Casamentos homoafetivos crescem 51% no país

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Casamentos homoafetivos crescem 51% no país

Em 2015, 5,6 mil casais do mesmo sexo firmaram matrimônio nos cartórios do país. O número é 15,7% maior na comparação com o ano anterior, e 51% acima do registrado em 2013, ano em que a união foi regulamentada. Os dados são de pesquisa do IBGE publicada na quinta-feira, 24. No Vale do Taquari, nove casais oficializaram a união.

Casamentos homoafetivos crescem 51% no país
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A decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de permitir o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo trouxe novas perspectivas para o cabeleireiro Eleandro Ely, 39. Em um relacionamento de quatro anos com o gerente de varejo Michael Xavier, 25, avalia a possibilidade de oficializar no papel a união.

Para Ely, essa é a chance de ter os mesmos direitos de um casal heterossexual. Em um relacionamento anterior, o cabeleireiro sentiu na pele as dificuldades impostas pela ausência de um papel que comprovasse a união estável.

“Morávamos juntos e dividíamos todas as contas, mas tivemos um problema de saúde e fomos impedidos de usar o mesmo plano”, lembra. O relacionamento durou oito anos e acabou antes da decisão do CNJ. Agora, a possibilidade de oficializar a união representa maior segurança para o casal.

Com o planos de construir uma casa juntos, querem assegurar o registro do patrimônio em nome de ambos. “Se acontecer alguma coisa comigo ou com meu companheiros, nossos direitos estarão garantidos.”

Conforme Ely, como as duas famílias apoiam o relacionamento, não trariam empecilho no caso de uma fatalidade. Mas ressalta que nem todos os casais homoafetivos vivem a mesma situação. Em muitos casos, familiares ingressam na justiça contra o companheiro na disputa pelo patrimônio construído pelo casal, ressalta.

Outras situações do cotidiano também são facilitadas com o registro da união em cartório. Entre elas estão a abertura de contas conjuntas em bancos e cartões de crédito e os seguros saúde obrigatórios nas viagem internacionais. De acordo com o cabeleireiro, em todos é exigida a comprovação do relacionamento no papel.

“Moramos juntos, somos casados de fato, não apenas namorados. Mas perante a sociedade e a lei, somos nada e não temos direito a nada”, enfatiza. Se Ely e Xavier ainda viabilizam o casamento, Paula Bagatini, 37, e Dionara de Lima, 24, concretizaram o sonho em setembro deste ano, em uma cerimônia realizada em Colinas.

De acordo com Dionara, a vida das duas mudou pouco desde o casamento. Se antes moravam em apartamentos separados, mas estavam sempre juntas, agora dividem a mesma casa. “Continua praticamente igual, o que muda é o documento.”

Segundo ela, a burocracia exigida no caso das uniões homoafetivas supera a dos casais héteros. “São necessários um número maior de testemunhas e documentos probatórios, tanto no cartório quanto para o juiz de paz.”

Dionara afirma que, apesar do crescimento no número de casais gays, o percentual dos que registram o relacionamento ainda é pequeno devido ao preconceito. Para ela, muitos gays ainda tem restrições contra a própria identidade de gênero e evitam até mesmo assumir o namoro nas redes sociais.

PrintConquista recente

A legalidade do casamento gay no país tem menos de cinco anos. Em 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) publicou decisão impedindo a distinção de tratamento legal entre as uniões homoafetivas e heteroafetivas.

No mesmo ano, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), julgou ação movida por um casal de mulheres que viviam juntas faz cinco anos e queriam registrar em cartório a união estável. Em decisão histórica, o STJ apontou não haver obstáculos legais ao casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Parecia ser o fim das restrições ao casamento gay, mas a burocracia do judiciário se tornou novo entrave. O problema foi que os cartórios estão subordinados aos TJs de cada estado. O Distrito Federal e outros 12 transferiram a decisão do STJ para seus tabelionatos.

Como os demais não se manifestaram, alguns oficiais de cartórios se recusaram a registrar os casamentos ou converter uma união estável homoafetiva já reconhecida em casamento civil. Para encerrar o impasse, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou a resolução 175, impedindo a recusa.

De lá para cá, o número de casamentos gays não para de crescer. No ano passado foram 5.624 em todo o país, 15,7% maior na comparação com 2014 e 51% acima do registrado em 2013. O crescimento supera o verificado nos casamentos heterossexuais, cujo aumento nos últimos dois anos foi de 2,7%.

Representante do Coletivo LGBT de Lajeado e Região, Rodrigo Mattos considera a luta pelo direito ao casamento uma das mais importantes da comunidade gay. “Chega a ser bizarro pensar que só fazem três anos que os casais homoafetivos podem exercer esse mesmo direito básico que os casais heterossexuais já tinham há décadas.”

Militante da causa desde 2011, afirma que a mudança na lei demorou para emplacar devido ao preconceito dos agentes que trabalham nos cartórios. Hoje, considera o processo mais tranquilo e enumera os benefícios.

Entre eles estão o direito de escolher o regime de bens, adotar o sobrenome um do outro, fazer plano de saúde dividido e definir o companheiro como beneficiário de seguro de vida. Porém, ressalta que a adoção de crianças ainda é dificultada.

Preconceito inibe registros

Se no país o número de casamentos gays cresce a cada ano, o mesmo não ocorre no RS ou no Vale do Taquari. No estado, o número se manteve estável entre 2014 e 2015, com pouco mais de 210 registros. Na região foram registradas sete uniões em Lajeado, quatro em 2014 e três em 2015, uma em Mato Leitão (2013) e uma em Teutônia (2014).

Para Rodrigo Mattos, o preconceito ainda é o principal empecilho para que mais homossexuais decidam por se casar. “Isso dificulta até mesmo a aceitação das pessoas dentro da família, imagina só dar um passo grande como é o casamento.”

Segundo ele, a opressão sofrida pelos gays é sistêmica, mas começa a ser desconstruída graças à união da militância LGBT. Mattos acredita que a procura por união civil homoafetiva tende a aumentar e considera o casamento gay um ato político. “Casar em um estado que comete tanta discriminação é um ato de resistência, e a gente vai resistir cada vez mais.”

Para Eleandro Ely, o preconceito obriga muitos casais homoafetivos a se esconderem da sociedade, para evitar problemas no trabalho e na família, o que justifica a pouca adesão ao casamento na região. Por outro lado, considera que as incertezas quanto aos relacionamentos também interferem neste cenário, não apenas no mundo gay. “Mesmo nos casais hétero, os relacionamentos estão cada vez mais instáveis.”

 

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