Osvaldo Bergamaschi conta “Uma vida de histórias”

Lajeado

Osvaldo Bergamaschi conta “Uma vida de histórias”

Autobiografia será lançada sábado. O livro apresenta facetas e batalhas do empresário que saiu de Relvado montado num burro branco

Osvaldo Bergamaschi conta “Uma vida de histórias”
Lajeado

A vida de um dos comerciantes mais antigos de Lajeado agora está impressa em livro. Osvaldo Bergamaschi, 86, lança este sábado, às 18h, no Clube Sete de Setembro, sua autobiografia.

Intitulada “Uma vida de histórias”, a obra traz um resumo das vivências de quem sempre esteve disposto a recomeçar.

O livro foi escrito ao longo de três anos, depois de muita insistência dos netos, e vontade particular de continuar ativo. “Eles queriam saber como saí da roça, e eu resolvi contar.”

Natural de Relvado, Bergamaschi é filho de agricultores, o mais velho entre oito irmãos. Se criou na roça, mas não enxergava a construção da vida no campo. Depois de um plantio sofrido de milho, desistiu de vez da agricultura.

“Meu pai mandou que eu limpasse o terreno, para plantarmos. Fiz. Mas tinha muito inço, e passei o cultivo inteiro roçando. Quando estávamos no período de colher, um temporal levou tudo embora. Aí, eu falei que não queria mais trabalhar na roça. Dali em diante faria qualquer outra coisa.”

Aos 17 anos, num burro branco, saiu da cidade rumo a casa de um primo, em Anta Gorda. O parente era alfaiate, e lhe inspirou a seguir o mesmo caminho. Apesar de não gostar, o pai aceitou. Mandou que fosse procurar um tio, na própria cidade de Relvado, que tinha igual ofício.

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Alfaiate de mãos cheias

Bergamaschi conta que na época era preciso trabalhar dois anos de graça, para então se tornar alfaiate. Na casa do tio, ganhava conhecimento, e o necessário para a subsistência. Passado os 24 meses, rumou à Charqueadas, distrito de Putinga, para abrir o próprio negócio. Passou a fazer fatiotas para os agricultores usarem nas festas da igreja.

E, acabou ficando famoso pelos belos cortes. Inquieto, decidiu ir para Putinga. “Aluguei uma sala, com duas peças. Uma era a casa, outra a empresa.” Dividia o espaço e a cama de capim com um irmão.

Na cidade, ainda tinha a concorrência de outros dois alfaiates. Nada que lhe fez desanimar. “De nove a dez meses, chegamos a trabalhar 18 horas por dia. De quando a energia elétrica era ligada, até quando era desligada.”

O sucesso foi tanto, que fez um dos concorrentes falir. Para diminuir as perdas, o outro alfaiate ainda lhe vendeu a casa. “Queria 35 mil contos. E era exatamente o que eu tinha em minha caixinha. Fechamos negócio.”

A residência era a aquisição necessária para casar com Alcinda. “Tinha colocado na minha cabeça que precisava ter uma casa primeiro, e foi isso que fiz.” Aos seis meses de gravidez do primeiro filho, Antônio César, ela já precisou enfrentar a primeira batalha ao lado do marido.

Recomeçar

“Tenho como se fosse um filme na minha cabeça. Se me perguntarem cada detalhe, eu sei.” Bergamaschi se refere ao estouro da barragem de Putinga.

Era um sábado de sol, em que vestia um terno de linho branco, quando ouviu o responsável pela barragem gritar: “Fujam todos.” Pediu para a mulher não olhar para trás, apenas subir o morro atrás de sua casa.

“Calculo que a onda tinha cinco, seis metros. Conforme passava, levava tudo. Árvores, casas, inclusive a nossa.” A reconstrução da casa foi feita, não queria sair da memória. A cada chuva, ele tinha a impressão de um novo estouro.

Foi então que decidiu se mudar para Encantado. “Ela, como sempre, concordou. Acho que por isso estamos juntos até hoje.”

Com o início da decadência do ofício de alfaiate, optou por novos ramos. Comprou uma loja em Relvado e deixou sob a administração do cunhado, já comerciante. “Confiei nele, mas ele colocou tudo fora.”

Em 1968, já com seis filhos, Bergamaschi perdeu, além da loja, um cafezal e a casa onde a família morava. “Precisei começar tudo de novo.”

Com o empreendedorismo no sangue, e empréstimos bancários, comprou uma churrascaria. Não deu certo. No lugar, instalou um armazém. Viu que rendia, mas pensava além.

“Como eu não pudê estudar, queria que meus filhos fizessem faculdade, então decidi sair de Encantado.”

Comerciante levou três anos para finalizar a autobiografia

Comerciante levou três anos para finalizar a autobiografia

Para escrever uma nova história

Chegando a Lajeado, em 1970, alugou um mercado onde hoje está instalada a Folhapé. A mulher ajudava, e também participava do Clube de Mães. “Sempre precisavam de alguma coisa, e eu me ofereci para comprar.”

Frequentes viagens a Porto Alegre, lhe fizeram conhecer fornecedores de barbantes, plásticos e tintas. Tudo usado para trabalhos artesanais, produzidos pelo clube.

Conhecimento que lhe rendeu uma nova, e definitiva ideia de empreendimento, depois de três anos à frente do armazém, sem lucros.

Certo domingo, foi à missa pela manhã, e viu um anúncio de venda de uma loja na Rua Julio de Castilhos, onde hoje funciona a Casa Americana. “Não via a hora de chegar segunda-feira para ver o preço.”

Consultou a imobiliária, mas não tinha condições. Foi direto ao dono, Ibraim Cadam. Um turco que vendia confecções. Por 2,4 mil cruzeiros fechou o aluguel.

Marcou para o dia 20 de agosto de 1973 a inauguração da primeira Loja Bergamaschi. “Chovia torrencialmente. Pensamos: será que abrimos. Resolvemos que sim, e foi um sucesso.”

Mulheres entravam na loja e diziam que Lajeado precisava de um comércio como aquele, conta.

Apaixonados pelas vendas

Desde o fim da década de 1970 na Rua Francisco Oscar Karnal, a Loja Bergamaschi ainda vende praticamente os mesmos artigos de antigamente, como pedrarias para artesanato, fantasias e tecidos.

E também recebe as clientes de sempre. Algumas que estavam no primeiro dia, ainda compram na loja.“Digo sempre que as mulheres me deram tudo. O que eu ganhei em Lajeado foi por conta delas.”

Bergamaschi acredita que o segredo está em atender bem, dar o melhor sorriso, e oferecer a amizade em troca. “Temos amigas, não clientes, nos 36 municípios do Vale. Todas compram aqui.”

Aos 84 anos, Adelina ainda é quem compra as mercadorias em São Paulo. A filha Helena administra, e leva a frente o sonho do pai, que ainda cuida da parte financeira, e do trabalho dos 12 funcionários.

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