O cenário está pronto. Convidados esperam a cerimônia. Flores, enfeites brancos. Tudo remete a um casamento tradicional. O diferente é que se tratam de duas noivas. Paula Bagatini, 37, e Dionara de Lima, 24, se casaram em um dos pontos mais bonitos de Colinas em um sábado de sol. “É um laço forte, para a vida toda”, reforça Paula.
De conversas despretensiosas pela internet, nasceu um amor que foge aos padrões estabelecidos pela sociedade. Do início do romance, veio a certeza de terem interesses em comum e a necessidade de ficarem juntas.
O primeiro encontro ocorreu semanas após a aproximação pelo Facebook. “Foi em uma segunda-feira, no Parque dos Dick”, relembra Dionara, sem especificar data. Na ocasião, uma sensação única. Parecia que se conheciam há muito tempo.
Disso veio a certeza. Nasceram para ficar juntas. Para tanto, precisavam mostrar esse sentimento à sociedade. O casamento era questão de tempo. Começaram a organizar a cerimônia no fim do ano passado. A iniciativa veio de Paula, que propôs o noivado à namorada.
Dionara pensou se tratar de uma brincadeira. Mesmo assim, resolveu levar a proposta adiante e surpreender Paula com as alianças. “Fui até ela com os anéis em uma caixinha e disse para levar a ideia a sério.”
O noivado oficial ocorreu em agosto de 2015 e em outubro iniciaram os preparativos da cerimônia do casamento. Dionara ficou encarregada de organizar o evento, enquanto Paula ajudou nas decisões. O documento de homologação, necessário para oficializar o relacionamento, foi obtido com três meses de antecedência.
Durante o casamento, o protocolo civil ficou a cargo de um juiz de paz. O casal e os padrinhos assinaram o restante dos documentos necessários. Católicas, Paula e Dionara fizeram questão de ter também uma cerimônia religiosa, feita por um ministro.
Família não tradicional
Em sua família, Paula sempre encontrou apoio. Quando se assumiu gay, na adolescência, teve acompanhamento psicólogo e apoio das madrinhas e da mãe. “Minha família é tradicional, e tudo isso os ajudou a lidar mais facilmente.” Desde então, resolveu não esconder quem realmente é. “Me recusei a viver um personagem para agradar a sociedade.” Hoje, a relação entre todos é boa. “Minha mãe considera Dionara como uma segunda filha.”
Filho de Dionara e fruto do primeiro relacionamento, Gabriel, 5, considera Paula uma segunda mãe. Todos moram na mesma casa e a convivência se tornou parte da rotina. Para Dionara, o conceito de família é de quem cria e educa, sem importar a orientação sexual. Como a educação começa em casa, não falta amor nem orientação ao pequeno Gabriel. Ainda que fujam do padrão, acreditam que os laços familiares são essenciais para a vida da criança.
Por sempre ter sido independente da família, Dionara não deixou os pais influenciarem na vida amorosa. Quando se assumiu lésbica, a família não aceitou. “Minha mãe sempre soube. Mas ela não me levava a sério por eu ter me relacionado com um homem e ter tido um filho.” Com o tempo, a convivência melhorou e hoje Paula é bem-vinda na casa dos parentes da companheira.
Preconceitos e preocupações
Dionara conta que, apesar de não esconder o relacionamento, o casal prefere não fazer demonstrações de afeto em público. Só o fato de serem lésbicas atrai atenção. “Também é uma questão de respeito. Qualquer excesso em público é ruim. Inclusive de casais heteros”. A preocupação com a imagem é constante.
O preconceito faz parte da rotina. Para romper essa barreira, optam pelo diálogo. Dionara conta que é comum ouvir que “é bonita demais para ser lésbica”. “Essa ideia machista não tem coerência. Não escolhemos a quem amar.” Paula ainda complementa: nascemos assim.
Os comentários pejorativos também recaem sobre Gabriel, como se a relação entre Dionara e Paula pudesse influenciar a orientação do menino quando crescer. “Isso é um absurdo porque eu sou lésbica e não fui criada por duas mulheres”, diz Dionara.
Segundo ela, o preconceito enfrentado por pessoas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros) faz parte de um pensamento arcaico da sociedade, perpetuado entre gerações. “Existem muitos jovens que reproduzem esses ideais porque aprenderam com os pais e avós.” Segundo Paula, os casais heteros que costumam ser infiéis ajudam a alimentar a ideia intolerante. São pessoas que têm casamentos “de fachada”, mas têm amantes do mesmo sexo. “A vida é muita curta para viver de aparências.”