A duplicação andou, mas e os “índios”?

Opinião

A duplicação andou, mas e os “índios”?

Há alguns anos, acompanho a realidade das comunidades caingangues em nossa região, e inquestionavelmente a questão da duplicação da BR-386, no trecho da localidade de Linha Glória, em Estrela, se apresenta como uma grande polêmica, uma vez que impacta diretamente a comunidade indígena Jamã Tÿ Tãnh, mas que vem à tona principalmente quando de eventos trágicos, tais como os constantes acidentes de trânsito, e também, quando os indígenas paralisam o trânsito na rodovia, reivindicando direitos que, por uma ou outra razão o Estado lhes nega.
Nestes momentos em que as problemáticas se apresentam, as redes sociais inundam-se de comentários maldosos por parte da população local contra essa comunidade indígena. Declarações que, muitas vezes, se analisadas com rigor, poderiam levar seus autores à cadeia, por racismo e/ou por incitação ao ódio. Nas sessões da câmara de vereadores de Estrela, alguns membros da edilidade não escondem suas “preocupações” com a presença dos “bugres” na região.
No entanto, o objetivo desta reflexão é outro. Como disse anteriormente, analisando mais de perto esse processo de duplicação da rodovia, deparo-me com a informação de que a partir do Estudo de Impacto Ambiental e do Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (EIA/Rima) realizado para o devido transcurso da obra, estão prescritas medidas compensatórias para outras seis aldeias impactadas indiretamente pelo empreendimento. Medidas que precisam ser cumpridas antes da liberação da obra. Essas informações são de domínio público, e inclusive estão registradas em dissertação de mestrado da Univates.
A questão que fica é, ao longo destes mais de nove anos pelos quais se arrastam as obras de duplicação, nenhuma das vezes em que ocorreu paralisação foi por interesse dos indígenas em impedir as obras. Sempre o verdadeiro culpado era algum órgão que tentava passar por cima de leis, e de direitos de um grupo de pessoas, ou por falta de verba mesmo. Nesse sentido, onde fica nossa consciência cidadã? Cobramos dos nossos governantes que tenham posturas éticas e justas, mas, para problemas que aparentemente não lhes dizem respeito, a população prefere culpar alguém, preferencialmente alguém em condições mais vulneráveis, por quem notadamente não alimenta muita simpatia.
Se a obra parar novamente, quem vai procurar saber as reais causas antes de acusar a comunidade indígena? Em certos casos, não é necessário ser um Nostradamus para “prever o futuro”, basta ler, para além do Facebook.
Ernesto Neto, estudante do curso de licenciatura em História na Univates

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