Presidente da quinta maior rede de supermercados em faturamento no RS, Leonardo Taufer comanda o Imec em um momento de franca expansão. Desde o ano passado, a empresa investe em readequação e ampliação de unidades e na construção de novas lojas, demonstrando arrojo em um momento de incertezas na economia.
Natural de Caxias do Sul, Taufer consolidou a carreira como administrador em Porto Alegre, onde cursou Administração de Empresas na UFRGS e ingressou no mercado por meio da empresa Sonae, posteriormente vendida ao Walmart.
Foi nas duas empresas multinacionais que desenvolveu as aptidões e o apreço pelo setor de supermercados. De atuação destacada, teve rápida ascensão aos cargos de direção. Promovido a um dos postos mais altos do Walmart, estava em São Paulo quando decidiu dar uma guinada na vida e passar um ano nos Estados Unidos para estudos.
A vinda de Taufer para a empresa de Lajeado ocorreu após esse período longe do mercado. Ele enxergou na rede Imec a oportunidade de aplicar os conceitos que acredita em uma empresa bem estruturada e com capacidade de crescer.
Ingressou na rede em 2012, como diretor comercial. Em março de 2015, foi promovido a presidente em meio a uma das maiores crises econômicas da história do país. No mesmo ano, o Imec foi agraciado com o prêmio Agas como uma empresa que mais cresceu no estado. Em 2016, o faturamento total da rede superou R$ 540 milhões.
Negócios em Pauta – Como foi o início da sua trajetória no setor da administração?
Leonardo Taufer – Eu estudei em Caxias do Sul, minha família toda é de lá. Quando finalizei o Ensino Médio, fui estudar em Porto Alegre. Entre 1995 e 2000, cursei Administração de Empresas na UFRGS. Lá tive a oportunidade de fazer alguns estágios que foram muito mais complementos da minha formação, cuja ênfase é em produção e sistemas. Meu ingresso no varejo foi muito casual, pois não tenho na família ninguém com experiência no segmento supermercados, onde desenvolvi toda minha carreira.
De que forma você ingressou nesse mercado?
Taufer – Foi por acaso. No início de 2001, vi um anúncio do Sonae, uma empresa portuguesa que detinha a operação dos supermercados BIG, Nacional e Maxi Atacado. Era um anúncio para gerente de loja, e na época eu trabalhava em uma concessionária. Durante o processo seletivo, acabei recebendo uma oportunidade para a área comercial do Sonae, porque eu não reunia as competências e a experiência de supermercado para o cargo de gerente. O RH do Sonae disse: com o seu currículo, tenho uma oportunidade na área de compras, que faz mais sentido com a sua formação.
Isso logo após a formatura?
Taufer – Eu me formei em 2000. Trabalhei um ano nessa empresa de veículos em Canoas. Em 2001 fui admitido no Sonae para uma posição de comprador no Maxi Atacado. A partir dali, acabei me desenvolvendo de uma forma muito rápida. Fiquei um ano como comprador e recebi uma proposta para ir para a Ambev. Aceitei a proposta, pois naquela época era mais jovem e só tinha a ganhar experiência. Três meses depois, o Sonae me ofereceu uma proposta para voltar. Na época, um dos fatores que mais me motivavam era a remuneração, porque recém havia saído da faculdade e meu nível salarial era baixo. No meu entender, o fato de pedirem o meu retorno foi uma valorização.
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Como foi esse retorno ao Sonae?
Taufer – Eu retornei em 2002 e fiquei até 2005 no mesmo cargo. Fiquei primeiro como comprador de categorias perecíveis, depois como comprador de produtos de mercearia doce. No início de 2005, fui promovido à gerência comercial. Meu gerente na época também foi promovido e essa posição foi aberta. Ali foi a primeira grande transição da minha carreira. Deixei de ser um especialista, onde os resultados dependiam exclusivamente do meu trabalho, para um posto onde o resultado da área para a qual eu respondia não dependia apenas de mim. Percebi que as competências que me fizeram chegar até aquele ponto não seriam mais importantes dali para frente.
De que forma você se adaptou a essa mudança?
Taufer – Eu passei a me desenvolver muito mais em gestão de pessoas e liderança, para que a estrutura sob minha responsabilidade passasse a gerar resultado. Claro que tive o apoio do Sonae, até o fim de 2005. No fim daquele ano, o Walmart assumiu as operações da empresa. Tem dois fatores importantes nesse processo. O primeiro deles é seguramente a formação acadêmica, mas também a educação familiar. Mas essa transição é uma fase traumática. A gente percebe que nossos resultados práticos só serão possíveis por meio de liderança e da capacidade de convencimento. É necessário definir alvos muito claros, para que as pessoas possam, por meio dessa liderança, fazer com que os resultados continuem.
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Como foi o momento de transição em que o Walmart adquiriu as operações do Sonae?
Taufer – Tive a sorte de estar no lugar certo na hora certa. Quando ocorreu a transição, o Walmart trouxe para o sul do país uma estrutura muito robusta, justamente para acolher a empresa e potencializar o que fazíamos bem. Tive a oportunidade de me desenvolver fundamentalmente por meio de processos e métodos. As duas empresas são muito bem estruturadas e processuais. O nível de metodologia e instrução para que você consiga fazer as coisas acontecer. Isso fez com que a minha formação fosse complementada ao longo do tempo. Também tive oportunidade de vivenciar muito a cultura do Walmart.
De que forma essa experiência contribuiu para o desenvolvimento da sua carreira?
Taufer – Passei a exercer, de fato, uma posição mais destacada em liderança. Fui promovido a diretor comercial em 2007 e passei a ter contato com essa cultura do Walmart de qualificação contínua. Conheci melhor a empresa e a história do seu fundador, o Sam Walton, que acabou se tornando uma inspiração. Em 2008, recebi um convite para ir para São Paulo. Eu trabalhava no braço atacadista do Walmart, e o negócio se tornou promissor sob o ponto de vista do mercado. A empresa decidiu colocar dinheiro no setor para abrir lojas e expandir. Eu assumi a gerência comercial desse processo. Nós saímos de uma estrutura comercial em Porto Alegre com 20 pessoas para uma em São Paulo com quatro diretorias, mais uma no Sul e uma no Nordeste, e 120 pessoas. O Walmart tem dois níveis de diretoria. Eu estava no primeiro nível, passei a ter seis gerências sênior. Fiquei nesse cargo até o fim de 2010, quando houve uma ruptura.
Quais os motivos e como ocorreu essa ruptura?
Taufer – Percebi que estava me afastando da estratégia que o Walmart tinha paraa o Brasil. Não é uma questão de juízo de valor, de quem está certo ou errado. Eles acreditavam em uma estratégia que, ao longo do tempo, percebi que não combinavam com minhas crenças. Por isso, pedi meu desligamento, no fim de 2010, e planejei uma viagem para os Estados Unidos, onde morei quase todo 2011. Fiz um ciclo de estudos para aperfeiçoar o inglês, uma carência que eu precisava desenvolver. Essa decisão foi minha segunda grande transição. Mesmo nos EUA, sabendo da minha decisão de passar por isso, foi muito difícil. Eu via as pessoas vivendo, trabalhando, produzindo, e estava em outro ritmo.
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Como foi abrir mão de um cargo com alto salário? Quais foram as reações da família?
Taufer – Eu era casado, mas ainda não tinha filhos. Foi uma decisão combinada com minha ex-esposa, que na época trabalhava em uma multinacional e conseguiu transferência para os EUA. Mas foi difícil sair do Walmart em uma posição de diretoria executiva, a três níveis do presidente da empresa. Meu salário era compatível com essa responsabilidade e também tinha outros benefícios do cargo. Mas não estava feliz. Na minha vida toda, aprendi que devemos tomar as rédeas da nossa carreira, e não delegar essa decisão para qual empresa for. Não foi fácil, mas eu faria tudo exatamente da mesma forma. Fiquei um ano e meio fora do mercado até retornar para o Imec.
Como surgiu a oportunidade no Imec?
Taufer – Foi mais uma grande coincidência. Voltei dos EUA para São Paulo e estava fazendo um trabalho de reingresso no mercado de trabalho, participando de uma série de processos seletivos. Recebi uma indicação de um conselheiro que passou pelo Imec. Fiz uma série de entrevistas em Porto Alegre e fui convidado para conhecer a empresa. Acabei entendendo que era uma oportunidade, não apenas por voltar para o mercado, mas também de deixar uma contribuição e um legado na empresa. Quando cheguei em Lajeado, vi uma empresa extremamente bem estruturada. Os principais fundamentos de um negócio bem implantado na área de supermercados estavam aqui. O Imec já centralizava 100% do setor de hortifrutigranjeiro de suas lojas, já tinha o Italianinho Alimentos e uma central de fatiamento de frios. Assim, garanto a qualidade e a padronização desses setores em todas as lojas. As lojas também tinham uma estrutura interessante. Então, vi uma empresa que reúne os atributos que acredito serem importantes para o negócios bem-sucedido e decidi que queria ficar aqui.
No Imec você alcançou o cargo de presidente, a escala mais alta do setor administrativo. De que forma você ascendeu dentro da empresa?
Taufer – Entre as minhas metas individuais, estava a de ser presidente de uma empresa antes dos 40 anos. Talvez por coincidência e sorte de estar no lugar certo na hora certa, fui convidado para ser presidente em março de 2015 e fiz 40 anos em maio daquele ano. Quando vim para cá, em 2012, como diretor comercial, enxerguei essa possibilidade. Acho que esse crescimento ocorreu muito em função da dedicação. Gosto de uma frase do Abílio Diniz, que é uma das minhas referências. Perguntaram por que o Pão de Açúcar é diferente dos demais, e ele respondeu que provavelmente, no mundo, ninguém conhecia mais de supermercado, porque ninguém tinha visitado tantas lojas quanto ele ao longo do tempo. Se tem uma coisa que tento fazer permanentemente é me manter atualizado e viver essa experiência do supermercado. Tenho um estilo de operador. Quando estou em loja, busco fazer o que as pessoas fazem, tenham elas o cargo que tiverem. Gosto de fazer isso para estar perto das pessoas que fazem a roda girar, que atendem o cliente. Quanto mais a minha presença for percebida em loja, mais o legado de liderança que se preocupa com os clientes é percebido. Não faço isso para que as pessoas notem e comentem. Meu papel como liderança da empresa é esse.
Você também costuma viajar para descobrir tendências do setor. Como organiza esse hábito?
Taufer – Costumo aprender muito com isso. Ainda na época do Walmart tive a oportunidade de visitar supermercados nos EUA , na Alemanha e na Rússia. Depois continuei viajando muito. Mais do que tirar férias, aproveito para adquirir conhecimento. No ano passado, por exemplo, fiquei 15 dias nos EUA só visitando supermercados. Passei em Bentonville, que é a sede norte-americana do Walmart. Foi uma passagem muito emocionante, porque, mais do que viver o presente, temos que olhar para trás, e sou muito grato ao Walmart. Também conheci a sede de uma rede que sempre uso como referência nas palestras que faço, a Ho Foods, em Austin, Texas. Sempre tenho essa curiosidade de conhecer tendências que podem contribuir para o meu negócio. Não precisa ser sempre para a Europa ou os EUA. Às vezes você pode ir para o interior do RS e descobrir tendências interessantes.
Sob sua gestão, a rede Imec demonstra uma preocupação com os funcionários e aposta na redução dos índices de demissões em uma área que normalmente tem alta rotatividade. Por quê?
Taufer – Isso vem de berço. Meu pai e minha mãe sempre foram muito humildes e me deram pequenos ensinamentos. Quando era moleque e saímos para jantar, meu pai sempre dava R$ 2 ou R$ 3 para o cara que guardava o carro na rua. Lembro de perguntar para o meu pai por que fazia isso. Ele me dizia que esse dinheiro não faz falta para nós, mas faz muita diferença para aquela pessoa. Tive em toda minha vida essa referência de olhar para as pessoas e é isso que eu tenho tentado fazer aqui. O Imec me ajuda a fazer isso. Antes de pensar no sucesso das organizações, temos que pensar no sucesso das pessoas que trabalham conosco. Entendo que o sucesso pessoal dos nossos colaboradores melhora o atendimento aos nossos clientes. Nosso conselho de administração e nossa diretoria pensam da mesma forma e temos tentado criar esse ambiente de valorização. Dessa forma, temos alcançado resultados satisfatórios e passar por um ambiente de crise que tem impactado consumo, a renda e o emprego.
Você assumiu a presidência em 2015, quando a recessão que se desenhava no ano anterior se tornou um fato. Como você enfrentou essa situação?
Taufer – Foi extremamente traumático e eu morri de medo. A gente não tem noção da responsabilidade até ela chegar. Assumi em março, mas a ficha caiu em julho.Senti o peso nas costas de estar à frente de uma empresa com 2,1 mil colaboradores e uma série de atividades, como engenho, panificadora, lojas e restaurantes. Não foi fácil, mas tentei quebrar isso buscando referências. A empresa me ajudou muito nesse aspecto permitindo que eu me desenvolvesse com profissionais que me ajudaram nessa transição. A crise foi extremamente delicado, mas que só foi impactar o consumo e o Imec no fim do ano passado. Tanto 2015 quanto 2016, até o último trimestre, nós praticamente tangenciamos a crise.
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A crise ainda preocupa o setor de alimentação?
Taufer – O segmento de alimentos foi muito pouco afetado quando começaram os sinais da crise para outros setores da economia. Mas chega a um ponto em que carro não se troca mais, as pessoas param de comprar geladeiras, televisão, roupa, desemprego aumenta, renda caindo, crédito caro, acaba afetando também o consumo de alimentos. Agora é que estamos sentindo, de fato, esse efeito, que é cíclico. Quando olhamos a história das crises que o país enfrentou, a coisa mais importante é que, estancada a recessão, o Brasil viveu épocas de grandes crescimento. O ruim é estimar quanto tempo isso ainda leva. O positivo é que, pela capacidade de rever o nível das estruturas e processos internos enquanto vivemos isso, a chance da empresa sair melhor quando esse ciclo passar é muito grande.
Sabe-se que o Imec tem alguns conflitos societários. Como é estar à frente de uma empresa com essa realidade?
Taufer – Efetivamente, a diretoria executiva não é impactada pelo ambiente de governança, onde os acionistas estão inseridos. Em qualquer negócio do tamanho do Imec, com uma infinidade de acionistas, é muito difícil não haver conflitos. As pessoas têm interesses distintos e temos cem acionistas individuais. O importante é que nós não somos impactados pelo ambiente em que essas relações acontecem. Dentro do Conselho de Administração onde os sócios são representados, conseguindo fazer as coisas acontecer muito mais olhando da empresa para dentro do que solucionando conflitos de interesses.
Você adotou Lajeado e o Vale do Taquari. Seus objetivos pessoais estão voltados para a cidade?
Taufer – Tenho um apreço muito grande por Lajeado e por quem me deu oportunidade de vir para cá. Eu precisava voltar para o mercado de trabalho. Então tenho uma gratidão gigantesca pelo Imec, por Lajeado e por todos que me receberam aqui e que tive contato ao longo do tempo. As oportunidades que tive da minha carreira, no mais alto nível, ocorreram aqui. Tenho um aprendizado gigantesco por meio da empresa. Também estou casado com uma pessoa de Lajeado, vou ter meu primeiro filho, o Pedro, com essa pessoa. Então, seguramente a cidade fará parte da minha vida daqui para frente, e espero ficar casado também com o Imec. Tenho todas as condições para ser um cidadão de Lajeado por muito tempo.