Aprovada no primeiro turno no Senado, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 143 pretende liberar 20% da arrecadação de estados e municípios, hoje vinculadas a investimentos em saúde, previdência e assistência social, para serem em outras áreas. Entidades contrárias à proposta estimam uma redução de até R$ 80 bilhões por ano para a saúde.
O projeto, de autoria do senador catarinense Dalirio Beber (PSDB), foi protocolado em 2015 e já está apto para ir à votação em plenário. A principal justificativa apresentada no projeto é o percentual de Desvinculação de Receitas da União (DRU), também de 20%, que foi aprovada pela primeira vez em 1994 por cinco anos. Desde então, a desobrigação da União com as receitas vem sendo renovada pelo Congresso.
Na prática, a medida em tramitação no Senado representa para estados e municípios receita livre para ser utilizada em qualquer área e não mais onde a lei obriga. O diretor-executivo do Hospital Ouro Branco de Teutônia (HOB), André Lagemann, se mostra preocupado com o andamento da PEC-143.
“Qualquer medida que implique em diminuir recursos para a saúde tem de ser muito bem discutida e avaliada pela sociedade.” Para ele, se hoje não há recursos suficientes para custear o que se tem, então diminuir a verba pode resultar mais precarização do SUS.
Hoje os estados são obrigados a investir 12% da receita corrente líquida em saúde, enquanto os governos municipais devem destinar 15%, percentuais que não mudam com a PEC-143. Porém, Lagemann lembra que os R$ 500 mil que deveriam ser depositados nos cofres do HOB estão atrasados. “Se alguém acha que a saúde está bem, então liberem dinheiro para outras áreas. Mas acho que essa não é a visão da sociedade.”
Dos três entes da federação, apenas os municípios cumprem com o mínimo constitucional a ser investido. No Vale, Lagemann afirma que a média de investimento do poder municipal é de 20% na área.
Movimento para barrar projeto
Na tentativa de impedir o avanço da PEC 143, entidades ligadas à saúde tem se mobilizado no Senado e pressionado os parlamentares. Os senadores receberam uma carta assinada por cinco associações.
Os contrários à desvinculação afirmam que todos os entes da federação garantem investirem hoje R$ 250 bilhões na saúde. Caso a medida do senador tucano Beber seja aprovada, a estimativa é de os estados deixem de injetar R$ 19,9 bilhões na saúde.
O relator do processo é o senador de Roraima Romero Jucá (PMDB), que já deu parecer favorável. Porém, não há previsão para que a PEC seja votada. O projeto estava na ordem do dia dessa sexta-feira, 29, mas foi retirado.
Entidades pressionam pela reprovação da PEC
Apta para ser votada no plenário do Senado, a proposta de desvinculação de receita gerou a reação de entidades ligadas à saúde, que pressionam os senadores a não aprovarem a PEC. É o caso da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Abaixo a vice-presidente Eli Iola Gurgel Andrade critica a proposta.
A Hora – Como vocês veem a possibilidade de aprovação da PEC-143?
Eli Iola Gurgel Andrade – É mais um ataque ao financiamento do Sus, aliás nós estamos vivendo uma sucessão de medidas nesse sentido. Em 2015 nós sofremos um ataque quando a Emenda Complementar 86 definiu que o mínimo da união não é mais o valor do ano anterior corrigido pelo IB. Após a aprovação dessa emenda foi colocado que o gasto da União passaria a ser 13,2% da receita corrente líquida. Quando foi se apurar para fazer o orçamento de 2016, percebeu-se que a aplicação dessa lei reduziria a dotação federal em saúde e ela acabou não sendo aplicada.
Então ao não usar esse critério no orçamento o governo descumpriu a Constituição?
Eli – Exatamente. Está se formando um imbróglio legal, pois o governo resolveu não aplicar, mas essa lei está valendo. Agora há a proposição na Câmara da PEC 01 de 2016, que propões a mudança nas alíquotas, modificando a Emenda a Constituição 86. Isso já foi aprovado em primeiro turno de modo a aumentar a dotação orçamentária da União. E então vem o senado com a 143.
E o que a proposta do Senado modifica?
Eli – Ela afeta não só a saúde, mas também a previdência e assistência social. Desde 1994 o Congresso aprova por cinco anos a DRU. Então recai sobre o orçamento da seguridade social, que é constituído da contribuição sobre a folha do salário e do Cofins, esse orçamento era descontado em 20% para o tesouro utilizar em qualquer atividade. O problema principal que essa PEC trás. Hoje várias forças políticas pela quebra do conceito constitucional de vinculação de receitas a despesas sociais. Essa PEC relaxa a ideia de que tem de ter o investimento mínimo.
Quanto o SUS de saúde pode perder com a aprovação?
Eli – O investimento dos três entes hoje é em torno de R$ 250 bilhões, a nossa estimativa é que os 20% representam R$ 19, bilhões dos estados e R$ 30 bilhões dos municípios que deixariam de ser investidos, e mais R$ 26,6 bilhões do governo federal. Então nossa perspectiva é que a saúde perca em torno de R$ 80 bilhões da saúde.
Qual a estratégia para barrar o projeto?
Eli – Hoje (sexta) já tivemos a notícia que a PEC ia ser votada, mas foi retirada. Vamos lutar e seguir a campanha e pressão junto aos senadores para não aprovar o projeto.