Na manhã deste sábado, cerca de 200 pessoas lotaram o plenário da câmara municipal de vereadores para acompanhar a audiência pública sobre as mudanças aplicadas pela Secretaria de Educação (Sed). O prefeito Marcelo Caumo e a titular da Sed, Vera Plein, representaram o poder executivo.
A audiência foi proposta pelos vereadores, Sérgio Kniphoff (PT) e Ildo Salvi (REDE), a pedido de pais, alunos, professores, diretores e monitores de escolas municipais de ensino infantil e fundamental. O objetivo era debater sobre o projeto de reformulação da rede de ensino – hoje com cerca de nove mil alunos –, a partir do Plano de Gestão Educacional de Lajeado.
O principal pedido foi pela revogação dos decretos que alteraram turmas, modificaram as horas-atividades e horários escolares, e ampliaram o número de alunos em algumas creches. Entretanto, Caumo garante que o governo não vai recuar.
“Vamos analisar com carinho todas as reinvindicações. Mas são nove mil alunos, e estamos pensando no coletivo, no bem estar dos nossos alunos. E não podemos revogar, sob risco de fazer ruir todo o nosso planejamento”, antecipa ele, acrescentado que muitas escolas passam a trabalhar com turno integral.
Algumas medidas apresentadas no fim de novembro preocupam pais e comunidade escolar. A mais polêmica é o fechamento de dez turmas, de 6º, 7º, 8º e 9º ano, de quatro escolas: Capitão Felipe Dieter, bairro Imigrante; Oscar Koefender, das Nações; Pedro Welter, Floresta; e Vitus André Mörschbächer, Universitário, que passarão a atender até o 6º ano.
O plano do executivo vai levar 131 alunos para outros colégios, sob justificativa de encerrar classes multisseriadas e reverter a baixa procura por vagas nessas escolas. A secretaria afirma que durante o estudo realizado por uma equipe da Fundação Getúlio Vargas (FGV), foram detectadas turmas aglutinadas, e que isso estaria interferindo na qualidade do ensino.
De acordo com o cronograma já pré-estabelecido, 38 alunos da Capitão Felipe Dieter vãos para as Emefs Guido Lermen e Lauro Matias Muller; 46 estudantes da Oscar Koefender vão para a Alfredo Lopes e a Francisco Oscar Karnal; 28 da Pedro Welter para a Dom Pedro I e a São João; e 19 da Vitus André Mörschbächer para Universitário e Porto Novo.
1,2 metro quadrado por criança
Outra proposta do plano é diminuir a fila de espera na rede infantil que, no final de setembro, tinha 597 famílias cadastradas. Segundo o governo, a projeção de vagas para o próximo ano só será possível com a remodelação das salas. A intenção é criar 400 novas vagas. Inicialmente, a demanda será atendida pelas Emefs.
Para tal, a administração determinou 1,2 metro quadrado de espaço para cada criança, com as salas podendo receber até 24 alunos. Diante do aumento da demanda, o governo informa que serão contratados novos educadores. Um concurso público já está programado para 2018, e também devem ser realizados outros processos seletivos.

Quase 300 pessoas estavam presentes no plenário da câmara de vereadores. Pais levaram cartazes, e também houve discursos de ex-candidatos a vereador
Padronização das escolas
Outro ponto que vem gerando divergência entre poder público e parte da comunidade escolar é a tentativa de padronizar a gestão escolar das escolas municipais, encerrando com um ciclo de autonomia de alguns educandários. O executivo decretou que todas as escolas abrirão das 7h30 às 11h30 e das 13h às 17h, e cada período de aula terá 55 minutos.
Por ano, são 800 horas em sala de aula e 200 dias letivos. De acordo com os contratos do magistério, são 20 horas semanais de trabalho, mas sem especificação do tempo a ser destinado para atividades fora do ambiente escolar. O governo defende que todas as horas sejam cumpridas na escola, sendo ao menos 15 horas em aulas e as demais para a preparação.
“Nosso sindicato não nos representa”
A professora de artes da Emef Dom Pedro I, do bairro Jardim do Cedro, Lusiani Schweiger, foi a primeira a se manifestar. “Foi um choque esse decreto. É uma imposição. Faltou diálogo entre as partes interessadas. O nosso sindicato não nos representa, apoia as medidas e dá voto de confiança ao prefeito. Essa é a nossa primeira queixa: a forma como foi conduzido este trabalho.”
Ela demonstra preocupação com os colegas. “Sinto que estão acuados, amedrontados, ameaçados. Sem poder de fala. Isso me deixa muito triste. Pois a democracia tem que vir em primeiro lugar.” Lusiani critica as mudanças no modelo de horas-atividades. “Eu trabalho com 27 turmas. Como vou preparar isso em duas horas? Não tem como não levar trabalho para casa. E é muita coisa. Deixamos até a família de lado.”
A professora também questiona os novos horários de reunião. Ela não concorda com o modelo de um terceiro turno. “Todos sabem que a renda da maioria é baixa, e por isso muitos estão comprometidos com outras atividades. Então, não temos como vir ao terceiro turno”, acrescenta.
Decoração natalina x escolas
A filha do empresário, Everson Veit, finalizou o ano na Emei Recanto Infantil. Está com cinco anos e deixará a escola infantil a partir de 2018. “Mas não estou aqui só por ela, mas sim por todos os pais e crianças. Prefeito de verdade não faz isso na educação, no final do ano. É época de natal, de ano novo, e todo mundo precisando se preocupar com escola, transporte.”
Veit questiona se foram feitos orçamentos para obras de novas salas de aula em creches e Emefs, e também questiona se haverá transporte público para atender toda a demanda de estudantes. “Eu saio para trabalhar às 6h30min, e vou ter que levar minha filha junto para ela ir ao colégio às 7h30. Ela vai chegar cansada. Onde está a qualidade de vida dela?”
Ele ainda questiona os gastos efetuados pelo poder público com a decoração natalina neste ano. Entre repasses para entidades, pessoas físicas, e compra e aluguel de material, foram cerca de R$ 500 mil. “Se você não tivesse investido em decoração natalina e tivesse investido esses recursos em sala de aula, garanto que ninguém estaria aqui reclamando.”
“Não podemos entulhar crianças”
Monitora da Emei Risque e Rabisque, Patrícia apresentou alguns dados sobre a rotina nas creches. “O decreto foi feito em cima de números, sem pensar no ser humano”, reclama. Segundo ela, caso se confirme o número de 24 crianças por sala, não haverá tempo suficiente para atividades básicas, como a troca de fraldas e a alimentação.
“Para trocar fralda de uma criança, demora-se em torno de cinco minutos. São 1h32min para uma troca de todas as 24 crianças. São quatro trocas diárias, ou seis horas. Na alimentação, demoramos 40 minutos para alimentar 15 crianças. Vai demorar 1h pelo menos para alimentar as 24”, pontua. “Vagas a gente conquista construindo escolas, e não entulhando crianças”, finaliza.

Audiência foi protocolada pelos vereadores, Ildo Salvi (REDE) e Sérgio Kniphoff (PT), e contou com intermediação do presidente do legislativo, Waldir Blau (PMDB)
“Mudanças são muito radicais”
Fabrício Tedesco é pai de um aluno da Emei Recanto Infantil. Para ele, o debate e a própria audiência pública deveriam ter sido realizadas antes dos decretos. “Teriam que ter iniciado a discussão no mínimo na metade do ano. Todos foram pegos de surpresa, e isso mexe com a educação dos filhos”, pondera.
Ele elogia o fato do governo estar tentando amenizar o número de falta de vagas, entretanto volta a chamar a atenção para a falta de diálogo. “A gente tinha um processo natural na nossa Emei, e agora crianças de cinco anos estarão indo para escolas mais distantes, andando uma hora e meia em um micro-ônibus, misturadas com crianças de 12 anos.”
Tedesco ainda critica os novos horários determinados por meio de decreto. “O turno termina 11h30min, mas o pai só sai do trabalho ao meio dia. São muitas lacunas abertas. São mudanças radicais, afetando a vida de muita gente. Peço que analisem, que entrem em contato com pais, diretores, para só então implementar algo tão radical.”
Josiane Delazeri Bandeira é psicóloga e mãe de aluna da rede de ensino infantil. Ela demonstra preocupação com a saúde das professoras. “O prefeito resolveu desqualificar toda a educação. Não está propondo construir nada, e sim encher as escolas de criança. Onde têm 16, quer colocar 24. E 1,2 metro quadrado por aluno é pouco espaço para se desenvolver de forma saudável. As professoras vão adoecer, mais do que elas estão adoecidas.”
Pedidos protocolados
– Revogação dos decretos;
– Visita às escolas municipais para ouvir as demandas;
– Protelar as mudanças para o ano letivo de 2019 e debater mais em 2018;
– Reavaliar as instalações elétricas de todos os prédios escolares que receberão novos alunos;
– Revogar a padronização das escolas, mantendo autonomia para definição dos horários;
Promessas do governo
– Flexibilizar o decreto sobre horas-atividades dos educadores;
– Garantir transporte público para a rede de ensino;
– Manter os estudantes realocados dentro do mesmo zoneamento da escola anterior;
– Rever algumas transferências, principalmente da Emei Entre Amiguinhos para a Emei Criança Alegre;
Rodrigo Martini: rodrigomartini@jornalahora.inf.br