O encontro integra as ações do Núcleo de Polícia Comunitária, criado em 2014. De acordo com o escrivão Juliano Clavé, o trabalho na escola começou a partir de conversas com a equipe diretiva.
“Foi um pedido de socorro”, lembra. Conforme Clavé, o colégio era um dos poucos da cidade que ainda não tinham atividades do núcleo. Os primeiros encontros ocorreram faz cerca de 40 dias. Quatro agentes realizaram conversas com os alunos, dois em cada turno.
“No turno da manhã, os agentes pediram para alguns meninos da 8a série tirarem os bonés, como é de praxe, e eles não só afrontaram como tentaram partir para cima dos policiais”, relata. O fato alertou para a gravidade do problema.
“Conseguimos contornar a situação, mas foi a primeira vez que agentes foram confrontados nas escolas durante esse trabalho”, ressalta. De acordo com a supervisora Kelen Giongo, a indisciplina se agravou ao longo do tempo até alcançar um patamar insustentável.
“Temos como prática chamar as famílias para conversar, mas chegamos ao ponto em que os pais nos dizem não saber como impor limites aos filhos”, alerta. Diante dessa situação, os professores pensam em desistir da escola.
“Todos os dias os professores demonstram a frustração e a tristeza de não conseguir trabalhar. O sentimento é de impotência”, relata.
Orientadora educacional, Helena Araújo relata a necessidade de união entre pais, alunos, funcionários e professores para contornar as dificuldades. “Não pode a família repassar para a escola a responsabilidade por educar seus filhos”, alerta.
Para ela, a escola necessitaria de uma equipe multidisciplinar, incluindo psicólogas, para um trabalho permanente com os alunos.
“Hoje não temos recursos, pois dependemos do poder público”, lamenta. Conforme Helena, os professores relatam cansaço e estão adoecendo. Se não houver mudanças, afirma, muitos deixarão o colégio ainda neste ano.
Solução urgente
A reunião de terça-feira começou com a exibição de um vídeo do educador e filósofo Mário Sérgio Cortella sobre o papel dos pais e da escola na educação das crianças. Na fala, Cortella reafirma que a responsabilidade familiar pela educação não pode ser terceirizada para as instituições de ensino.
Em seguida, Juliano Clavé falou sobre o aumento das situações de enfrentamento à autoridade ao longo dos anos. “Vivemos uma crise séria, que começa na família, passa pela escola e acaba chegando na sociedade como um todo.”
A diretora do São João Bosco, Loiva Crestani Fauri, relatou aos pais os problemas enfrentados pelos professores e fez um alerta sobre a possibilidades de os profissionais abandonarem a instituição. “Se não entrarmos em um acordo, vamos ter que fechar turmas”, admitiu.
Segundo ela, em 24 anos trabalhando no colégio, é a primeira vez que os problemas de indisciplina chegam a esse patamar. Lembra que a turma mais problemática chegou a ser dividida em duas. “Hoje temos uma 8a série com 12 e outra com 14 alunos e não melhorou.”
Diante do relato, os pais manifestaram a intenção de manter os filhos na escola e sugeriram a transferência dos alunos indisciplinados. Muitos disseram não ter condições de levar e buscar as crianças em instituições distantes do bairro Conservas.
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“Não dá nada”
Promotor de Justiça de Lajeado, Ederson Luciano Vieira foi incisivo. Aos alunos, falou que a conversa tinha a intenção de saber os motivos para os casos de indisciplina para que “não coloquem a vida fora.”
“Tem muita gente dizendo para vocês que o certo é o errado, mas esse caminho pode levar a tragédias.” Ao ser questionado por um jovem, alertou para a cultura do “não dá nada”, frase dita pelo rapaz que classificou como um dos problemas dessa geração.
“Essa ideia termina quando as pessoas se veem diante do presídio, da Fase ou mesmo do cemitério”, bradou. O promotor retratou a dura realidade dos condenados no sistema prisional para ilustrar o destino daqueles que enfrentam as leis.
“Assim como afrontam na escola, também fazem na família e na sociedade, até que acabam pagando de alguma forma. Aí, percebem como termina esse ‘não dá nada.’”
Ao fim da reunião, a comunidade escolar e as autoridades entraram em um acordo. A orientação é que casos mais graves, envolvendo ameaças, calúnia, difamação e dano ao patrimônio, sejam registrados na polícia e comunicados aos pais.
Conforme Clavé, todos os órgãos participantes do núcleo de polícia comunitária se colocaram á disposição para continuar o trabalho em conjunto com a escola. As próximas reuniões estão marcadas para agosto, após as férias de inverno.
Trabalho permanente
Coordenadora-adjunta da 3ª Coordenadora Regional de Educação, Greicy Weschenfelder afirma que a CRE está ciente da complexidade dos problemas enfrentados pela escola. “É uma situação delicada, por isso, temos que agir com todas instituições.”
Lembra que o Estado não disponibiliza psicólogos para um trabalho permanente nas escolas. “Tanto a diretora Loiva quanto os professores são reconhecidos pelo esforço de não ter desistido dessas crianças. Nossos professores são heroicos.”
Segundo ela, os problemas se agravam diante do contexto de efervescência social vivido no dia a dia das comunidades. “Percebemos um consumismo exagerado e a desestruturação das famílias. A escola é um espaço que reflete essa realidade.”
Para ela, é necessário investir em trabalhos sistemáticos e permanentes. “Estamos diante de uma questão social que exige essa união de todos os envolvidos.”