Na casa da coordenadora do grupo de ministros da Paróquia São Cristóvão, Geneci Scartezini, 50, a imagem do Menino Jesus não é um item de Natal, e sim um símbolo fixo de fé. É ali que ela agradece, todos os dias, por ter sobrevivido a um grave acidente.
• Você sempre foi uma católica tão atuante?
Eu era católica, mas não atuante. Meu primeiro contato com a igreja foi depois de um acidente na BR-386, em frente ao shopping. Fui atropelada no acostamento, por um carro a 130km/h. Meu braço direito se deslocou do corpo, ficou pendurado; estourou tendão e tudo. Perdi 70% do movimento. Quebrei a perda direita, costela e perfurei o pulmão. Fui enviada para Passo Fundo, onde fui cobaia de uma experiência. Tiraram o ilíaco (osso do quadril) e transplantaram no ombro, para reconstruir. Fiquei 50 dias na UTI e 52 no quarto de hospital.
• A fé ajudou na recuperação?
Antes da cirurgia no braço, fiquei um ano em casa, só deitada de costas. Ali que fui aprender a verdadeira fé. Estou aqui hoje porque acreditei em Deus. Quem cuidou de mim neste um ano foi um amiga que era evangélica e se tornou católica por meio de mim, pois ela via que eu tinha força e acreditava que ia recuperar os movimentos. Até hoje vou nos médicos. Há pouco, recuperei mais 20% do movimento do braço.
• O que sente pelo motorista que lhe atropelou?
Nada, não tenho mágoa. Rezo por ele. Eu não culpo ele, não o conheço. Quem me socorreu, e eu agradeço muito por ele ser um anjo, foi o Paulo Borges. Eu não o conhecia, mas ele parou o carro para não deixar os outros passarem por cima de mim. Ele me colocou no carro e me levou para o hospital. Quando eu saí da UTI e fui para o quarto, ele foi me visitar e eu reconheci a voz. Depois do acidente, eu estava de olhos fechados, mas sentia tudo que acontecia. No carro, o Paulo ia me indicando os pontos por onde a gente passava. Ele dizia que era para eu rezar, e rezamos o Pai Nosso até chegar ao Bruno Born. Deus me chamou pela dor, não pelo amor.
• Como você vive a Quaresma?
Faço a minha parte. Jesus nos propõe três práticas na Quaresma: o jejum, a esmola e a caridade. Eu procuro viver isso dentro da minha realidade. Fiz jejum na quarta-feira e faço todas as sextas-feiras, até chegar o Domingo de Ramos, sem carne. E jejum faço todos os dias – como algo de noite e depois faço jejum até o meio-dia do outro dia. Não peço muito; é mais uma forma de agradecer por Deus me deixar viver. Mas maior jejum que faço na Quaresma é não dar ouvidos para quem fala mal de outras pessoas – e eu também não falo mal de ninguém. Os maiores feridos deste mundo são feridos por meio de palavras.
Gesiele Lordes: gesiele@jornalahora.inf.br