Câmara anula votação e altera cenário político

País

Câmara anula votação e altera cenário político

Presidente interino da Câmara Federal, o deputado Waldir Maranhão (PP), determinou a anulação do processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff, sugerindo nova votação no plenário. A medida atende a pedido da Advocacia-Geral da União (AGU), mas foi desconsiderada pelo chefe do Senado, Renan Calheiros. Economista avalia impacto das decisões na economia.

Câmara anula votação e altera cenário político
Brasil

“Nenhuma decisão monocrática pode se sobrepor a do colegiado.” Com essa frase, o chefe do Senado, Renan Calheiros (PMDB), confirmou para esta quinta-feira a votação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Apesar disso, o trâmite ficou ameaçado pela surpreendente decisão do presidente interino da Câmara, que anulou a admissibilidade aprovada pela maioria dos deputados federais no dia 17 de abril.

Waldir Maranhão (PP) acolheu o pedido apresentado pelo advogado-geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, que pedia a anulação do resultado, quando 367 deputados foram favoráveis à admissibilidade do impeachment. Na sessão, o atual presidente da Câmara votou contra o impedimento da presidente, desconsiderando orientação do PP.

O recurso da AGU foi protocolado no dia 25 de abril, uma semana após a sessão. Foi desconsiderado, na época, por ter sido enviado após o encaminhamento do processo ao Senado. Mas não foi arquivado. Nessa segunda-feira, após reunião com Cardozo, Maranhão resolveu acatar o pedido. No despacho, o presidente interino marcou uma nova votação para daqui a cinco sessões plenárias. A ideia é que os deputados federais voltem a analisar o pedido de impeachment. O prazo, em um primeiro momento, começaria a contar no momento em que o processo for devolvido pelo Senado. Apesar disso, Calheiros resolveu dar seguimento ao cronograma instituído.

“Aceitar essa brincadeira com a democracia seria ficar pessoalmente comprometido com o atraso do processo”, afirmou Calheiros, lembrando que a comissão especial do Senado já trabalhou mais de 70 horas nesse processo. Segundo informações, a área técnica da Câmara dos Deputados não foi consultada sobre a decisão do interino e, após ser informada, chegou a desaconselhar Maranhão, alegando falta de embasamento jurídico para a medida.

Detalhes da decisão

Em nota, Waldir Maranhão afirma que a petição encaminhada pela AGU não fora analisada pela Casa e que, “ao tomar conhecimento dela, resolveu acolher.” No documento, ele comenta que “ocorreram vícios que tornaram nula de pleno direito a sessão em questão” e critica a postura de parlamentares no momento do voto.

Entre as outras discordâncias apresentadas por Maranhão, com base no pedido da AGU, os partidos políticos “não poderiam ter fechado questão a favor ou contra o impeachment, pois quando há o chamado fechamento de questão, os deputados devem seguir a orientação partidária, sob pena de punição, como expulsão da legenda.”

Para o presidente interino, os parlamentares deveriam “votar de acordo com as suas convicções pessoais e livremente”. Cita ainda que os deputados não poderiam ter anunciado seus votos antes da sessão, acrescenta que a defesa de Dilma “deveria ter tido o direito de falar durante a votação” e, por fim, alega que o resultado da votação deveria ser formalizado por resolução, e não por ofício.

“Foi uma patetada do deputado”

Para Heitor Schuh (PSB), parlamentar gaúcho, a decisão do presidente interino da Câmara foi uma “patetata”. “O Waldir é reitor de universidade. Como tal, me surpreendeu pela patetata e pelo desserviço prestado ao nosso país. Na Comissão de Ética, fez de tudo para defender Eduardo Cunha. E agora se acha mais importante que o voto de mais de 500 deputados.”

Schuh não acredita em qualquer suspensão do processo de impeachment. Diz que a decisão de Calheiros foi “republicana”, e lembrou que o STF indeferiu pedido semelhante interposto pelo deputado, Paulo Teixeira (PT), que pedia a anulação da processo. “Maranhão ficará na história como um malfeitor da democracia. Deve pedir para ir embora após envergonhar todo o Congresso.”

“É mais um capítulo do golpe parlamentar”

Um dos líderes da bancada gaúcha do PT, o deputado federal, Henrique Fontana, afirma que o “pingue-pongue” de decisões de ontem é mais um capítulo do que ele chama de “golpe parlamentar”. “Salta aos olhos a ilegitimidade do processo. A decisão dos opositores de desrespeitar o pleito de 2014 trouxe instabilidade governamental que causa prejuízos ao cotidiano de todos.”

Para ele, independente das decisões tomadas por Maranhão e Calheiros, o PT vai recorrer ao STF para pedir a anulação de todo o processo de impeachment. “Seguramente vamos ao supremo buscar a nulidade do golpe. Nossa defesa foi impedida de atuar na votação, e as provas de abuso de poder contra Cunha mostram que ele também agiu dessa forma enquanto organizava o impeachment.”

Segunda-feira quente

12h10min: o presidente interino da Câmara dos Deputados, Waldir Maranhão (PP), acolhe pedido da AGU e anula a votação que autorizou, em 17 de abril, a admissibilidade do pedido de impeachment;
12h40min: a presidente da República Dilma Rousseff comentou o ato de Maranhão durante discurso no Palácio do Planalto. Disse que não sabe que consequências terá o ato e ressaltou que o país vive um momento de “manhas e artimanhas”;
16h40min: o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), anunciou, em Plenário, que está mantida a tramitação do processo de impeachment, cuja votação pode ocorrer na quinta-feira;
17h50min: um dos vice-líderes do governo na Câmara, deputado Sílvio Costa (PT do B), afirma que a base irá ao STF para contestar decisão de Renan Calheiros.

Economista Alfredo Menehuetti: “Nós não temos condições e fôlego para abarcar todos os gastos que o Brasil precisa”

A Hora – Instantaneamente à decisão de Maranhão, a bolsa caiu e o dólar subiu. Como o senhor avalia essa movimentação?
Alfredo Menehuetti – O mercado financeiro estava repercutindo de uma forma bastante favorável em termos de valorização dos seus ativos. Veja a bolsa de valores, o tesouro. Todos os ativos de renda fixa e renda variável do país. A decisão de Maranhão foi um retrocesso que repercutiu negativamente. A queda da bolsa e o aumento do dólar foram a primeira reação do mercado. Até porque o processo de anulação ainda sofrerá uma série de avaliações. Inclusive o Senado já afirmou que o desconsidera. Foi uma reação imediata que, ao longo dos dias, será filtrada politicamente, juridicamente e administrativamente. O mercado deverá acompanhar todas essas evoluções. Não é uma situação definitiva. E acho, inclusive, que a tendência é recuperar a valorização que o mercado financeiro vem tendo nas últimas semanas, pois um novo governo deve encaminhar as medidas importantes para a política fiscal.

Quais medidas, por exemplo?
Menehuetti – A política fiscal é desafiadora. Temos a visão do ministro da Fazenda, que mostra que o Brasil necessita de várias mudanças nas finanças públicas. Elas passam por um processo de avaliação de resultados. Por exemplo, ainda há uma ausência de acompanhamentos dos incentivos fiscais, sejam em âmbito federal, estadual ou municipal. Hoje, a política de incentivo fiscal praticamente funciona sem avaliação. São gastos que o governo faz, mas que seguem protegidos por sigilo. É necessário uma transparência maior. Também há uma série de políticas que necessitam de aporte para o desenvolvimento da infraestrutura. No Brasil, 16% do PIB é gasto com investimentos em logística, como estradas, ferrovias, energia elétrica, saneamento, portos ou aeroportos. Em países mais desenvolvidos, o índice chega a 60%. É necessário recuperar o volume da formação bruta de capital fixo, que seriam os investimentos públicos. Isso é uma medida que o mercado espera. Na minha opinião, o governo Dilma já mostrou que não tem esse olhar e, consequentemente, um novo governo deve fazer uma reversão dos gastos sociais em infraestrutura.

Isso não pode significar um retrocesso nas políticas sociais adotadas nos últimos anos?
Menehuetti – Sim. Até porque nós não temos condições e fôlego para abarcar todos os gastos que o Brasil precisa. Mas, certamente serão necessárias tomadas de decisões importantes. Por outro lado, toda aquela política fiscal de redução de impostos sem negociação com o segmento produtivo tem que acabar. Foi feita uma redução de vários impostos federais sem a devida negociação. A redução de alíquotas de impostos em alguns produtos da cesta básica, por exemplo, acabou não refletindo no preço final, fazendo com que todos perdessem. O consumidor perdeu, o governo perdeu, e o segmento produtivo reduziu seus custos, mas não houve aumento de consumo. Vejo também que o mercado vê com bons olhos o enxugamento dos ministérios. Por outro lado, creio que reformas como a tributária e a previdenciária não devem sair em breve. Devem ficar para mais tarde.

Notícia atualizada:

Anulação do impeachment é revogada

Acompanhe
nossas
redes sociais