MP investiga fraude na venda de adubos e fertilizantes

Vale do Taquari

MP investiga fraude na venda de adubos e fertilizantes

Operação NPK do Gaeco cumpre 36 mandados de busca e apreensão em 27 cidades gaúchas, uma no Paraná, e outra em Santa Catarina. O Ministério Público (MP) investiga nove pessoas de dois grupos com bases em Colinas, Lajeado, Estrela e Arroio do Meio, que estariam atuando na adulteração e falsificação de adubos e fertilizantes para a posterior venda.

MP investiga fraude na venda de adubos e fertilizantes
Vale do Taquari

O Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MP, com apoio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e da Brigada Militar (BM), desencadeou ontem a Operação NPK. Uma pessoa foi presa por porte ilegal de arma, e 82 toneladas de adubos e fertilizantes supostamente adulterados foram recolhidas. Suspeitas recaem sobre nove investigados.

Todos são suspeitos de participação em organização criminosa, lavagem de dinheiro, ocultação de bens, estelionato e crime contra as relações de consumo. Além dos 36 mandados de busca e apreensão em residências e outros imóveis, foram cumpridos outros dez para apreensão de caminhões, veículos e implementos agrícolas. Para o MP, são bens adquiridos com dinheiro ilícito.

Entre os suspeitos, que ainda não foram denunciados pelo MP à Justiça, quatro são de Lajeado, um de Colinas, um de Estrela, e os outros três de São Luiz Gonzaga, Júlio de Castilhos e Carazinho.

Durante a terça-feira, além de ouvir os prováveis envolvidos, os investigadores recolheram 32 toneladas de fertilizante falsificado com um comprador lesado em São Luiz Gonzaga, 24 toneladas em um depósito localizado às margens da ERS-130, em Arroio do Meio, em nome da AgroVale, e outras 26 toneladas em um galpão de outro grupo, instalado na divisa de Colinas com Estrela, na ERS-129, que vinha sendo alugado pela GS Comércio de Fertilizantes.

A operação, que iniciou faz um ano, após denúncias encaminhadas ao MP do Estado pela Ouvidoria-Geral da Assembleia Legislativa, prossegue nos próximos dias com intuito de localizar outros compradores lesados – e já previamente detectados. Na ação de ontem, foram apreendidas cinco armas e munição.

Também foram cumpridos mandados em Bento Gonçalves, Cambará do Sul, Candelária, Carazinho, Chiapeta, Flores da Cunha, Gaurama, Ibirapuitã, Júlio de Castilhos, Panambi, Pareci Novo, Planalto, Rio Pardo, Saldanha Marinho, Santa Cruz do Sul, São Gabriel, São Luiz Gonzaga, São Nicolau, São Pedro das Missões, São Sebastião do Caí, Venâncio Aires, Colombo (PR) e Correia Pinto (SC).

Além do Ministério Público, do Mapa e da BM, participaram fiscais da Receita Federal. Coletiva foi realizada na sede da Procuradoria de Justiça de Lajeado

Além do Ministério Público, do Mapa e da BM, participaram fiscais da Receita Federal. Coletiva foi realizada na sede da Procuradoria de Justiça de Lajeado

A investigação

Conforme as investigações, um dos grupos tem base de atuação em Colinas e o outro em Lajeado e Arroio do Meio. A fraude consistia na mistura de produtos com os fertilizantes que eram comprados de forma regular ou irregular, muitos originados de desvios em portos brasileiros e designados como varredura. A mulher do homem suspeito de liderar o grupo em Colinas nega. “Só alugamos o espaço, e desde dezembro não sai nada daqui”, diz.

O coordenador do Gaeco, Reginaldo da Silva, explica que as indústrias cujas embalagens eram falsificadas não estão envolvidas na fraude. “A mistura era tanta que certas amostras sequer tinham níveis aferíveis de nitrogênio, potássio e cálcio.” Segundo ele, os suspeitos transformavam, a partir da adição de calcário, ureia e até mesmo restos de telhas e lajotas, uma tonelada de adubo em três.

“Também foram produzidos sacos em gráficas e falsificadas etiquetas com a classificação do produto e data de validade. O produtor comprava o adubo acreditando na qualidade”. Conforme Silva, foram localizadas 200 sacas do produto já misturado – e pronto para a venda – em uma agropecuária de Santa Catarina. “Isso que eles não costumavam guardar em estoque.”

No Paraná, explica Silva, o grupo comprava a matéria-prima – em especial o calcário – para adulterar e aumentar o produto original.

Segundo a chefe da Divisão de Defesa da Superintendência Federal do Mapa, Ana Stepan, são 90 estabelecimentos que produzem fertilizantes de forma legal no estado, 400 que comercializam e 31 que importam. “É preciso evitar a compra pela internet ou de vendedores ambulantes, e verificar quais são os representantes comerciais da área junto ao SAC das empresas”, salienta.

Para Ana, o produtor que comprou as marcas Maxifertil, Macrofertil e ADN deve procurar o MP, pois todas já deixaram o mercado faz cerca de um ano. “Quem comprou em 2016 certamente adquiriu produto falsificado.” Ela salienta ainda a necessidade de os produtores encaminharem produtos suspeitos para análise do Mapa. Para tal, eles devem pagar pelo trabalho do laboratório.

Alerta em 2015

Há um ano, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Estrela intermediou a compra de seis mil sacas de adubo pelo Programa Subsidiado de Insumos. Cada uma teve um custo de R$ 59. Quando produtores descobriram que o produto estava adulterado, em torno de 3,5 mil sacas foram recolhidas e devolvidas ao fornecedor, cuja sede é a mesma verificada ontem, em Colinas.

Conforme o tesoureiro do STR, Gilmar Walter, o restante do produto já tinha sido aplicado pelos 50 produtores. “Nosso objetivo era fornecer o insumo a um preço mais acessível do que o praticado no mercado. A diferença na época chegou a R$ 10 por saca. Pela marca (Macrofértil), nunca imaginamos qualquer adulteração. As primeiras cargas vieram até com atestado de qualidade.”

Após o caso ter sido revelado pelos produtores lesados, o STR encaminhou amostras para o laboratório da Unisc, em Santa Cruz do Sul, e para o Mapa, onde se comprovou a alteração. Em seguida, os agricultores e a entidade ingressaram na Justiça para cobrar os prejuízos, calculados na época em R$ 148 mil. “Está tudo parado. Os proprietários nunca foram localizados nas operações.”

Outros nove agricultores processam o fornecedor e também o STR de Estrela. O valor total da ação supera os R$ 80 mil em danos materiais e inclui ainda 15 salários mínimos para cada produtor por danos morais.

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Troca de fornecedor

O agricultor Afonso Caye, de Estrela, comprou 25 sacas de adubo. Dessas, oito foram devolvidas após a fraude ser revelada em setembro do ano passado. O restante tinha sido aplicado na lavoura de milho. “Como a planta ficou amarela, fraca, fui obrigado a aplicar o insumo duas vezes.” Para evitar um novo prejuízo, decidiu trocar de fornecedor e de marca. O dinheiro foi devolvido.

O produtor Adriano Blume, de Linha São Jacó, também em Estrela, comprou e aplicou no ano passado 150 sacos de adubo em 30 hectares de milho. Apesar de ouvir boatos sobre a venda de produto falsificado, nunca desconfiou ser um dos prejudicados. “Não temos o costume de fazer análise. Isso é competência dos órgãos fiscalizadores e esses precisam aumentar o rigor para evitar esse tipo de calote.”

Blume conta que o desenvolvimento da planta foi prejudicado e o custo para tentar recuperar o rendimento por hectare aumentou. Foram aplicados sete sacos de ureia, quando o normal é cinco por hectare. Mesmo assim, a quantidade de silagem produzida caiu de 35 toneladas para 28 toneladas.

Cronologia

05_ahora.indd•No dia 28 de agosto de 2015, um golpe prejudica agricultores. Uma mistura com cacos de tijolos, telha e restos da construção civil é vendida no campo como se fosse fertilizante;

•Dia 1º de setembro de 2015, o STR de Estrela alerta associados para possível fraude. Entidade adquiriu seis mil sacas de adubo por meio de um programa que subsidiava a compra de insumos como adubo e ureia.

05_ahora.indd•Dezembro de 2015, grupo de nove produtores lesados com o golpe ingressam na Justiça contra sindicato. Cobram reparação das perdas e danos morais.

•Agosto de 2016, o MP deflagra operação contra nove pessoas e cumpre mandados de busca e apreensão em 27 cidades. Pelo menos 82 toneladas de produtos adulterados foram recolhidas.

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