Produtores cultivam menor área da história

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Produtores cultivam menor área da história

Estado plantará apenas 730 mil hectares de milho. Queda brusca no preço motivou recuo. Monocultura pode comprometer equilíbrio do ecossistema. Autoridades cobram políticas de comercialização, preço mínimo e seguro-renda

Produtores cultivam menor área da história

Airton José Lottermann, de Lajeado, reduziu em 50% a área plantada com o cereal, na comparação com a safra passada. Serão apenas 35 hectares de milho e 250 hectares de soja. “Vender a saca de milho a R$ 24 é inviável. Mesmo colhendo uma média de 130 sacos por hectares, não tivemos lucro e por isso, aos poucos, vamos desistir da cultura se o cenário não melhorar”, projeta.

Lottermann cobra políticas públicas para garantir uma remuneração justa. “Se tivermos uma safra recorde, o preço cai muito e, quando falta, ele dispara. É impossível planejar algum investimento sem saber o retorno. Ainda temos que conviver com as oscilações climáticas, nas quais não interferimos”, observa.

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Embora reconheça que a falta de rotação de culturas possa comprometer o solo e aumentar os custos, Lottermann aumentou a área cultivada com soja. De 180 hectares, passou para mais de 250 no ciclo atual. Projeta colher 15 mil sacas.

No ciclo passado, a soja foi negociada entre R$ 58 e R$ 64 a saca, considerado um excelente valor. “De cada saca colhida, 30% é custo e o restante é lucro”, calcula.

Rotação precisa ser mantida

Projeções da Emater indicam que neste ciclo os produtores devem plantar a menor área da história – cerca de 730 mil hectares, 11% a menos que em 2016. O número representa apenas 12% do total que será destinado à soja – ao redor de 5,7 milhões de hectares.

O principal motivo para redução drástica da área cultivada vem do mercado. A saca de 60 quilos está cotada em R$ 24. No ano passado, era vendida a R$ 43.

Para Alencar Rugeri, assistente técnico estadual da Emater, o produtor precisa ter o mínimo de rentabilidade para tornar a cultura viável. Segundo ele, a queda na área é registrada nos últimos quatro anos, quando a soja começou a apresentar uma valorização recorde no mercado internacional.
“Nossos argumentos técnicos não convenceram o produtor. O ideal seria manter entre 25% e 30% da área cultivada consorciada com milho, mas na prática isso está cada vez mais distante. Sem mecanismos para manter a viabilidade financeira, o cenário tende a ficar crítico”, comenta.
Outra preocupação é com a falta de rotação de culturas. A monocultura pode trazer consequências a médio e longo prazo no ecossistema. Além da falta de palhada causar maior deficiência hídrica, manter o cultivo de apenas um cereal na mesma área por várias safras pode aumentar a incidência de plantas daninhas, insetos e doenças.

Dick e o filho Felipe aumentaram a área destinada ao cereal para garantir ração mais barata ao gado leiteiro

Dick e o filho Felipe aumentaram a área destinada ao cereal para garantir ração mais barata ao gado leiteiro

Ração garantida

Na contramão das estatísticas, a família Dick, de Santa Clara do Sul, ampliou a área cultivada – passou de 25 hectares para 30. A decisão foi motivada para garantir a oferta de ração ao rebanho de 42 vacas leiteiras.

Após a safra, o grão é estocado na cooperativa em que são associados. Conforme a demanda, o cereal é transformado em ração. “Tendo a matéria-prima, cada quilo custa R$ 0,80. Ao comprar o milho, o valor aumenta em R$ 0,10. Representa uma economia de até R$ 5 mil por ano”, calcula Dick. São consumidos em média quatro mil quilos de ração por mês.

O filho Felipe destaca a importância de manter a rotação de culturas para garantir um equilíbrio no ecossistema. “Assim conseguimos controlar as ervas daninhas e doenças. Manter a pastagem sempre na mesma área é inviável”, comenta.

A média colhida por hectare chega a 150 sacos. As áreas são cultivadas duas vezes por ciclo para garantir a produção de silagem, um complemento proteico importante aos animais.

Para Dick, mesmo com a saca cotada em R$ 25, a cultura é rentável. “Se o clima colaborar, temos lucratividade”, entende.

“Necessitamos de um valor mínimo e remunerador”

Segundo o presidente da Associação dos Produtores de Milho do Estado (Apromilho-RS), Ricardo Meneghetti, o recuo em relação ao ano passado deve se consolidar entre 20% e 25%, mas em algumas regiões poderá chegar a 30%.

Com a perspectiva de produção menor, Meneghetti também estima valorização do grão.

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Quais os mecanismos para garantir a viabilidade da cultura?

Ricardo Meneghetti – A implementação de um seguro-renda, política de preço mínimo para o produto (não sugestão de preço, que é o que realmente temos hoje), segurança jurídica no campo e uma política de comercialização mais ágil, ou seja, o produtor tem que ter um mínimo de perspectiva de que, ao colher, colocará a produção, por um valor decente e remunerador.

Por quais motivos o produtor reduziu tanto a área cultivada?

Meneghetti – O milho é uma cultura de alto risco, e de custo elevado de implantação. Entre os motivos, podemos citar a queda dos preços de comercialização do cereal e consequente queda em sua renda. No último ano, a instabilidade política e econômica do país e as incertezas climáticas fizeram o produtor procurar refúgio em outra cultura, no caso, a soja, que é uma commoditie de rápida liquidez, menor custo de implantação e menos arriscada. E com valor relativamente constante.

O que pode esperar quem apostou na cultura?

Meneghetti – Com a redução da área plantada e também na tecnologia utilizada na implantação da cultura, teremos uma consequente diminuição na produção, isso certamente fará com que os preços se ajustem. Acredito que o milho terá uma melhor remuneração neste ano, em relação ao ano passado. Os primeiros contratos futuros já mostram isso.

Existe risco de desabastecimento?

Meneghetti – Mesmo com a área de milho no estado reduzida, não acredito em desabastecimento. Teremos, isso sim, um mercado mais ajustado, colocando neste ano os valores do cereal mais remuneradores ao produtor, acredito em um preço mais justo, fazendo com que o agricultor receba um valor mais digno pelo seu trabalho, sem interferir muito no andamento da cadeia produtiva.

O plantio da mesma cultura (soja) nas mesmas áreas traz impactos para o solo e o ambiente?

Meneghetti – Não diria isso, mas com certeza o plantio sucessivo, de uma mesma cultura em uma mesma área, traz mais dificuldades de manejo. Por isso, a importância da rotação de culturas, como prática de manejo. Introduzindo o milho em alternância com a soja, rotacionamos também a utilização dos agroprotetores, com isso, facilitamos o controle de pragas e doenças e em consequência obtemos maior retorno, tanto para o produtor quanto para o meio ambiente.

Considerações finais

Meneghetti – O milho é um dos cereais mais plantados no planeta, sua importância na cadeia alimentar é fundamental. Serve para alimentação humana, animal, é fonte de energia e outras utilidades. Entrando na rotação de culturas, proporciona ao produtor um manejo agrícola mais eficiente, sem contar com as toneladas de palhada que ele deixa viabilizando o melhor e mais eficaz método de conservação de solo que já se criou, que é o “sistema plantio direto”.

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