A partir deste mês, 908 famílias da região deixam de receber o auxílio do Programa Bolsa Família. Elas representam 13% dos beneficiários do Vale e a ajuda foi cancelada por terem uma renda superior à permitida para ingresso e permanência no programa. A irregularidade foi constatada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDS), que fazia, desde junho, um cruzamento de dados dos beneficiários.
Para famílias que recebem de R$ 170 a R$ 440 por pessoa, o auxílio foi bloqueado, atingindo 461 no Vale. Para quem ganha acima disso, o benefício foi cancelado, o que afetou 447 famílias. Agora, elas terão três meses para regularizar a situação perante o governo. Caso não apresentem justificativa, terão o repasse cortado em definitivo.
Segundo o MDS, os beneficiados atingidos serão informados por meio de extrato eletrônico. Aqueles que tiveram a ajuda bloqueada, poderão ajustar os dados diretamente no Cras, enquanto os benefícios cancelados serão atualizados pelas próprias assistentes sociais, no domicílio dos usuários. Na região, a média do repasse, por família, varia entre R$ 150 e R$ 200.
Promessa de gestão
O ministro Osmar Terra afirma que o pente-fino continuará sendo feito todos os meses. A ação desta semana pode resultar em uma economia de R$ 2,4 bilhões anuais, alega. “Valor que garantirá o pagamento a quem realmente precisa.” É o caso de Ivone Possamai, 56. Moradora do bairro Santo Antônio, de Lajeado, ela teve um desconto de mais de 50% no mês passado, e passou dificuldades. “A gente sempre deixa de pagar algo, porque tem aquele dinheiro contado. Eu faço algumas faxinas, mas a saúde não ajuda”, lamenta.
Vera Eunice Pereira, 61, moradora de Estrela, gostaria de receber a ajuda. Mas há cerca de um ano perdeu o benefício, quando o filho atingiu a maioridade. Em tratamento contra o câncer, não tem como trabalhar.
“Tem gente que tem carro, apartamento e recebe. E quem precisa não”, diz. A filha dela, Sheila Angelita Pereira, 34, tem três filhos – de 1, 12 e 15 anos – e continua recebendo. Porém, afirma que já foi notificada da possibilidade de ser excluída do programa. “Disseram que eu receberia somente por uns dois anos, porque recebo ajuda do pai dos meus filhos.”
Municípios com maiores índices
Dos 908 benefícios cancelados e bloqueados no Vale, 22% são de Taquari. Conforme o MDS, 204 famílias cadastradas no programa têm renda acima da permitida. O que, em parte, seria culpa do próprio município. Conforme nota da administração municipal, recentemente foi realizada a troca de comando da Secretaria de Habitação e Assistência Social, devido a essas e outras irregularidades no programa.
“O cadastro estava sendo realizado apenas com a “autodeclaração” do beneficiário. Não estavam sendo feitas as visitas domiciliares, que devem ser realizadas por um profissional habilitado para isso, que é o assistente social. Por meio dessas visitas, as informações declaradas são confrontadas com a realidade. Dessa forma, a nova equipe da pasta já revisa os cadastros e faz saídas a campo, imprescindíveis para que o cadastro seja fiel à realidade.”
O segundo município com o mais inconsistências no programa foi Lajeado com 133 famílias que tiveram o benefício cancelado ou bloqueado, o que corresponde a 12% do total da cidade. Conforme o Centro de Referência de Assistência Social (Cras), a lista das pessoas afetadas pelo corte ainda não foi recebida pelo município, o que deve ocorrer até sexta-feira. Assim que as informações forem repassadas, o órgão deve iniciar a atualização cadastral.
Quanto às irregularidades, o Cras informou que não é de sua competência fiscalizar as rendas. As informações são autodeclaratórias. Cabe salientar que existe cruzamento de dados via sistemas nacionais, entre os ministérios, que auxiliam no controle social do Programa Bolsa
Família. “Nosso trabalho é fazer a inscrição no Cadastro Único e o Controle Social e orientar para a atualização cadastral anual, realizar visitas domiciliares e fazer o acompanhamento familiar para a eficácia do programa.”
Em números relativos, os municípios que se sobressaíram foram Poço das Antas e Muçum. Poço das Antas é o terceiro município do país com o maior número relativo de benefícios bloqueados. De 11 ajudas concedidas na cidade, três estavam irregulares. Enquanto Muçum é o quinto no país com maior número relativo de concessões canceladas.
Brasil e RS
No RS, foram cancelados 21,1 mil benefícios, e bloqueados outros 25, 1 mil. No país, o número chegou a 1,1 milhão, de 13,9 milhões. Para constatar as irregularidades, o MDS cruzou informações concedidas pelos beneficiários à Relação Anual de Informações Sociais (Rais), Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), Sistema de Controle de Óbitos (Sisobi), Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos (Siape) e Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ).
Pente-fino do MPF
Em agosto, o Ministério Público Federal divulgou dados da Operação Raio-X Bolsa Família na região. Cerca de 370 famílias estavam sendo investigados pelo órgão, em 28 municípios do Vale. Fato que resultaria em R$ 1,1 milhão em repasses indevidos entre 2013 e 2016. As assistências sociais dos municípios ficaram responsáveis pela averiguação dos dados in loco. Em Lajeado, das 85 apontadas, 53 já não recebiam mais o benefício. As outras 32 estavam com o cadastro desatualizado, segundo o Cras.
O Programa
O Bolsa Família é voltado para famílias extremamente pobres (renda per capita mensal de até R$ 85) e pobres (renda per capita mensal entre R$ 85,01 e R$ 170). A inscrição no Cadastro Único não garante a entrada imediata no Bolsa Família. A seleção das famílias é feita por um sistema informatizado, a partir dos dados que elas informaram no Cadastro Único. Ao entrarem no programa, as famílias recebem o benefício mensalmente e, como contrapartida, cumprem compromissos nas áreas de saúde e educação. O valor repassado a cada família depende de fatores como o número de membros, a idade de cada um e a renda declarada no Cadastro Único.