Projeto de cláusula  de barreira inviabiliza  29 partidos

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Projeto de cláusula de barreira inviabiliza 29 partidos

Proposta de reforma política em discussão no Senado diminui para nove o número de siglas com funcionamento parlamentar. Agremiações com representatividade no Vale, como o PV e o PTB, e tradicionais, como o PSTU e o PCdoB, perderiam acesso ao Fundo Partidário e ao tempo de rádio e TV.

Projeto de cláusula  de barreira inviabiliza  29 partidos
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As eleições deste ano mostraram a força dos chamados partidos pequenos. Siglas com menor expressão, como PRB, PMN, PHS e PCdoB, além de recentes, como a Rede, elegeram prefeitos em capitais e cidades importantes. Outras, como o Psol e o Novo, tiveram votações expressivas, ancoradas por ideologias bem definidas e em campos opostos.

Mesmo com o avanço registrado em outubro, a existência dos chamados “nanicos” está ameaçada pela PEC 36, proposta de reforma política em tramitação no Senado. Entre outras coisas, o projeto pretende impor uma cláusula de barreira que, se mantida, pode diminuir de 35 para nove o total de siglas.

O texto restringe o acesso ao Fundo Partidário e ao tempo de televisão e rádio para partidos que conquistarem no mínimo 2% do total do eleitorado, e outros 2% em no mínimo 14 estados. Com base nos resultados do pleito deste ano, apenas PSDB, PDMB, PSB, PT, PDT, PP, DEM e PR cumprem os dois requisitos.

Os partidos de fora da lista ainda poderiam lançar candidatos, mas teriam prejuízo financeiro e de visibilidade na comparação com as siglas maiores. A proposta também reduziria a força da oposição ao governo de Michel Temer. Dos nove que cumprem os requisitos, apenas o PT combate abertamente as propostas do atual governo.

A votação no plenário do Senado ocorre na quarta-feira, 9. Dos senadores da bancada gaúcha, Ana Amélia Lemos (PP) e Lasier Martins (PDT) são favoráveis à proposta, enquanto Paulo Paim (PT) é contra.

Para a progressista, a redução no número de partidos é o caminho adequado para a moralização do sistema partidário. Segundo ela, o grande número de siglas prejudica a governabilidade, devido à necessidade de negociar com um base parlamentar fragmentada.

“Entre 110 países, o Brasil é o único que tem 29 siglas com representação no Congresso. É ingovernável”, ressalta. Conforme Ana Amélia, criar um partido político se tornou um grande negócio, justamente devido aos recursos obtidos por meio do Fundo Partidário e à visibilidade dos programas de rádio e televisão.

“Na prática, horário político acaba vendido para outros partidos por meio das coligações”, afirma. De acordo com a senadora, impor condicionantes é fundamental para dar consistência programática e ideológica aos partidos.

“A crise decorre também da fragilidade ocasionada pelo grande número de pessoas”, aponta. Para ela, a representatividade dos campos ideológicos está mantida por meio das federações de partidos.

Lasier Martins tem opinião semelhante. Para ele, a necessidade de reorganizar o sistema partidário é ainda mais urgente diante do grande número de abstenções e votos brancos e nulos registrados no pleito de outubro. “A tendência é de aprovação rápida, ainda mais diante do clamor popular sobre o tema”, afirma. Para o pedetista, a proposta de federações partidárias é fundamental para o avanço do sistema político nacional.

Previsto na PEC, o mecanismo permitiria o agrupamento de várias agremiações que se identifiquem programática ou ideologicamente entre si, substituindo o sistema de coligações partidárias. Conforme Martins, hoje os partidos pequenos servem apenas para vender apoio político em troca de participação dos governos. Com isso, afirma, as votações em plenário se tornam muito difíceis. O parlamentar afirma que o único ponto a ser avaliado é o percentual estipulado na proposta.

PrintNova constituinte

Gaúcho com mais tempo de mandato no Senado, Paulo Paim (PT) concorda com a necessidade de reduzir o número de partidos, mas discorda da proposta em tramitação. Para ele, a reforma política deve ocorrer por meio de uma constituinte exclusiva.

Conforme o senador eleito pela primeira vez em 2002, o ideal seria eleger 124 pessoas por meio do voto direto para constituir a assembleia que definiria a reforma política. Os candidatos à constituinte não poderiam concorrer em outros cargos eletivos, ou estarem cumprindo mandato.

“Qualquer proposta que for colocada agora, como essa PEC que vai à votação, será questionada”, avalia. Para ele, os debates em torno do percentual da cláusula de barreira podem se estender devido a esses pormenores.

“É preciso haver uma forma de impedir essa grande quantidade de siglas, caso contrário, logo chegaremos a mais de cem”, aponta. Relata que a maioria das pequenas agremiações existem apenas para arrecadar recursos do Fundo Partidário e barganhar tempo de televisão com partidos maiores.

A proposta foi tema de um plebiscito informal realizado em setembro de 2014. Na época, 7,4 milhões de pessoas se manifestaram favoráveis a uma constituinte exclusiva para tratar a reforma política.

Um prefeito e 28 vereadores

Partido com maior representação no Vale a perder espaço com a proposta, o PTB alcançou 3,46% do total do eleitorado, mas chegou aos 2% em apenas 13 estados. Na região, o partido elegeu Aloísio Brock para prefeito em Pouso Novo e mais 28 vereadores.

Coordenador do PTB no Vale do Taquari, Elmar Schneider defende uma maior discussão sobre os critérios adotados na cláusula de barreira. Porém, considera imprescindível uma redução no número de agremiações partidárias.

Para ele, a reforma política deve ser uma das prioridades do parlamento, ao lado da reforma tributária.

O coordenador considera importante permitir o embate entre oposição e situação no campo ideológico. Segundo ele, a PEC 36 pode resultar no fim de partidos da esquerda tradicional, prejudicando esse processo.

Para Schneider, outro fator que precisa ser levado em consideração é o motivo para a criação dos partidos. Lembra que uma parcela significativa das siglas pequenas nasce devido ao descontentamento de militantes dos partidos maiores.

Vereador pela Rede, Ildo Salvi afirma que a medida prejudica a democracia

Vereador pela Rede, Ildo Salvi afirma que a medida prejudica a democracia

“Retrocesso na democracia”

Vereador pela Rede em Lajeado, Ildo Salvi afirma que a proposta em tramitação favorece só os parlamentares que já detêm mandatos. “É um retrocesso na democracia, pois acaba favorecendo apenas os grandes partidos.”

Eleito vereador pela primeira vez em 2012 pelo PT, Salvi saiu do partido em dezembro de 2015 para se filiar à sigla cuja maior representante é a ex-senadora e ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

Nas eleições deste ano, a Rede alcançou menos de 1% do total do eleitorado. Se a cláusula de barreira estivesse valendo, o partido perderia o direito aos recursos do fundo e ao tempo de rádio e televisão.

“Como eu não perderia o mandato, se a reforma avançar dessa forma seria obrigado a escolher algum desses grandes partidos para me filiar”, afirma. Segundo ele, a opção pela Rede ocorreu por causa da ideologia defendida pela agremiação.

“Tenho uma visão de centro-esquerda. Defendo um país e um mundo mais igualitário e não vejo esse tipo de pensamento nos partidos da direita, por exemplo”, alega. Para Salvi, a PEC 36 pode acabar com posicionamentos como o dele na política.

O vereador diz ser evidente o excesso de siglas. Porém, questiona se o motivo para isso é a falta de fidelidade partidária dos filiados ou a falta de respeito dos partidos às ideologias. “Fui para a Rede pela possibilidade de encontrar algo que havia no PT do passado e que hoje não existe mais no PT.”

Em caso de extinção da Rede, afirma que não haveriam outros partidos com o qual se identificaria. “Teria que escolher o menos pior.”

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