Natural de Missões, na Argentina, Martinha Caceres, 44, vive da arte. Pintora faz 26 anos, esteve em Lajeado nesta semana. Em um espaço improvisado na frente de um supermercado, transformou dezenas de azulejos em telas de paisagens. De modo natural, sensibilizou as pessoas com a delicadeza dos traços feitos com os dedos.
• Como aprendeu a pintar?
Aprendi sozinha. Depois conheci um cara que pintava nos azulejos. Ele chegou até mim para pedir luz, para ele trabalhar, nunca tinha visto algo do tipo. Pedi para ele me ensinar, mas me disse para nunca mais chegar perto dele. Ele foi embora. Eu peguei um azulejo e consegui desenvolver sozinha. Hoje a pintura é uma forma de vida para mim. Tem gente que não entende. É difícil sair de um padrão imposto pela sociedade. Nós, artesãos, não saímos do sistema, também temos contas para pagar, vontade de ter algumas coisas. Mas é difícil defender o que gostamos.
• Se por um lado é complicado, por outro, deve ter seus benefícios. Quais as recompensas que a arte te deu?
Me levou a conhecer outras culturas, outras pessoas. Tenho amizade por todo o Sul da América. Já estive no Paraguai, Uruguai, Bolívia, Peru e Brasil. Temos uma multiculturalização em nós, e vemos a vida de outra forma. Eu acho que as pessoas fazem muito problema por coisas que não merecem tanto estresse, tanta energia. Tem coisas mais importantes que são simples. A vida flui mais fácil.
• Por que considera difícil mostrar à sociedade o valor do seu trabalho?
O mundo está controlado por um modelo mental. O sistema começa a ser implantado em nossas mentes desde quando nascemos, que precisamos cumprir uma função, se não trabalhamos, não somos ninguém, então, já quando somos crianças, vão nos embutindo um tipo de visão e vão deixando outras questões de lado. Falta um complemento. A começar pela educação, tem muitas escolas sem professores de Artes. E se tem é muito básica a formação. Eu acho que tudo passa por isso. Nos países de primeiro mundo, podemos ver que há esse olhar. No Japão, por exemplo, tiraram muitas matérias, mas uma que permaneceu foi a de Artes.
• Você considera, então, que a arte é necessária ao desenvolvimento do ser humano?
Não só a pintura, música, circo, teatro, literatura, a arte em geral. A arte é um alimento para a alma, que precisa ser alimentada. Se não chega aos 60 anos maltratado por um sistema para o qual trabalhou a vida inteira e o enriquecimento para o espírito, bem-estar, foi só correr atrás dos bens materiais, e não é só isso.
Carolina Chaves da Silva: carolina@jornalahora.inf.br