O líder nacional do PMDB, Michel Temer, assume a presidência da República pela terceira. Diferente das duas primeiras oportunidades, quando sentou na cadeira presidencial na condição da chefe da câmara, em 1998 e 1999. Dessa vez o advogado paulista responde pelo Executivo em meio a um polêmico processo de impeachment.
A posse temporária foi confirmada por 55 votos a 22. Os senadores aprovaram o parecer da comissão especial e deram prosseguimento ao impeachment da presidente. Dilma ficará até 180 dias afastada. Ao voltar, passa por novo julgamento, precisando do apoio de um terço dos parlamentares. Do contrário, perde o mandato e fica inelegível para cargos públicos.
Como primeira ação após assinar a posse, Temer reduziu de 30 para 24 ministérios.
A nomeação do quadro iniciou por volta das 17h. Henrique Meirelles (Fazenda), Romero Jucá (Planejamento), Eliseu Padilha (Casa Civil), Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) e José Serra (Relações Exteriores) são alguns nomes do alto escalão escolhidos por Temer.
Dois ministros empossados ontem vão mudar de foro nas investigações da Operação Lava-Jato. Henrique Alves, do Turismo, e Geddel Vieira Lima, da Secretaria de Governo, serão desmembrados da força-tarefa, em Curitiba, e passam a ser tratados no Supremo Tribunal Federal (STF).
No primeiro pronunciamento, Temer – também citado na Operação Lava-Jato por suposto recebimento de propina e desvios na Petrobras – afirmou que é preciso resgatar a credibilidade do país. “É urgente pacificar a nação e unificar o país. Fazer um governo de salvação nacional. Partidos políticos, lideranças organizadas e o povo brasileiro precisam contribuir para sairmos dessa grave crise.”
Sobre reformas, garantiu atenção para discutir a revisão do pacto federativo e pretende estudar alterações na previdência. Por fim, garantiu sequência aos programas sociais, e afirmou que não irá extinguir direitos sociais conquistados pelos cidadãos nas últimas décadas.
Despedida com citações ao “golpe”
No pronunciamento pela manhã, Dilma Rousseff voltou a usar o termo “golpe”. Segundo ela, o atraso nos repasses a bancos públicos, os decretos suplementares e a forma de custeio do Plano Safra são ações corriqueiras e já cometidas em governo anteriores.
“Meu governo tem sido alvo de intensa e incessante sabotagem. O objetivo evidente vem sendo me impedir de governar e, assim, forjar o ambiente propício ao golpe. Quando uma presidente eleita é cassada sob acusação de um crime que não cometeu, o nome que se dá a isso no mundo democrático não é impeachment, é golpe”, afirmou.
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Bastidores em Brasília
O repórter do Grupo Independente, Ricardo Sander, acompanhou em Brasília a votação tanto na câmara quanto no senado. “Dessa vez havia menos manifestantes. Estimaram em 12 mil, e na primeira votação eram mais de 80. A estrutura de segurança próxima ao congresso também era menor. E o trabalho da imprensa foi mais tranquilo, com menos cobrança pelo uso de terno e gravata.”
Sobre o clima entre os parlamentares, Sander comenta ter percebido uma situação mais conformada com a derrota da presidente no congresso. Para ele, os senadores e deputados federais da base do governo pareciam “pressentir” a votação contrária ao mandato de Dilma Rousseff. “Não vi provocação entre eles, diferente da câmara dos deputados, quando houve embates ríspidos entre parlamentares e quase briga na entrada do plenário.”
Histórico de Dilma
Dilma Rousseff, 68, de combatente contra o Regime Militar, chegou a presidência da República mesmo sem histórico de concorrência a cargos eletivos.
•Nasceu em Belo Horizonte, no dia 14 de dezembro de 1947. Segunda filha dos três filhos do migrante búlgaro, Petár Rusev, que adotou o nome de Pedro Rousseff. O pai empreiteiro proporcionou à família uma vida de classe média alta;
•Dilma ingressou nas atividades políticas aos 17 anos. Em 1964, começou a militar na Polop (Organização Revolucionária Marxista – Política Operária);
•Entre 1967 e 1972, Dilma militou em duas organizações de luta armada contra a ditadura. Viveu na clandestinidade e abandonou o curso de economia na UFMG.
• Foi presa em janeiro de 1970, e ficou detida na Oban (Operação Bandeirantes). Lá, sofreu com a tortura dos militares durante 22 dias;
•Dilma deixou a cadeia em 1972, e foi morar com os sogros, em Porto Alegre;
•Ela se formou em economia pela UFRGS e, em 1976
•Com o fim das lutas armadas, Dilma e o marido filiaram-se no PDT de Leonel Brizola;
•Entre 1989 e 2003, Dilma foi secretária de Fazenda e de Energia, Minas e Comunicações no RS. Entrou no PT em 2001;
•Em 2003, Dilma foi nomeada ministra de Minas e Energia. Em 2005, atuou como ministra-chefe da Casa Civil;
•Em 2010, Dilma foi eleita a primeira mulher presidente;
•Em 2014, Dilma foi reeleita presidente;
Perfil de Temer
Michel Temer, 75, é advogado, pai de cinco filhos, frutos de três casamentos. Os dois caçulas são de seu relacionamento com Marcela Temer.
•Michel Miguel Elias Temer Lulia nasceu em Tietê (SP), no dia 23 de setembro de 1940. É o caçula de oito irmãos. A família imigrou de Betabura, região de El Koura, no norte do Líbano, em 1925;
•Michel se formou em direito pela USP em 1963;
•Iniciou a carreira política como oficial de gabinete de Ataliba Nogueira;
•Em 1985, criou os Conselhos Comunitários de Segurança (CONSEGS). Criou a primeira Delegacia da Mulher no Brasil. Nesse período, também instituiu a Delegacia de Proteção aos Direitos Autorais e a Delegacia de Apuração de Crimes Raciais;
•Já pelo PMDB, se elegeu deputado federal por São Paulo pela primeira vez em 1986;
•Após a Constituinte, foi reeleito deputado federal e exerceu seis mandatos – todos pelo PMDB;
•Em 1992, assumiu o cargo de Secretário de Segurança Pública uma semana após o massacre do Carandiru;
•No ano de 1994, foi aliado importante de FHC. Como presidente da Câmara dos Deputados, articulou o apoio da legenda para a aprovação da emenda da reeleição;
•Temer apoiou José Serra para presidente em 2002. Seu nome chegou a ser cogitado como vice na chapa;
•Em 2011, assumir a vice-presidência da República e foi reeleito vice-presidente em 2014;
Líderes da região se posicionam sobre o processo de impeachment de Dilma Rousseff
“Eu vejo que foi um impeachment político em que ela teve a grandeza de sair pela porta da frente e não fez como Collor que saiu pela porta dos fundos. As pedaladas foram feitas por todos, inclusive Lula e FHC. Ninguém diz que ela roubou ou cometeu crime.”
Sérgio Marasca – Presidente Amvat e prefeito de Westfália
“Ela ganhou uma eleição. As pedaladas e todas as outras questões estão sendo julgadas por muitos deputados que estavam na Câmara por anos e não perceberam os erros. Se um vereador é fiscalizador, imagine um deputado. Também me deixa preocupado quem está assumindo.
O que tem de acontecer é passar a limpo a história do Brasil. Então muitos políticos têm ser investigados e cassados. Nós temos eleições logo e ouvimos sempre que político é tudo igual. O povo precisa começar a analisar e fiscalizar seus candidatos. Eu acho esse impeachment absurdo, que comece uma nova eleição e que a sociedade vote melhor.”
Adair José Villa – Secretário da Avat e vereador de Muçum
“’É a economia idiota’. O problema é a economia e a Dilma está pagando por isso. No caso Clinton, e a história da Mônica Lewinsky, ele disse uma mentira e a Câmara autorizou o Senado a cassá-lo. Mas chegou ao Senado e os senadores disseram “a economia está crescendo 4% então para com isso”. Se a economia estivesse crescendo a 3% ou 4%, a Lava-jato estaria aí e ela (Dilma) não seria afetada. Como a economia está mal, ela acaba envolvida. As pedaladas e as outras questões debatidas são firula. A questão é econômica.”
Ney Lazzari – Reitor da Univates
“É tudo decepcionante. O novo presidente já assume cometendo erros, como a nomeação do filho do Sarney. Existe uma grande desconfiança de que não mude muita coisa, pois nós temos de mudar as bases do país e fazer reformas. Se isso não for feito, ficaremos na mesma. Hoje temos a esperança de alguém que tenha coragem de fazer as reformas necessárias. Tomara que o Temer consiga. A economia acredito que poderá melhorar a partir do ano que vem, não vejo mudanças a curto prazo já que o próprio setor público está deficitário. Tem que tomar atitudes para que tenhamos respostas a médio e longo prazo. Acho que agora vai se criar um ambiente no qual se acredita que as coisas vão melhorar. Vai depender do comportamento deste governo. Nós não queremos fazer mais impeachment. Tem que reduzir despesas, tem de cortar na carne. É preciso fazer o dever de casa. Cortar despesas para depois poder retomar o crescimento.”
Henrique Purper – Vice-presidente da CIC
“Se analisar o processo como foi instaurado, foi em cima das pedaladas fiscais e dos créditos suplementares. Por essa análise, nós entendemos que isso não caracteriza o crime para o impedimento dela. Porém, não está sendo um julgamento técnico, mas político. Se fala da Lava-Jato, e isso não está no processo, e mesmo se o tema fosse a operação ela não é investigada, e está sendo afastada por pessoas investigadas. Dos 81 senadores, 48% têm algum tipo de investigação. Eles deveriam ter sido afastados primeiro. O caso é que ela não roubou e quem o fez está solto. Nossa maior preocupação é o que o Eliseu Padilha já prometeu reformas e entre elas a trabalhista. Que reforma é essa? A que está prometida na Ponte Para o Futuro, com a terceirzação plena. Isso significa o fim dos direitos trabalhistas. Estamos preocupados com o que vem pela frente.”
Marco Daniel Rockenbach – Presidente do Sindi Comerciários
“O que o país está vivendo hoje não tinha como continuar. É ler jornal diariamente e ver empresas centenárias fechando, algumas que até utilizávamos com cases de gestão. Essa crise sem precedentes é agravada por corrupção e crimes de responsabilidade. Depois de pouco tempo, em que o Brasil era considerado a bola da vez, fomos de um momento de euforia para um sentimento oposto. Acho que não tínhamos outra solução senão o impeachment, pois não víamos neste governo vontade política de fazer as mudanças. O impeachment tinha de acontecer, agora vamos ver se o Temer tem condições de fazer o que precisa. Ele agora tem essa grande oportunidade, basta saber se terá condições de fazer essas mudanças.”
Aline Eggers Bagatini – vice-presidente de relações institucionais Acil
“Era algo absolutamente necessário pela falta de governabilidade. A articulação política da Dilma sempre foi muito ruim e neste segundo mandato ela não conseguiu implementar nada. Nós estamos muito mal representados em nossas instituições, quer seja presidência, Câmara ou Senado. Isso trouxe uma insegurança econômica e política. ‘O Michel é tão ruim quanto’ sim, não gostaríamos que fosse ele. Mas pelo menos ele está fazendo um discurso de manutenção dos bolsas, do assistencialismo e trazendo credibilidade. Nós precisamos de parceiros internacionais que sejam fortes. Estávamos sendo parceiros de Venezuela, Cuba, etc. Países nos quais só despejávamos dinheiro. Essa história de golpe, eu não entendo como algumas pessoas ainda falam nisso. É uma situação legal, claro que passou por uma situação muito mais política. Mas por trás dela têm muitos problemas de denúncias, corrupção e que fatalmente, se ainda não chegou a ela, talvez cheguem agora. Nós fizemos essa mexida. Não é quem gostaríamos de ter, mas nem sei se temos um líder que nos represente. O que precisamos é retomar a confiança dos investimentos.”
Ricardo Luís Diedrich – Vice-presidente de capacitação CDL e vice-presidente da AGV
“Eu vejo que não tem nada de irregular ou inconstitucional. Vejo que ela cometeu os crimes imputados a ela e por isso sou favorável ao impeachment. Claro que isso vem também na esteira de toda a corrupção que se instalou no país, isso criou um clima favorável para o afastamento. Agora acredito que não deve ser comemorado como fator positivo ou festa. Na verdade isso é muito ruim para o país. Mas também entendo que será o marco para o reinício de uma administração pública que respeite a Constituição e o Estado Democrático de Direito.”
Nei Di Domênico – Presidente OAB Encantado