Brigas no ambiente escolar  alertam pais e autoridades

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Brigas no ambiente escolar alertam pais e autoridades

Cinco alunas do Colégio Estadual Presidente Castelo Branco, o “Castelinho”, de Lajeado, foram suspensas depois de uma briga dentro do ambiente escolar. Grupo de estudantes gravou o incidente e o vídeo viralizou em redes sociais. Ministério Público (MP), direção da escola, psiquiatra e pais de alunos falam sobre a recorrência desses problemas e a falta de iniciativas para inibi-los

Brigas no ambiente escolar  alertam pais e autoridades
Vale do Taquari
oktober-2024

Uma semana antes de brigarem nos corredores do Castelinho, as cinco adolescentes com idades entre 15 e 17 anos tiveram um desentendimento na cantina. Três ex-alunas da escola municipal Dom Pedro I, do Jardim do Cedro, riram alto. As gêmeas que vieram da escola municipal Santo André olharam e foram interpeladas: “O que estão olhando? Perderam algo?” A resposta das duas irmãs foi curta: “Não podemos olhar?”

“Foi só isso”, afirma a vice-diretora do turno da manhã, Mirtes Lenhard. Nenhuma reclamação posterior foi levada até a sala da direção, reitera. Nenhum dos pais das meninas envolvidas sabia de qualquer rusga entre elas dentro da escola. Até que as cinco menores de idade se reencontraram no corredor, por volta das 10h dessa terça-feira, quando saíam da mesma cantina.

As três estudantes cruzaram com as gêmeas. Uma troca de olhares foi suficiente para desencadear toda a briga, que teria sido iniciada pelas três amigas. As agressões duraram um minuto, até a intervenção de professores, alunos e integrantes da direção. “A intervenção foi rápida. Mas como foi filmado e reproduzido em redes sociais, a repercussão foi muito maior”, acredita a vice-diretora.

São pelo menos dois vídeos de ângulos diferentes. Mostram as meninas trocando socos e chutes sob olhares de outros colegas. Mirtes demonstra preocupação com toda a exposição midiática. Cita que o último fato semelhante no turno da manhã ocorreu no início de 2015. Teme pela imagem do colégio estadual, considerado “complexo” pelo ingresso constante de alunos de escolas municipais de diferentes bairros.

“Normalmente acontecem alguns princípios de desentendimento no início de cada ano. Aqui nós recebemos alunos de todas as escolas municiais. É normal que tragam junto algumas rixas de fora. Por isso estamos constantemente monitorando”, afirma Mirtes. Todas as alunas envolvidas ingressaram no Castelinho em 2017.

Monitoramento e suspensão

Para casos de agressões ou rixas identificados pela equipe de orientação, a diretora do Castelinho, Evenise da Costa Pires, afirma manter um acompanhamento rígido dos alunos envolvidos. Primeiro são chamados para uma conversa interna com os monitores e professores. Em caso de reincidência, os pais são chamados. Se agressões voltarem a acontecer, os estudantes são suspensos.

No caso das cinco alunas, esse trâmite administrativo foi atropelado. “Não haviam reclamações anteriores ao fato. Os pais e a direção não tinham conhecimento. Ficamos sabendo só quando a briga desencadeou na saída do refeitório, e elas já foram suspensas”, lamenta.

Todas as cinco estudantes envolvidas na briga de terça-feira foram suspensas pela direção do colégio depois de serem identificadas, conforme regimento da instituição. Os pais e responsáveis foram chamados e informados sobre o fato. O caso não foi encaminhado à Brigada Militar (BM) e tampouco à Polícia Civil.

O retorno das estudantes será acompanhado pelas Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e Violência Escolar (Cipaves), instituídas por meio de lei estadual, com suporte do Judiciário, do MP, Conselho Tutelar e BM. O grupo de auxílio é formado por alunos, professores e pais. A direção também verifica a autoria dos vídeos. O uso de celular não é permitido dentro do ambiente escolar.

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MP investiga possível omissão

O promotor da Infância e da Juventude, Carlos Augusto Fiorioli, reclama a falta de informação por parte da direção do Castelinho. Segundo ele, o Ministério Público (MP) foi alertado apenas três dias após o fato ser flagrado por professores e monitores. “A diretora deveria ter atendido a lei e portaria que exigem que casos como esse sejam comunicados ao MP. E sequer o BO foi feito”, reitera.

Fiorioli aguarda mais imagens do fato para tomar qualquer posição. O promotor reforça a preocupação do MP com a recorrência desses casos em ambientes escolares. Por fim, faz um alerta para a direção do Castelinho acerca da gravidade do fato. “Quando se verifica brigas generalizadas como essa, a impressão é de que os diretores perderam o controle sobre os alunos.”

Aluno agredido é indenizado pelo Estado

Casos de violência em áreas internas ou nos entornos dos colégios não são exclusivos do Castelinho. Recentemente, aconteceram na escola Estadual Érico Veríssimo, no São Cristóvão, na Escola Estadual São João Bosco, no Conservas, e também na Escola Estadual Irmã Branca, no bairro Florestal. Nessa última, a sequência de agressões a um aluno com deficiência física gerou indenização.

Os fatos no Irmã Branca aconteceram entre 2011 e 2012. Um ex-aluno do Ensino Fundamental – que ingressou na escola em 2009 – foi vítima constante de agressões e bullying por parte de colegas. A vítima usa uma prótese na perna direita e afirma que foi empurrada por outros alunos em várias oportunidades. Em uma das vezes, durante o intervalo das aulas, foi agredida por três colegas.

Durante as seguidas agressões, sofreu ferimentos na cabeça, quebrou dente e, certa vez, ainda teve a prótese danificada. Ele também foi chamado de diversos apelidos depreciativos, sem que os responsáveis pela escola fizessem nada, segundo depoimento da vítima. Os pais procuraram a polícia. Fizeram BO. Mas os problemas persistiram.

“Tivemos reuniões com os pais dos agressores. Eu tive que procurar a escola para marcar, pois a antiga diretora insistia que tudo não passava de brincadeira. No encontro, muitos pais não foram. E isso me deixou com pena das crianças que o agrediram”, conta a mãe da vítima. Ainda segundo ela, o filho passou a criar desculpas para evitar a escola, e a tomar remédio para dormir.

Em setembro de 2016, o ex-aluno – que desde 2012 já está em outra escola da cidade, onde não reclama de bullying – conseguiu reparação na Justiça por agressões físicas e psicológicas que sofreu no Irmã Branca – hoje sob nova direção. O Estado foi condenado em segunda instância a pagar R$ 1,6 mil por danos materiais e mais R$ 8 mil por danos morais. Os valores ainda serão corrigidos.

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A tecnologia está entranhada na sociedade

Para o jornalista e professor de Comunicação e Novas Tecnologias, Militão Ricardo, a propagação do vídeo nas redes sociais e nos grupos de WhatsApp expõe uma realidade das escolas. “Temos que nos dar contas que brigas nos colégios sempre aconteceram. O fato é que a comunicação muda esse contexto e gera mais impacto na comunidade.”

Hoje qualquer pessoa tem uma câmera de vídeo no bolso, frisa Ricardo. “Com o celular, se tem uma ferramenta para gravar e compartilhar. Como se fossem repórteres em potencial.” Na avaliação do professor, a imagem sempre é mais impactante do que a história verbal. “Há alguns anos, as famílias tomavam conhecimento sobre esse tipo de fato nas conversas com vizinhos, amigos. Hoje recebem o vídeo em casa.”

Essa materialidade provoca uma repercussão maior, afirma o jornalista. Apesar disso, Ricardo contemporiza: “A questão central não é o vídeo. Isso já está instituído sobre a sociedade. Bem-vindo ao século XXI. O problema tem de ser visto pelos profissionais da área, para analisar o jovem e a violência.”

Apesar de doloroso, o professor vê um aspecto positivo. Para ele, a repercussão do vídeo evoca uma discussão dentro da comunidade. “É triste, impactante, mas há um lado saudável. É hora de a sociedade encarar de frente a questão da violência nas escolas e tentar resolver esses impasses de uma forma madura e consciente.”

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