O governo do Estado divulgou a lista das cem firmas que mais contribuem para formar a arrecadação municipal. Referentes a 2014, os números refletem o recolhimento de ICMS e IPI nas empresas.
De acordo com o secretário da Fazenda (Sefa), José Carlos Bullé, o índice representa o total agregado sobre o custo de uma mercadoria ou serviço. No caso de uma empresa que compra um sapato por R$ 100 e vende por R$ 150, o valor adicionado corresponde a R$ 50.
Na comparação com o ano de 2013, houve pouca alteração entre as dez maiores contribuintes. As cinco empresas que lideram o ranking fazem parte do setor de alimentação. O destaque fica para a Fruki bebidas, que subiu duas posições na lista.
Empresas de ramos distintos estão entre as que mais cresceram no período. Em primeiro lugar, está a Retromac, que subiu 34 posições na lista. Em seguida, aparecem Color Tintas, Lojas Becker e Comércio de Medicamentos Brair. O Jornal A Hora avançou 18 posições, 7º melhor desempenho no quesito.
Ao todo, 16 empresas ranqueadas em 2013 deixaram a lista. Entre as que não apareciam no ano anterior, destaque para a Mondial Veículos, que alcançou a 27ª posição em 2014. Para a economista e presidente do Conselho de Desenvolvimento do Vale do Taquari (Codevat), Cíntia Agostini, o ranking mostra uma certa estabilidade na economia do município.
Lembra que 2014 foi o primeiro ano em que o país enfrentou sinais de crise econômica. “As empresas que cresceram na época demonstram capacidade de avançar”, aponta. A liderança de empresas do setor alimentício reforça as características regionais, de uma cadeia voltada para a produção de alimentos, mas não dependente de um único tipo de produto.
“Com essa diversificação, se um setor não for tão bem, outro consegue compensar. Por isso demoramos mais para sofrer os efeitos da crise”, avalia. Segundo ela, a produção de alimentos é menos afetada pela redução do consumo.
Tendência de queda
Para os próximos dois anos, Cíntia prevê redução na arrecadação motivada pela retração na economia. “A tendência é de queda generalizada”, relata. Após um 2015 com queda de 3,8% no PIB brasileiro, a previsão para 2016 é de desempenho semelhante.
“A retração no acumulado chegará perto dos 8%”, ressalta. O resultado reflete na empregabilidade, com frequentes reduções no número de vagas. Conforme a economista, apesar de o RS ter registrado saldo positivo de empregos em fevereiro, os números refletem setores específicos, como o calçadista, favorecido pela alta do dólar, e a indústria do tabaco, cuja safra iniciou recentemente.
“Entre janeiro e fevereiro de 2016, a produção industrial caiu 11% no RS, o que deve comprometer os próximos resultados”, assinala. Segundo ela, a recuperação do crescimento gaúcho demandará de grande esforço de todos os setores.
Carga tributária
Cíntia ainda ressalta o mercado informal, que representa 40% da mão de obra economicamente ativa. “São atividades que não recolhem impostos por não estarem formalmente constituídas, representando um rombo na arrecadação.”
Para ela, parte da sonegação é fruto da ideia de que temos uma alta carga tributária que não resulta em benefício da sociedade. Por outro lado, questiona se as empresas sonegam porque os impostos são altos, ou se os tributos são elevados devido à sonegação.
Na avaliação de Cíntia, a discussão só será superada a partir de uma ampla reforma tributária, que resulte maior recolhimento com base na renda ao invés do consumo. “Quando compra um produto, um executivo com altos salários paga a mesma quantia de ICMS que um operário.”
Cita como exemplo as duas principais propostas discutidas: a volta da CPMF e a alíquota de Imposto de Renda progressivo sobre ganhos de capital. Segundo ela, em ambas o imposto é proporcional à capacidade financeira do contribuinte.
“São mais justos, mas sofrem grande rejeição porque não vão substituir outros tributos, e sim acrescentar novas alíquotas”, aponta. De acordo com a economista, tanto o Estado quanto a União aumentam os impostos para cobrir rombos orçamentários.
“Temos que controlar os gastos para fechar as contas no fim do ano”
Hora – Os valores divulgados pelo Estado são referentes à 2014, antes das principais consequências da crise econômica. O que esperar dos próximos anos?
José Carlos Bullé – Tem um aspecto importante que faz Lajeado ser diferente das outras cidade. Nossa economia é muito diversificada. Isso acaba equilibrando um pouco as coisas em tempos de crise. Quando o comércio não vai bem, a indústria compensa. Em algumas cidades, o impacto é maior pela dependência de algum setor. Mesmo assim, sentimos os impactos da crise.
De que forma a instabilidade econômica deve impactar na arrecadação municipal e qual o posicionamento dos gestores diante dessa situação?
Bullé – Todos devem manter a cautela. Temos feito reuniões no conselho de secretários do Estado e o consenso é de controlar gastos. Por isso, tivemos esse recente embate na questão do reajuste dos servidores. Nós gostaríamos de dar um aumento maior, mas não temos capacidade financeira. Hoje, o público tem uma lógica de funcionamento onde temos um orçamento que é na verdade um planejamento. Nada garante que vamos arrecadar esse valor. Temos que controlar os gastos para fechar as contas no fim do ano.
Quais os setores mais afetados pela crise em Lajeado?
Bullé – Tínhamos uma situação bastante privilegiada no setor de construções. Em média, 2,5 mil imóveis eram construídos por ano na cidade, índice que nenhuma cidade do país alcança. Porém, esse número já reduziu e a tendência é parar tudo. Mas a economia como um todo sofre e a tendência é continuar sofrendo. Com a alta da inflação e o aumento do desemprego, a máquina não gira. Comércio deixa de vender, os serviços deixam de ser demandados, investidores não investem porque o risco fica mais alto. Quem mais sofre com isso é a população de baixa renda, porque depende do trabalho para sobreviver.
O município teve aumento no número de empresas registradas, principalmente na modalidade de Micro Empresa Individual (MEI). Como essa modalidade contribui para a arrecadação?
Bullé – Embora o objetivo seja louvável, de gerar emprego, renda e tirar pessoas da informalidade, o município acaba arrecadando menos. O que observamos é um movimento contrário. Empresas que já estavam consolidadas estão migrando para o MEI. Se não houver uma medida quanto a isso, haverá um colapso tributário. O MEI não é obrigado a omitir nota, então, como vamos fiscalizar a sonegação? Ficamos sem ferramentas para isso. Não sou contra o MEI, o problema é que no Brasil tudo se dá um jeitinho.
Como a sonegação impacta nos cofres públicos e quais as medidas para evitar esse problema?
Bullé – Quando assumimos o governo, identificamos falta estrutura para fiscalizar. A falta de investigações é um incentivo à ilegalidade. Nossa primeira providência foi contratar quatro novos fiscais. Mesmo assim, não foi suficiente para atender a demanda represada. Depois disso, iniciamos uma série de ações. Para se ter uma ideia, em 2012 arrecadamos em torno de R$ 250 mil por meio de auditorias. Em 2013, o número passou para R$ 350 mil e, no ano seguinte, R$ 3,7 milhões. Em 2015, foram R$ 5 milhões.
Em quais setores a arrecadação municipal pode evoluir?
Bullé – Principalmente nos serviços, onde o que se arrecada não equivale ao potencial de Lajeado. Existem muitos problemas, alguns por esquecimento, mas também casos de sonegação mesmo. No momento que você consulta com um médico e ele não dá nota, existe chance de sonegação. Isso acontece em vários segmentos. Todo contribuinte que contrata um serviço e deixa de exigir nota, ajuda os sonegadores.