Os telefonemas entre Oreno Ardêmio Heineck, diretor-executivo do Instituto Gaúcho do Leite (IGL), e Clóvis Marcelo Roesler, secretário da diretoria-executiva do Instituto Gaúcho do Leite (IGL) e integrante da Associação das Pequenas Indústrias de Laticínios do RS (Apil-RS), causaram revolta entre os elos da cadeia leiteira.
Roesler é dono de uma empresa de laticínios em São Pedro da Serra e foi preso durante a 11ª Operação Leite Compen$ado e a 4ª Operação Queijo Compen$ado, deflagradas na terça-feira em quatro cidades no Vale do Caí. As indústrias são suspeitas de adulterar os produtos com água, amido, ácido sórbico e água oxigenada.
Depois da revelação das escutas telefônicas e o constante embate com diretores da Farsul acerca de seu trabalho na cadeia leiteira, Heineck anuncia a intenção de deixar o cargo em breve. “Já converso com o presidente sobre isso. Quem sabe voltamos à situação do passado, onde cada entidade decidia por si só. Temos meia dúzia nesta luta para organizar o setor e está na hora de parar, de me aposentar.”
Sobre as escutas, Heineck diz que procurará o promotor Mauro Rokenbach para uma conversa. Classificou a fala dele como “infeliz” e precipitada. Há indícios de participação dos dirigentes para interferir no trabalho das autoridades, inclusive com o objetivo de “derrubar” o secretário estadual da Agricultura, Ernani Polo. Heineck destaca incômodo com o posicionamento de Polo quanto à inadimplência de três grandes empresas (Lactalis, CCGL e Nestlé) quanto ao atraso no pagamento de tributos ao Fundoleite. “Não tenho nenhuma insatisfação quanto às fraudes descobertas”, afirma.
Cita que por obrigação legal o IGL comunicou a inadimplência e pediu providências ao secretário para interceder junto à Secretaria da Fazenda e cobrar posterior inscrição dessas empresas no Cadin. “Polo fez apenas medidas protelatórias de proteção para essas indústrias.”
A função do IGL, segundo ele, é ajudar a cadeia do leite, e jamais ser conivente com a fraude. Sobre Roesler, diz: “Não cabe a nós procurar saber como ele atuava dentro de sua empresa.”
Divergências com a Farsul
Heineck lamenta os constantes ataques dos quais ele como diretor e o IGL são alvos por parte da Farsul, principalmente na figura do presidente Carlos Sperotto e do coordenador da Comissão do Leite, Jorge Rodrigues. Desde a criação do instituto, a entidade nunca participou das discussões e tem sido contra a nossa atuação e tem interesse na extinção, destaca.
Critica a postura de Rodrigues, a qual classifica como doentia. “Quando ele não tem o comando, é contra. Várias medidas do estado ele abortou. A última tentativa foi em maio quando tentou impedir a realização da Expoleite. A queda de braço é forte e não sabemos se vamos resistir.”
Aponta um alinhamento político de Polo com a Farsul e as grandes empresas de laticínios. “Para a Farsul, não interessa ter a cadeia organizada. Eles querem pegar os produtores que interessam e o resto que se dane”, finaliza.
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Inversão de valores
Para o promotor Mauro Rockenbach, como Polo é um dos principais defensores das ações do MP no combate às fraudes, existe o interesse de destituí-lo do cargo. Segundo ele, as escutas revelam que o envolvimento de membros do IGL nas fraudes evidencia a clara inversão de valores dentro da entidade, cuja propósito principal para qual foi criada era gerar melhorias para o setor. “O trabalho do IGL está desvirtuado. Quer conquistar espaço e influência política e garantir acesso aos recursos estaduais para facilitar as atividades das indústrias associadas”, declara.
Além de Heineck, Rockenbach chamará o secretário-executivo da Associação das Pequenas Indústrias de Laticínios do Rio Grande do Sul (Apil/RS), Alexandre Cunha Rota, para prestar esclarecimentos. Ele também aparece nas escutas com Roesler e fala “colocar o dedo no MP-RS”, autor das investigações quanto às fraudes na cadeia leiteira.
Embora as conversas não configurem crime, o promotor entende que essas trocas de ideias são preocupantes, pois, além de tentar arquitetar formas de derrubar o secretário, tinham o objetivo de atrapalhar o trabalho do MP.
O que diz o IGL, o Sindilat e a Apil
O presidente do IGL, Gilberto Piccinini, afirmou em nota que não se manifestaria sobre as escutas.
Alexandre Guerra, presidente do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados (Sindilat-RS), disse que apoia as investigações e que a “Justiça tem de prevalecer e punir com o rigor da lei não importa quem seja.”
O presidente da Associação das Pequenas Indústrias de Laticínios, Wlademir Pedro Dall’Bosco, manifesta colaboração às investigações.