos de Carmo foi acompanhado de elucidações de temáticas abordadas nas músicas pelo escrito, em clima leve e descontraído.

Em alguns momentos, público cantou junto com Gil do Carmo
“Achei interessante porque a música dá o tema para a conversa depois. É diferente. Comprei o livro, mas tive que pegar o CD também para ter a mesma conexão”, contou a aposentada Lovani Favaretto, 54, ao término do show.
Com o auditório do CTC lotado, o segundo show da dupla com o projeto Duetto da Vida foi prestigiado com entusiasmo pelo público, que acompanhava o cantor português em corais pré-ensaiados por ele durante o espetáculo.
“Para nós não é um custo, mas sim um investimento. É um evento que proporciona conhecimento às pessoas e eleva o padrão cultural de nosso clube”, diz o presidente do CTC, Luis Fernando Cardoso de Siqueira.
Entrevista
“A música é algo natural para mim”
Com quatro discos lançados ao longo da carreira, Gil do Carmo fala das principais influências e como a amizade com Gabriel Carneiro Costa tem agregado no seu processo criativo.
Como a música surgiu na sua vida?
Pertenço a uma família de músicos. Minha vó e meu pai foram meus principais incentivadores. Então desde criança estive em contato com a música sempre. A musicalidade faz parte da cultura de nossa casa. A música é algo natural para mim. Não vislumbro a minha vida sem música e sem essa profissão.
Assim como o escritor Gabriel Carneiro Costa, você também aborda a questão do autoconhecimento e a descoberta do eu em suas canções. Como funciona seu processo criativo?
Parece-me que neste momento conturbado que a sociedade vive muitos valores foram distorcidos. Minha geração ainda foi educada da forma antiga. Com mais proximidade com as pessoas e mais compartilhamento. Procuro abordar estas mudanças que vemos hoje no século 21 e como podemos nos adaptar a elas de modo que possamos evoluir, sem perder as nossas raízes, pois nosso passado também é riquíssimo. Gosto de dar uma imagem poética às minhas canções – fazer com que as pessoas se sintam num pôr-do- sol em um veraneio em Lisboa.
E no Brasil quais são suas principais referências musicais?
Gosto muito do Chico Buarque, Tom Zé, Hermeto Pascoal e Caetano Veloso. Assim como eu, esses artistas também vislumbram questões mais interiores, muito além de questões românticas ou cotidianas. Além disso, sou apaixonado por bossa nova, samba, gafieira e forró.
E como um palestrante que aborda as temáticas de suas canções em meio ao seu show contribui para o seu espetáculo?
Foi uma amizade que surgiu de forma muito espontânea. Faz dois anos que temos vários encontros regados a janta e muito vinho tinto. No próximo disco que vou lançar, essa questão de amizade verdadeira e compartilhamento com certeza será abordada. A princípio são duas carreiras que não têm nenhuma ligação, mas temos percebido que juntos há um diálogo entre nossos propósitos – conversam sobre questões íntimas do ser humano.
Cristiano Duarte: cristiano@jornalahora.inf.br