O suposto terceiro loteamento mais fértil do mundo

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O suposto terceiro loteamento mais fértil do mundo

1º de janeiro de 2037, o hábil orador se posiciona em meio ao anfiteatro que se projeta holograficamente no centro do Parque Histórico da Princesa dos Vales composto por ostentosa arquitetura dos monumentos erguidos em homenagem aos antigos imigrantes pioneiros…

oktober-2024

1º de janeiro de 2037, o hábil orador se posiciona em meio ao anfiteatro que se projeta holograficamente no centro do Parque Histórico da Princesa dos Vales composto por ostentosa arquitetura dos monumentos erguidos em homenagem aos antigos imigrantes pioneiros mesclados com as demais culturas étnicas vindas posteriormente; suas belas trilhas de basalto e arenito extraídos das montanhas do alto da serra se confundem harmonicamente com o pequeno Jardim Botânico que sobrevive timidamente mais ao leste com suas habitantes protegidas rigorosamente pela lei ambiental cujas velhas figueiras, palmeiras, velhos angicos e ipês emplacados são saudosos anfitriões.
A população aglomerada em torno do cenário aguarda silenciosa a preleção do novo eleito presidente da Confederação dos Municípios do Vale do Taquari.
Compondo o cenário, se destacam mais ao longo do Rio Taquari quase todo murado salvo alguns “belvederes” os majestosos condomínios fechados e arborizados arquitetonicamente distanciados por algumas alamedas de lotes geometricamente distribuídos cuja infraestrutura impecável reúne residências uniformes de design moderno e colorido alegre abrigando o maior percentual de habitantes alojados pelas poderosas loteadoras. As imponentes plantas industriais mais ao largo são admiradas pela sua importância econômica e pelo rigoroso “controle ambiental” que é observado na mais íntegra ética em compromisso com as normas da lei vigente.
O discurso não é muito longo. O presidente enfatiza a ordem e a cultura do povo do encantado vale, suas riquezas industriais e produtos manufaturados cuja produtividade é ímpar com o índice per capita dos melhores da nação satisfazendo a massa ouvinte que submissa ouve atentamente a vibrante frase que “somos o suposto terceiro mais fértil vale do planeta”.
Embora sejam saudosos os pretéritos produtos do solo mãe, agora ocupado por loteamentos inflado em sufoco esquecido, substituídos pela sintética pasta proteica de soja transgênica mutante produzida no grande Planalto Central e circunvizinhanças que também fazem parte de dietas rigorosas elaboradas e sugeridas pela minha filha nutricionista.
Os cheiros e gostos característicos são agora espargidos nas ricas residências por intermédio da tecnologia fantástica e química sintética que também são usadas em eventos nos grandes teatros e cinemas das capitais.
O espaço cultural com seu museu moderno abriga as mais belas fotos de paisagens cujos espécimes da fauna e flora também são virtualmente mostrados em terceira dimensão resgatados do acervo dos registros dos profissionais e amadores que amorosamente se dedicaram em conservar a memória do vale encantado.
Apoio-me em minha prática bengala estendível e totalmente informatizada com dispositivos de segurança, médicos, armas de defesa e GPS localizador de ancião em dificuldades; retiro-me em passos lentos e embarco no aeromóvel de horários também precisos e informatizados com destino à antiga capital que vai deixando para trás a visão da paisagem dos grandes loteamentos agora sobrepostos ao solo rico e ao “Aquífero Guarani” disputado pelas poderosas engarrafadoras que movem a economia e o controle do líquido precioso.
As saudosas paisagens do tempo de “mascate” são apenas imaginação ou belas imagens holográficas que também podem ser vistas através de minha fiel companheira bengala “mega-projetada” pelo meu filho engenheiro da computação. Não choro nem lamento, pois não há o que chorar ou lamentar, tudo está deveras certo.
Retorno à solidão de minha sala de escritor em minha residência, depois de um belo e saboroso café amorosamente feito pela minha eterna e fiel companheira acompanhado de frutas cristalizadas “contrabandeadas no mercado negro”, e em meio a uma ilha de velhos recortes de jornais e livros antigos procuro inspiração para talvez escrever alguma crônica sobre o perdido mundo de 2067 que, com certeza, minha prole herdará e desfrutará em comensalismo com o fantástico, eterno e encantado provável terceiro vale mais fértil do mundo ou será provável terceiro loteamento mais fértil do mundo, sei lá, só resta aguardar.
Adriano Luis Turelli Spezia
Consultor de vendas e escritor da Alivat
adrispezia@yahoo.com.br

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