Após uma safra boa, com resultados satisfatórios, tanto em preço como em rentabilidade, o produtor volta a amargar perdas neste ciclo.
Jair Brentano, de Arroio do Meio, cultivou 25 hectares. A produtividade média chegou a 35 sacas. “Está difícil manter a cultura. O lucro está cada vez menor. Nessa safra, sobrou apenas R$ 8 por saca”, calcula.
A baixa lucratividade fez o produtor adiar a compra de um caminhão. Do cereal colhido, apenas 60% atingiu o PH ideal para fabricar farinha. O restante foi destinado para ração.
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Segundo Brentano, o tempo prejudicou a cultura do início ao fim do ciclo. Depois de um começo com excesso de umidade, seguiu-se período de falta de chuva. E no momento em que a lavoura estava pronta para a colheita, as precipitações em excesso retornam, resume.
Brentano diz que faltam alternativas para manter a rentabilidade no período de inverno. “A canola apresenta excelente produtividade, preço e mercado consumidor. No entanto, a ausência de máquinas para colher me fez desistir”, comenta.
De acordo com o diretor técnico da Emater/RS, Lino Moura, a cultura do trigo já tem mais de 90% das lavouras colhidas. A produtividade média, até o momento, varia entre 2 mil e 2,4 mil quilos por hectare.
Em termos de qualidade, mantém-se a tendência apresentada desde o início da colheita, que vai de regular a ruim, situando-se na sua grande maioria no tipo 2 (abaixo de pH 78). “É grande o desânimo por parte dos produtores, indicando grande redução na área a ser cultivada no próximo ano”, projeta.
O preço também não atende à expectativa. A saca de 60 quilos está cotada em R$ 30. O mercado se manifesta oscilante, com períodos sem precificação e retorno à compra do produto. Há também desinteresse de compra por parte dos moinhos, alegando baixa qualidade do produto, explica Moura.
Recuo de área
Segundo o engenheiro agrônomo da Emater-RS, Cláudio Dóro, todo ciclo foi prejudicado pelas oscilações meteorológicas. “A qualidade está ruim e a produtividade muito baixa. A quebra chegará a 60%”, estima.
A situação se agrava devido ao valor pago por saca. Enquanto o trigo voltado para a indústria está cotado em R$ 30, o destinado para a ração é vendido a R$ 15. Dóro projeta um recuo na área cultivada em 2018. “O desestímulo é total. Talvez a implantação de políticas agrícolas ou mesmo a melhora do preço possam reverter o quadro”, observa.
O presidente da Comissão de Trigo da Farsul, Hamilton Jardim, acredita que muitos produtores abandonarão a cultura. Segundo ele, não há outras alternativas mais rentáveis a ponto de substituir o rendimento do trigo. “Canola, aveia, cevada ou girassol são apenas nichos e registram problemas de venda”, aponta.
Aumento no preço do pão
O resultado ruim na lavoura pode se transformar em preocupação no bolso do consumidor. A tendência é de aumento no valor da farinha de trigo nos próximos meses.
As importações devem crescer. Se em 2016 o Brasil colheu 6,72 milhões de toneladas do cereal, neste ano, o clima prejudicou as lavouras e a estimativa é de colher apenas 4,88 milhões de toneladas. Com apenas 70% desse montante destinado à produção de farinha, os moinhos precisarão importar mais sete milhões de toneladas para atender a demanda.
“O clima é muito instável e nos obriga a importar”
Andreas Elter, sócio-diretor de um moinho instalado em Taquari, destaca o clima como fator negativo para conseguir um equilíbrio entre a demanda e a produção. Projeta aumento no valor da matéria-prima, tendo em vista a menor oferta do cereal no mercado interno e o aumento da cotação no mercado internacional.
• O preço da farinha pode aumentar com a baixa produção e qualidade do trigo na atual safra?
Andreas Elter – O trigo, em âmbito mundial, está com excedentes de produção. O mundo produz hoje 750 milhões de toneladas. O Brasil consome cerca de 11 milhões de ton/ano e produz de 4,5 a 6,5 milhões de toneladas, dependendo da safra. O RS vem com redução de produção devido aos baixos preços da commoditie no mundo. É um pouco cedo para falar, mas uma coisa é certa, a qualidade do trigo este ano não será a mesma de 2016. Teremos que buscar mais trigos melhoradores para ajustar nosso produto final. Os custos devem aumentar um pouco. Outra variável que temos é o câmbio. Pela maior necessidade e dependência do trigo importado, teremos mais influência desse. E ele vem aumentando a cotação.
• De onde provém a matéria-prima industrializada?
Elter – Primamos por trabalhar com trigo gaúcho, mas trabalhamos sim com mesclas de trigos importados, para ajustar a qualidade que o mercado nos exige. Esse trigo importado vem basicamente da Argentina. Quando esse país sofre alguma quebra significativa de produção, recorremos a trigo americano ou canadense. A empresa processa hoje entre sete e oito toneladas por mês, dependendo do momento que o mercado vive. A saca de 25 quilos, da variedade standard, está cotada a R$ 38 e a premium a R$ 44. Tivemos aumento na energia elétrica, nas embalagens, nos insumos e nos salários. Parte disso temos que repassar.
• Considerações finais
Elter – Temos um ótimo potencial genético embarcado, porém, as condições meteorológicas variam muito. O trigo precisa de frio no ciclo vegetativo para ter sanidade e depois responder em produtividade e qualidade. Não pode chover muito na colheita. Quando o clima não ajuda, temos safras ruins, baixa qualidade, queda no preço e desestímulo na lavoura. É uma pena, pois dispomos de genética, área, conhecimento e tecnologia para produzir.