Fernando Heid, 28, de Marques de Souza, trabalhou durante dez anos em uma granja de suínos em Travesseiro. Com experiência suficiente e garantia de crédito, resolveu empreender. Com ajuda dos pais Décio, 59, e Marli, 58, e do irmão Leonardo, 15, investiu R$ 1,3 milhão na construção de quatro chiqueiros com capacidade para alojar 1,7 mil suínos no sistema de terminação.
O escândalo de corrupção bilionário envolvendo a JBS e o governo federal é acompanhado com preocupação. “Eles nos garantiram que está tudo bem, mas estamos apreensivos. Eu vou pagar a primeira prestação do financiamento em dezembro”, conta.
O ciclo na granja dura 120 dias. A média de peso de cada suíno é de 110 quilos, cuja rentabilidade chega a R$ 30 por cabeça, valor considerado excelente por Heid. Após o abate, o alojamento é feito em dois dias e o pagamento em um mês, sem atrasos por enquanto.
Décio está entusiasmado e pretende abandonar a produção de leite em agosto para se dedicar integralmente ao novo empreendimento. “Temos que trabalhar, caprichar, ter qualidade e cuidar da sanidade. Não podemos interferir ou mudar o cenário administrativo da empresa. Isso cabe aos diretores resolver”, comenta.
Marli demonstra angústia quanto às dívidas contraídas. O valor foi todo financiado e será pago em dez anos. “Era o sonho dos meus filhos. Rezo para que fique tudo bem. Não sei o que faríamos se a produção fosse interrompida”, diz.
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Os planos de construir mais duas estruturas no ano que vem foram prorrogados. Apesar da JBS incentivar o projeto de expandir o plantel e existirem linhas de crédito para fazer o investimento, Fernando pretende esperar o quadro se estabilizar.
Assim como a família Heid, outras centenas de produtores e mais de cinco mil colaboradores de 12 unidades do estado vivem um cenário de incertezas. A empresa arrendou as unidades da Doux Frangosul em 2012.
A preocupação aumenta à medida que avançam as investigações envolvendo os empresários Joesley e Wesley Batista e o presidente Michel Temer, aliada às quedas sucessivas das ações da JBS no mercado e o aumento do boicote aos produtos da marca. A empresa é a maior produtora de proteína animal do mundo.
Venda de ativos
Para combater a crise de confiança criada por sua delação premiada, os irmãos Joesley e Wesley Batista colocaram à venda diferentes negócios.
O objetivo é obter recursos (R$ 15 bilhões) para abater parte dos R$ 70 bilhões que as empresas devem no mercado e garantir a renovação das linhas de crédito. O endividamento total chega a R$ 47,8 bilhões, com 62% nas mãos de bancos comerciais, que exigem a venda de ativos para renovar as linhas de crédito.
Já foram comercializadas as operações de carne bovina na Argentina, Paraguai e Uruguai. Podem ser colocadas à venda fábricas que processam carne de frango na Irlanda, França, Inglaterra e Holanda; empresa de engorda de gado com unidades nos EUA e Canadá; Vigor – fabricante de produtos lácteos, Eldorado – fabricante de celulose com unidade em Três Lagoas (MG); Alpargatas (marca Havaianas); Flora – fabricante de produtos de higiene e limpeza e linhas de transmissão de energia elétrica.
Economia ameaçada
Conforme o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lajeado, Lauro Baum, a concentração de mercado sempre foi uma ameaça. Com elevados incentivos, recursos e isenções governamentais, não oferecidos às empresas locais, trabalham exclusivamente em cima de resultados, com raros compromissos sociais. Manipulam os produtores a realizar investimentos faraônicos, na promessa de resultados milagrosos, deixando-os dependentes e, o pior, sem garantia, em caso de falência, resume.
O sindicalista reforça a importância do produtor seguir o modelo cooperativista.
Em Bom Retiro do Sul, a unidade processadora de embutidos de frangos emprega 400 pessoas. O prefeito Edmilson Busatto demonstra preocupação. “Apesar de não faturar aqui, é muito importante para a economia. É uma planta antiga, mas é rentável. Pagam bons salários. Seria um caos se fechasse. Torcemos para tudo dar certo”, diz.