Superação e esperança à menina Amanda

Vale do Taquari

Superação e esperança à menina Amanda

Intervenção social permite o recomeço para garota que teve a infância interrompida

Superação e esperança à menina Amanda
Vale do Taquari
oktober-2024

Entre os curtos momentos lúdicos da infância, as brincadeiras de enfermeira são as melhores. Nas frações de uma infância quase perdida, mediar os conflitos da família havia se tornado corriqueiro.

O sonho de ser médica veio de berço. Mesmo criança, tratava o pai e o irmão como se fossem doentes a buscar consulta no posto de saúde. Eles eram mesmo adoecidos pelo vício das drogas. Amanda imaginava ser a médica da família. “Eu brincava de receitar remédio, dava água, botava para dormir quando era tarde.”

O bullying na escola devido ao desleixo com o próprio corpo a deixava triste, mas não a atingia tanto quanto as brigas dentro de casa.

As dificuldades só aumentaram quando o destino quis separá-la da mãe, vítima de um aneurisma cerebral. Para ela, a mãe morreu de desgosto do irmão, ao descobrir de forma tardia que usava drogas.

Viciado em crack, o irmão tinha ficha policial extensa por roubos e furtos. Depois da morte da mãe, aos 29 anos, ele morreu de overdose. Amanda ainda tinha o pai, mas aos 79 anos restou a ele o lar de idosos. Ela estava mesmo sozinha no mundo. “Quando tinha comida em casa, eu deixava para o meu pai. Depois saía e pedia comida nas casas.”

Sem amparo familiar, a menina foi encaminhada ao acolhimento social. Ideia não aceita no início, mas não teve outra maneira. Morar com o pai não era mais possível.

Na Saidan, as primeiras semanas foram as mais tristes. “Eu só chorava escondida. E chorava muito.” As diversas conversas com os coordenadores e o acompanhamento psicológico e social foram reduzindo a angústia e a depressão. Agora ela é requerida para ajudar na casa de acolhida. Seu exemplo é visto como alento aos recém -chegados.

Recomeço

A garota frequenta o 9º ano do Ensino Fundamental. Novas possibilidades se abriram para realizar o sonho. A vaga de estágio em um laboratório do Hospital Bruno Born surgiu depois de tantos momentos ruins que passou na vida. A chance veio do Programa Jovem Aprendiz.

Ver a circulação de pessoas com jalecos brancos e verdes em um ambiente limpo era coisa para apenas imaginar. Agora o contato com esse mundo se tornou uma realidade, digna de uma lutadora cheia de humanismo. “Quero mesmo é ajudar as pessoas.”

Alguém fez a diferença

Conforme a psicóloga Rebeca Katz, as experiências da infância ficam para sempre registradas na memória. A diferença é de como se pode utilizar. “Daquilo que era ruim, conseguiu evoluir. A falta da mãe e do pai nunca será suprida, mas sempre haverá alguém que diz coisas que fazem algum sentido.”

Segundo Rebeca, uma criança que não tem afeto e nunca foi cuidada sofre com a exclusão social. “Ela não foi tirada da sociedade. Não deixou de ver propagandas bonitinhas de filhos ganhando presentinhos do Papai Noel. Sentiu a exclusão na pele.”

A inclusão da menina na Saidan fez toda a diferença. Para a psicóloga, receber um carinho e um beijo, um afeto de algum desconhecido faz tudo mudar. São detalhes que mudam tudo. “Alguém fez a diferença na vida dessa menina. Talvez ela não se dê conta disso.”

A possibilidade de mudar de vida por meio do estágio é o grande motivador para Amanda em 2017. A forma como assimilou as experiências vividas também pesou para que superasse, em parte, todo trauma sofrido. “A relação ruim também cria dependência porque preferem isso ao desconhecido. Mas ela deve ter uma gratidão. Pode não mudar o início da história, mas tem tudo para ser diferente.”

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