Relacionamento sem tabu

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Relacionamento sem tabu

Como os casais vivenciam as uniões monogâmicas em “tempos líquidos”

Relacionamento sem tabu
Vale do Taquari

Os lajeadenses Mário e Alice*, juntos faz mais de 30 anos, procuram novos parceiros para apimentar o relacionamento, que parece ter esfriado de uns tempos para cá. O sofrimento do casal gira em torno do problema de disfunção erétil dele. “Gostaria de satisfazer minha mulher, mas não consigo”, conta. Em festas privê ou em redes sociais, os amantes buscam por homens interessados numa relação sexual a três. “É fuga. Uma forma de realizar-se no outro, o desejo que tem para si. Uma troca de prazeres.” O fetiche não envolve compromisso. “É de comum acordo e não encaramos como traição. Precisamos esquecer o machismo. As mulheres querem sentir prazer.”

A instabilidade dos relacionamentos amorosos é tema estudado pelo sociólogo Zygmunt Bauman. Os tempos “líquidos”, como o polonês traduz a contemporaneidade, seguem mediados por incertezas. Cada um vive por si. Tudo muda rapidamente e nada é feito para durar.

Apesar da máxima do pensador, Daniela Duarte, terapeuta cognitiva comportamental e de esquemas, dá créditos ao amor. Para ela, homens e mulheres ainda preferem relacionamentos estáveis, baseados na monogamia. O que muda é a forma como nos relacionamos. “As pessoas têm acesso a relacionamentos abertos e muita exposição. O mundo virtual tecnológico facilitou a busca pelo outro”.

O novo comportamento, entretanto, não explica o crescente número de traições e divórcios. “As pessoas estão atrás da sua felicidade de formas mais intensas e mais abertas, e, por isso, suportam menos uma relação que não atende de forma plena”, lembra a especialista. “Em alguns casos, os casais optam por manter uma relação pela dificuldade de romper, mas criam outros tipos de contato, que vão atender suas necessidades.”

Infidelidade autorizada

Segundo a terapeuta, cada casal lida de uma forma diferente com a traição. Para alguns, a infidelidade é algo natural. “Pode ser que os dois ou um deles perceba que não é capaz de atender suficientemente o outro. A partir de então, estabelecessem um pacto.” Para esses, basta conquistar uma vida social e familiar plena. “Autorizam o companheiro a procurar novas relações para continuarem sexualmente ativos.”

Sem segredos

O respeito é apontado como o principal alicerce para os relacionamentos de sucesso. Conforme Daniela, há uma necessidade de conhecer o companheiro e entender o que será desrespeitoso para aquele outro indivíduo. “Tentar descobrir o que ele precisa, além das minhas necessidades. Compreender que é diferente de mim e isso não o torna melhor ou pior que eu. Esse é o segredo de um relacionamento adulto e maduro.” Outra questão é saber que o outro não pode dar conta de todas os vazios. “As carências devem ser supridas de diferentes formas, não só nas relações.”

*Nomes fictícios para preservar a identidade da fonte

Relações mais abertas quando o casal não se basta

De acordo com a terapeuta de esquemas, todo ser humano busca suprir suas insuficiências. “Isto é do ser humano. Vivemos para suprir nossa fome, sede, atenção; carência por segurança, conforto, prazer e, às vezes, de alívio. Para muitos, a necessidade de alívio é ainda maior do que a de prazer. É por isso que procuramos por outras relações.”
Mesmo assim, algumas pessoas só sabem se relacionar pela via sexual. “Os abusos velados na infância, por exemplo, são muito maior do que a gente imagina. Geram uma percepção de que ‘ser cuidado’ é entregar-se ao sexo.”

Amor e sexo

O mundo virtual abre uma janela para novas formas de se relacionar. “Com o acesso mais protegido e fácil, acabamos suprindo algumas necessidades não só sexuais, mas de afeto, de reconhecimento. Do elogio e da validação dele. Necessidades que, por vezes, são supridas por uniões com outros propósitos. “A relação familiar e monogâmica se mantém por vários motivos. Alguns preservam pela dificuldade de viverem sozinhos, outros pela dificuldade financeira ou necessidade familiar”, comenta Daniela. “Percebo que há casais se mantendo não mais por uma relação amorosa, mas por dificuldade de separação. Dá trabalho se separar. Questionam o preço que pagarão ao tomar a decisão. Resolvem, assim, manter-se na relação e suprir suas necessidades de outras formas.”

Há também quem só consiga encarar o amor desassociado do sexo. “É estratégia de sobrevivência, mas não é algo natural”, explica. “Ela aprendeu assim e não consegue enxergar a vida de outro modo.” Na terapia, a especialista trabalha para que o paciente não repita padrões sem buscar o questionamento. “Quando alguém está infeliz, é mais fácil buscar uma via secundária para suprir o problema. Por isso, surgem outros relacionamentos. Resolvemos a questão sexual, necessidade do elogio e do olhar por outro viés.”

2016_08_12_psicologa-daniela-duarteComo manter relações saudáveis, segundo a terapeuta Daniela Duarte

•É necessário conhecer a si mesmo e ao outro para saber quais são as necessidades de cada um.

•Preservar a individualidade. “Sermos indivíduos apesar da nossa relação. Buscar na relação somente aquilo que ela pode nos dar.”

•Evitar o excesso de expectativa e não esperar que o outro dê conta do seu vazio. “O desencontro é que torna o casal distante.”

No cinema

filme-vicky-cristinaVicky Cristina Barcelona

A comédia de Woody Allen se passa em Barcelona e conta a história de Cristina, que sofre de “insatisfação crônica” com a falta de um rumo na vida. Tudo muda quando ela conhece o pintor Juan Antonio (Bardem), que vive uma relação difícil com Maria Elena (Penélope).

 

Na literatura

livroAmantes: Uma História da Outra

A obra destrincha as motivações e virtudes das mulheres, fictícias ou reais, que foram dispostas à margem da sociedade ao se verem na posição de amantes. A pesquisadora Elizabeth Abott retrata a intimidade de mulheres por meio dos séculos, entre elas, a francesa Simone de Beauvoir. Ainda desconstrói a figura de garotas de mafiosos, a ideia da amante como troféu e o poder das amantes modernas.

Na televisão

novela2A Regra do Jogo

A novela da Globo mostrou o dia a dia de um relacionamento a três entre duas mulheres e um homem. No enredo, o funkeiro Merlô (Juliano Cazarré) vivia um romance entre Ninfa (Roberta Rodrigues) e Alisson (Letícia Lima), de forma consensual.

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