Após o sucesso comercial das frutas, verduras e legumes orgânicos, a nova aposta dos agricultores é a produção de carnes livres de resíduos químicos, como a suína. Com um mercado potencial amplo, a carne de porco orgânico pode render aos suinocultores até 30% a mais do que a produzida pelo sistema tradicional.
O agricultor Mauro Gilberto Soares, 54, mantém a tradição do pai Dalmiro. Iniciada faz mais de quatro décadas, a criação de porco orgânico (ou macau como é conhecido na região) tornou-se uma excelente alternativa de renda para a família residente em São Miguel, Cruzeiro do Sul.
Ele e a mulher Vilce, 53, mantêm um plantel de 50 animais na área de um hectare, dividida em piquetes. Soltos, os suínos aproveitam a sombra, a água fresca e as frutas do local.Quase não ficam doentes e são extremamente dóceis. “Adoram carinho. Vivem tranquilos, sem estresse ou qualquer tipo de incomodação”, conta Soares.
Da raça moro, têm pelagem grisalha e são parecidos com um javali. As 12 fêmeas da propriedade fazem os ninhos no mato ou no galpão-maternidade. Os filhotes são amamentados por 60 dias antes de serem vendidos. Cada exemplar custa em média R$ 150. Por ano, são criados 220 animais, média de 18 por matriz. “A gestação dura três meses, três semanas e três dias. Após uma semana, a porca fica no cio e novamente entra no período de prenhez”, conta Soares.
Há dois anos, o sistema foi certificado pela Embrapa. As nascentes, a mata, tudo está preservado. Além de serem criados soltos e sem uso de antibióticos, os porcos são alimentados com produtos de origem orgânica – pasto verde, aipim, batata-doce e cana-de-açúcar, tudo produzido na propriedade, sem uso de agrotóxicos. O complemento é feito com ração, média de um quilo por animal ao dia.
No sistema, Soares conseguiu “aposentar” o alicate usado para aparar os dentes após os primeiros dias de vida. “Aqui eles não se mordem, pois vivem calmos.” A injeção de ferro também foi dispensada. O contato com a terra e o sol evita esse tipo de trato, explica.
A produção é encarada como um desafio, pois a maioria dos produtores mantém os animais em fundo de quintal. Como esse modelo não é aprovado pelas integradoras, quase todos os que persistiam nele desistiram, lamenta Soares. Entre os diferenciais da atividade, está o bem-estar dos animais e a qualidade da carne produzida. “Saudável, macia, boa textura e de excelente sabor”, resume.
Para o abate, o ciclo dura seis meses. Neste período, o animal chega a pesar 120 quilos. A carne é vendida apenas para familiares. Soares fala da necessidade de construir um abatedouro municipal para legalizar o abate, obter o selo de certificação e comercializar a carne de mais produtos. “É uma promessa de vários políticos. Incentivaria outros produtores a iniciar a criação, identifica a procedência e valoriza o produto.”
No mercado, o quilo da carne de porco orgânico está cotado entre R$ 12 e R$ 15. A convencional alcança R$ 8. Há muitos desafios a superar, segundo Soares. Dentre eles, a alimentação à base de insumos orgânicos, que num país com enorme produção de grãos geneticamente modificados é uma tarefa difícil. “Tratar as doenças somente com medicamentos homeopáticos e fitoterápicos, para muitos, é visto como inviável.”
“Existe demanda, falta oferta”
Conforme Elsio Figueiredo, pesquisador no sistema de produção animal da Embrapa de Concórdia (SC), esse é o cenário da produção de carne orgânica no país. Para ele, o sistema aumenta o bem-estar dos animais, pois são criados soltos e alimentados com produtos cultivados sem uso de agrotóxicos. “Temos uma carne muito saudável, no entanto, o sistema precisa ser incentivado. Hoje só temos criações de fundo de quintal.”
Figueiredo diz que a maioria dos produtores desistiu pela falta de orientação técnica, disponibilidade de alimento e pelo sistema de integração, que não permite qualquer outro tipo de criação na propriedade.
Cita a boa valorização dos produtos. O quilo da carne por exemplo chega a ser vendido por R$ 20. “A oferta é muito restrita.” Como o processo de certificação é muito burocrático e demorado, sugere fazer a criação por etapas. “Primeiro se instala a área, depois o controle de doenças, a alimentação e, após completar todos os requisitos, dentro de uma linha verde e sustentável, se busque uma entidade para certificar a propriedade.”
Enquanto no país a atividade ainda engatinha, na Europa, a oferta aumenta a cada dia. As pessoas estão conscientes da importância de consumir um alimento com origem, livre de venenos, que respeita a natureza e prioriza o bem-estar, finaliza.
Agricultura natural
A Korin Agricultura Natural, de São Paulo, fundada em 1994, é pioneira na produção de orgânicos no país. Em todo processo, desde o campo ao beneficiamento, busca o equilíbrio entre preservação, uso dos recursos naturais, bem-estar animal e saúde humana.
Conforme Edson Shiguemoto, diretor comercial da Korin Agropecuária, os produtos da empresa estão presentes em mais de 1,4 mil pontos nos 23 estados. A companhia segue os preceitos da agricultura natural, fundada pelo espiritualista e filósofo japonês Mokiti Okada. “Nosso método privilegia a força do solo, cuja qualidade é fator primordial para a obtenção de boas colheitas. Um produto sustentável é aquele que se origina de uma cadeia que preserva o ambiente, é livre de insumos químicos e valoriza o trabalho e a saúde de todos os envolvidos.”
Carne orgânica
A carne orgânica é produzida sem qualquer tipo de produto químico, fertilizante, agrotóxico ou adubo. É mais leve e saudável. O animal é abatido precocemente, então, não dá tempo de acumular muita gordura, o que torna a textura mais macia e dá sabor diferenciado.
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