Protesto ganha força

Vale do Taquari - alta dos combustíveis

Protesto ganha força

Agricultores se unem aos caminhoneiros e aumentam manifestações contra a política da Petrobras. No segundo dia de paralisação, caminhoneiros conseguiram parte do objetivo. Sensibilizaram outros segmentos da sociedade. Produtores rurais reforçaram os atos contra o aumento no preço dos combustíveis. Decisão de indústrias em suspender trabalhos e possível impacto sobre a economia pressionam o governo federal. Como resposta, o presidente Michel Temer convoca uma reunião para encontrar uma forma de barrar a alta no preço dos combustíveis. Alternativa mais próxima é cortar impostos.

Protesto ganha força

Em meio aos protestos de caminhoneiros contra o aumento no preço dos combustíveis, agricultores do Vale decidiram aderir à causa. Nas rodovias, a adesão à greve aumenta e prejudica o setor industrial. Sindilat teme perda da produção.

Com um “tratoraço”, iniciado às 13h de ontem, mais de 15 produtores se reuniram na BR-386, nas imediações da rótula de entrada de Bom Retiro do Sul, no km 362, sentido capital/interior. “É um protesto pacífico contra a alta do combustível que atinge diretamente e indiretamente, pelos altos custos que atingem nossa produção”, afirma o agricultor Fernando Fell, 32.

Em Arroio do Meio, cerca de 20 tratores saíram da RS-130, ao lado do Supermercado Dália, e percorreram as principais ruas da cidade. “A gente pensou que tinha que fazer alguma coisa para apoiar os caminhoneiros”, conta o agricultor Luis Nos, 36.

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Para ele, o aumento no preço do combustível nos últimos cinco anos é desproporcional à margem de lucro arrecadada ao longo de um mês de produção. “Estamos pagando para trabalhar. Deixei de fazer as contas para não ficar louco.”

Segundo Nos, a manifestação de produtores ocorreu de forma improvisada. “Ontem à noite começamos a organizar um grupo de WhatsApp e de repente conseguimos envolver toda comunidade.”

Com o aumento dos combustíveis, o agricultor Maurício Eidelwein, 38, relata que o custo mensal com combustível chega a quase R$ 4 mil. “São mil litros de diesel que gastamos mensalmente. Tá quase impossível produzirmos de forma viável.”

Para o produtor, se o governo cumprisse seu papel e não fosse corrupto, os trabalhadores rurais conseguiriam sustentar as famílias.

Enquanto os mais de 20 tratores preenchiam a rua principal de Arroio do Meio, a comunidade manifestava apoio e acompanhava, na beira da calçada, a movimentação.

“O imposto come todo dinheiro que eles poderiam arrecadar. Com certeza a tributação corresponde a mais de 1/3 da produção total. Isso é insustentável”, diz o empresário Daniel Dutra, 42, em apoio ao protesto dos agricultores.

Em Arroio do Meio, produtores fizeram um “tratoraço” nas principais ruas da cidade. Manifestantes afirmam que preço do diesel impacta sobre o custo para manter a lavoura

Em Arroio do Meio, produtores fizeram um “tratoraço” nas principais ruas da cidade. Manifestantes afirmam que preço do diesel impacta sobre o custo para manter a lavoura

Prejuízo à indústria

Com mais caminhoneiros aderindo à greve da categoria, as indústrias começam a sentir os reflexos da mobilização. Diretora da Fruki, Aline Eggers afirma que as manifestações deste ano foram as que mais prejudicaram a logística da empresa, em especial nas regiões Sul e Missões, onde a companhia de bebidas tem centros de distribuição.

“Mesmo no Vale do Taquari, tinham alguns focos que acabaram impactando a nossa entrega. Na Região Metropolitana, não fomos tão afetados”, afirma.

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Sindicato que reúne as empresas de laticínios, o Sindilat teme pela perda da produção de leite e pede urgência na solução do problema.

De acordo com o presidente da entidade, Alexandre Guerra, os atos atrasam a entrega de cargas de produtos perecíveis e já comprometem a atividade fabril.

Conforme o sindicato, sem a liberação dos veículos, os laticínios gaúchos ficam impossibilitados de realizar a captação de 12,6 milhões de litros de leite em 65 mil propriedades rurais.

“Se os veículos não chegarem às propriedades dentro do prazo, os produtores terão a produção descartada, um prejuízo gigantesco para um setor que vive momento de dificuldade ímpar.”

Guerra afirma que o Sindilat compreende a legitimidade da manifestação e se solidariza com o movimento dos caminhoneiros, mas solicita uma negociação emergencial entre o governo e os manifestantes, de forma a liberar ao menos o transporte de leite.

A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) também emitiu alerta em relação aos protestos. Segundo a entidade, caso as paralisações e bloqueios persistam, existe risco de desabastecimento do mercado e de quebra nas exportações.

Em Bom Retiro do Sul, agricultores da                                    região aderiram ao protesto na BR-386

Em Bom Retiro do Sul, agricultores da região aderiram ao protesto na BR-386

Em nota, a ABPA afirma que os bloqueios impedem o transporte de aves e suínos vivos, ração e cargas refrigeradas. “Animais poderão morrer no campo com a falta de insumos e já temos relatos de unidades produtoras com turnos de abate suspenso”, diz o texto.

Para a entidade, os prejuízos para o setor produtivo e para o país são incalculáveis. “A ABPA apoia as motivações da paralisação, mas entende que o movimento deve preservar o fluxo dos alimentos e dos insumos para a produção.”

Nas outras regiões, as consequências também foram impactantes. Em Gravataí, a fábrica da GM suspendeu a produção devido à falta de componentes. Em Pelotas, postos de combustíveis ficaram sem gasolina.

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Protesto pacífico

Os caminhoneiros fizeram manifestações em pelo menos oito pontos da área de abrangência da 4ª Delegacia da PRF, entre Tio Hugo e Soledade, na BR -386. Em Estrela, os trabalhadores se concentraram nas proximidades do posto Superporto.

De acordo com Adriano Renner, 63 anos e 43 de profissão, a intenção foi promover um protesto pacífico para mostrar a situação precária em que se encontram os caminhoneiros. “Nunca vi essas coisas de aumentar o preço do óleo diesel todos os dias. Em mais de 40 anos, não me lembro de uma situação tão ruim.”

Participante dos protestos de 2015, afirma que a situação só piorou desde então. “Naquela vez fiquei nove dias parado em Sarandi, mas nada adiantou. Prometeram muita coisa, mas até agora nada foi feito.”

Para Enestor Almeida, 54, que trabalha no ramo faz 25 anos, os protestos visam sensibilizar o governo para os problemas enfrentados por toda a população devido à alta dos combustíveis. “Antes, precisávamos de R$ 1,5 mil a cada 24 horas para abastecer o caminhão. Faz cerca de 60 dias que estamos gastando cerca de R$ 2,2 mil por dia.”

Também participante dos protestos de três anos atrás, alega que a situação piorou significativamente para os caminhoneiros. “Fala-se muito em melhora da economia, queda na inflação e aumento nos empregos, mas não vemos isso. A gente não sabe a quem apelar.”

Contra a alta no combustível, produtores fizeram “tratoraço” nas principais ruas de Arroio do Meio durante a tarde de ontem

Contra a alta no combustível, produtores fizeram “tratoraço” nas principais ruas de Arroio do Meio durante a tarde de ontem

Para ele, a partir de hoje, o país começará a sentir os efeitos do desabastecimento e as pessoas precisam se conscientizar do quanto o caminhão é importante em um país onde mais de 90% do transporte ocorre via rodoviária. “As pessoas precisam abandonar os carros e se juntar a nós.”

Os protestos foram acompanhados de perto por agentes da PRF e da PRE e os manifestantes permitiam a passagem de ônibus, carros e motocicletas. Alguns caminhoneiros que tentavam passar pelos bloqueios foram coagidos e impedidos de prosseguir. Apesar de algumas discussões mais fortes, não foram registradas agressões.

Redução na Cide

Diante da ampliação das manifestações, o governo federal sinaliza a possibilidade de zerar a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), um dos impostos que incide sobre os combustíveis, conforme anunciado ontem pelos presidentes do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), e da Câmara dos Deputados.

Com cartazes e barricadas, caminhoneiros fizeram bloqueios na BR-386, entre Estrela e Lajeado

Com cartazes e barricadas, caminhoneiros fizeram bloqueios na BR-386, entre Estrela e Lajeado

Conforme os parlamentares, os recursos que deixariam de entrar nos cofres públicos poderão ser obtidos com projeto que reonera setores da economia, ainda em tramitação no Congresso. A decisão teria sido acertada com o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia.

Thiago Maurique: thiagomaurique@jornalahora.inf.br | Cristiano Duarte: cristiano@jornalahora.inf.br

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