No colo, com o braço enfaixado, a menina de 5 anos atingida por estilhaços de bala ainda não entende o que aconteceu na noite desse sábado.
Por volta das 22h, pai e mãe começaram uma discussão. Segundo vizinhos do casal, o motivo da briga seria uma suposta traição da esposa e desentendimentos constantes com a enteada, de 15 anos.
Conforme relato de Maria Santiago, 67, proprietária do imóvel onde o casal morava, o suspeito, de 63 anos, ajudou a criar a enteada desde que começou a residir na casa, faz cerca de dez anos. Ele trabalhava no estaleiro do município e também fazia serviços domésticos para vizinhos.
Além disso, seria restaurador de armas, motivo pelo qual a polícia encontrou cerca de dez facas, três cartuchos calibre .38, cinco potes com chumbo, pólvora e espoleta e três espingardas.
Com suspeita de embriaguez, vizinhos contam que o padrasto da enteada se descontrolou durante a discussão e apontou a arma para a adolescente.
Assustada, a menina de 15 anos deu um tapa na espingarda e, enquanto isso, a pequena, de 5 anos, teria se atirado na frente da irmã, com o intuito de protegê-la. Nesse momento, a arma disparou e os estilhaços da bala atingiram o braço da criança.
“Se não fosse minha irmãzinha, eu estava morta agora”, conta a adolescente.
A criança foi levada às pressas para o Hospital São José. O pai chegou a fugir do local do crime, mas foi encontrado pela Brigada Militar em um casa na vizinhança. Ele foi preso em flagrante e encaminhado ao Presídio Estadual de Venâncio Aires.
Despejo
Com a prisão do pai, a proprietária do imóvel despejou a família da casa, onde pagava cerca de R$ 300 de aluguel mensal.
“A casa é minha e pedi de volta. Eu sei como ela (a mãe) é. Arruma confusão com todo mundo”, conta. “Quem pagava todas as contas de casa era o pai. Às vezes deixava ele dever aluguel, porque via o esforço dele para dar tudo para as meninas”, relata dona Maria.
Na pequena casa, com cerca de 40 metros quadrados, os estilhaços da bala que atingiu a menina de 5 anos carcomeram o roupeiro da família.
Vidros da porta de entrada da residência foram quebrados durante outras desavenças do casal.
Uma das geladeiras da casa foi cadeada pelo homem. O motivo, conforme relata a irmã dele, seria que a adolescente de 15 anos comia iogurtes e vitaminas que o pai comprava para a filha, de 5 anos.
“Na vizinhança, ele é querido por todos. É trabalhador. Todo mundo sabe disso”, conta a irmã, que reside ao lado. Ela prefere não ser identificada.
A mãe das meninas está morando com a avó, nas imediações de onde aconteceu o incidente.“Não quero o mal dele (o ex-marido). Ele ajudou muito nós. Mas não quero mais ele na minha vida”, conta a mãe, enquanto agarra a filha ferida no colo.

Vizinhos relatam que desentendimentos entre o casal eram constantes
Caso antigo
No Conselho Tutelar do município, a família já é acompanhada faz alguns anos. A adolescente de 15 é chamada com frequência devido a faltas escolares.
No sábado, após ter sido feito o boletim de ocorrência na Polícia Civil de Lajeado, o Conselho Tutelar foi notificado.
Um relatório do que foi acompanhado pela entidade nos últimos anos será emitido ao Ministério Público, que deve dar parecer sobre o caso em breve.
Depressão
A mãe da menina de 5 anos trabalha como pescadora. Ela faz acompanhamento no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) do município para tratamento de depressão.
“Vivi estes anos todos com ele, mas agora não quero mais. Quero tocar minha vida”, conta a mulher.
O Conselho Tutelar teria auxiliado a mãe no encaminhamento para o tratamento.
“É uma mulher simples. Trabalha conosco. Esta briga familiar tem muitos lados. Mas a verdade é que ambos são trabalhadores”, diz Egídio Brantti, presidente da Colônia 132 de Pesca.
Cristiano Duarte: cristiano@jornalahora.inf.br