Índios trancam BR e clamam por atenção

Vale do Taquari

Índios trancam BR e clamam por atenção

Audiência discute demarcação de terras e pagamento de valores devidos ao Sesai

Índios trancam BR e clamam por atenção
Vale do Taquari

Após duas horas e meia de bloqueio na BR-386, altura do quilômetro 359, na aldeia caingangue em Estrela, indígenas liberaram o fluxo, cujo congestionamento chegou a dez quilômetros. Cerca de 60 pessoas participaram do ato. Foram colocados galhos e troncos de árvores para impedir a passagem dos veículos.

Conforme o coordenador do movimento, cacique Odirlei Fidelis, a principal reivindicação é o pagamento dos recursos atrasados desde agosto à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai).

Devido aos atrasos, os profissionais que atuam na área estão com dificuldades de atender a demanda de consultas, exames e até cirurgias. A norma publicada pelo Ministério da Saúde (portaria 1.907) foi criticada pelo grupo, pois retira autonomia da Sesai e seus coordenadores. “O governo nega o direito à diferença e rompe o pacto firmado pela Constituição de 1988. Estamos preocupados, pois nossa saúde está à beira de um colapso.”

Ao anunciar a nova portaria, o Ministério da Saúde declarou que a medida tem o objetivo de estabelecer um novo fluxo e modelo administrativo para o setor, corrigindo, por exemplo, “distorções de compras de produtos com variação acima de 1000%.”

Após os protestos em todo país, foi publicada nessa terça-feira no Diário Oficial a portaria que retoma algumas das atribuições dos coordenadores dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs), retiradas pela Portaria 1.907, publicada no dia 17.

Para os indígenas, o poder de gestão dos Dseis e da Sesai continua limitado. Segundo Fidelis, mesmo devolvendo a autonomia dos coordenadores, eles ainda estão submetidos a encaminhar para a Secretaria Executiva do Ministério da Saúde para autorização, por exemplo, da remoção de pacientes. “Nós estamos aqui reivindicando nossos direitos. Nossa saúde é precária e querem tirar o que ainda resta”, critica.

Também protestaram contra a PEC 215 que retira do governo federal a autonomia para demarcação de terras indígenas, de quilombolas e Áreas de Proteção Ambiental (APAs). “Transferem para o Congresso Nacional o direito de demarcar novas áreas propostas pela Funai e Ministério da Justiça. Somos contra e queremos a revogação.”

O grupo de indígenas é contrário à aprovação da PEC 241, que delimita um teto para os gastos públicos. “Os impactos são todos negativos. Mudam as leis, portarias e nem nos consultam.”

As reivindicações serão debatidas em audiência nesta quinta-feira, às 14h, no Ministério Público Federal, em Lajeado.

Grupo de indígenas bloqueou rodovia para cobrar do governo mais atenção na área da saúde e na demarcação de terras

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Sistema em colapso

O procurador e atual coordenador do Grupo de Trabalho de Saúde Indígena da 6ª Câmara do Ministério Público Federal, Gustavo Kenner, vê a centralização da gestão dos recursos com preocupação, não só porque contraria um princípio da legislação da saúde indígena, mas também do próprio SUS.

Kenner aponta a paralisação de 1,2 mil contratos. “Nosso medo é que o subsistema de atenção à saúde indígena entre em colapso”, diz.

Acredita que a edição da portaria pode ter sido fruto de um equívoco do Ministério da Saúde, mas também a caracteriza como uma negativa injustificável ao direito à saúde. “Esse direito não pode ser suspenso”, critica.

Em nota, o MPF apontou a inconstitucionalidade e ilegalidade da portaria.

Apreensão

Enquanto aguardava a liberação da pista, Simone Stevan, 42, de Lajeado, tentava acalmar o filho Jordano, 16, com problemas cardíacos. Ao lado do marido, se deslocava para Porto Alegre para consulta no Instituto de Cardiologia com um médico especialista, às 11h. “Demorou dois meses para conseguirmos agendar. Ele vem da Alemanha. Não podemos chegar atrasados.”

Por volta das 9h25min uma das pistas foi liberada e a família seguiu viagem.

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