A Superintendência de Negócios de Governo da Caixa Econômica Federal (CEF) suspendeu, no dia 15 de janeiro, os repasses destinados às obras de pavimentação pelo PAC.
Decisão amparada pela divergência demonstrada em um laudo realizado pela engenheira civil do MPF, Elza Conrado Jacintho. No documento, finalizado em 14 de dezembro, aponta superfaturamento de, pelo menos, R$ 2,4 milhões.
No dia 27 de janeiro, a administração foi notificada pelo MPF para que, em um prazo de até dez dias úteis, se manifestasse a respeito das incongruências verificadas no laudo pericial. O prefeito ainda não se manifestou. No entanto, já encaminhou defesa junto à CEF. Extraoficialmente, o Executivo informa ter recebido, em 29 de janeiro, a confirmação de que os repasses serão normalizados em breve.
Hoje, as obras estão paradas. Conforme o laudo da engenheira civil, foram verificados 28 itens com sobrepreços na planilha de custos do contrato firmado entre município e o consórcio Construtora Giovanella – Coesul. A análise verificou os itens mais caros, de maneira decrescente, até atingir 80% do total do orçamento. A técnica de avaliação é conhecida como “diagrama de pareto”.
Todos os valores foram comparados com a tabela do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi), divulgada todo mês no site da CEF. Entre os 28 itens verificados, estão o concreto betuminoso usinado, a execução de base de brita, a calçada de concreto, o meio-fio, o transporte de brita, a escavação mecanizada, reaterro de valas, assentamento de tubulação, pintura de ligação e compactação de aterro.
O relatório da engenheira civil avaliou R$ 16,3 milhões – ou 80% – do total de R$ 18,5 milhões de repasses da União previsto para a obra. Para o MPF, esse montante poderia ser reduzido a R$ 13,9 milhões. A análise coordenada pelo procurador da República e responsável pelo MPF em Lajeado, Cláudio Terre do Amaral, não levou em conta os quase R$ 2 milhões de contrapartida do município.
Hoje, cerca de 32% do total de R$ 20,5 milhões previstos para a conclusão das obras em 14 vias municipais já foi repassado ao consórcio. Além dos valores, o MPF questiona a forma de fiscalização dos serviços. Pelo edital, o pagamento deveria ocorrer por item unitário. No entanto, a administração municipal estaria insistindo em pagar por preço global.
O laudo pericial do MPF também vai investigar se há, no projeto executivo, qualquer indício de direcionamento da contratação para o consórcio vencedor do processo licitatório. Desde a assinatura do convênio entre município e CEF, ainda em 2013, a licitação para os serviços foi suspensa por três vezes antes da homologação.
Demais apontamentos
O relatório do MPF aponta uma série de outros problemas nas obras. Além do suposto sobrepreço, a perícia verificou diversos serviços que não estavam sendo realizados em conformidade com o contrato. Entre eles, ausência de equipe de topografia para quantificação de volumes de terra, “de modo que não tem sido realizada qualquer medição dos volumes de terraplenagem.”
Também consta no documento que as soluções previstas no contrato “têm sofrido alterações sem formalização dessas por meio de aditamentos ao contrato.” Ainda, não estaria sendo exigido do consórcio “ a execução de controle tecnológico para liberação de serviços executados, em especial, a verificação da densidade dos aterros.”
A engenheira civil cita algumas possíveis omissões verificadas no projeto executivo. Entre elas, ausência de previsão de quais tipos de solo e rochas seriam encontrados nas escavações das valas para as redes de drenagens, e “com quais materiais deveriam ser realizados os reaterros dessas valas.” O MPF verificou ainda trechos de obras sem sinalização, e funcionários sem EPIs.
Superfaturamento
O ex-secretário de Obras, Adi Cerutti, foi o responsável pelas denúncias encaminhadas ao MPF em setembro. Segundo ele, na época, a empresa contratada estaria cobrando mais de R$ 1 milhão em serviços não realizados. “Entre eles, implosões de rochas, onde nenhum tiro foi dado.”
Cerutti questionava o conteúdo de cinco notas fiscais apresentadas pela empresa. Uma reunião foi realizada no gabinete do prefeito, onde fiscal da prefeitura e empresário quase teriam brigado. Após, em novo encontro realizado na sede da CEF, em Novo Hamburgo, três engenheiros da Caixa teriam pedido para ele pagar, independente dos questionamentos.
O ex-secretário então se negou a assinar tais empenhos. “O prefeito assinou por conta”, sustenta. Ainda de acordo com Cerutti, a administração, a pedido dos empresários, teria retirado o fiscal indicado por ele das obras.
“Há equívoco no enquadramento da tabela Sinapi”
De acordo com o assessor jurídico, Juliano Heisler, há um equívoco no enquadramento feito pela perita em alguns itens da tabela do Sinapi. Segundo ele, o valor contratado está 8,81% acima dos valores previstos no sistema nacional. “Mas a técnica considerou, em seu laudo, as regras de repasse da União. E elas não se aplicam a financiamentos do FGTS, que é o caso, que aceita diferença de até 10%.”
Conforme o advogado, as questões relativas à fiscalização serão ajustadas pelo município, como os questionamentos sobre a topografia das obras, e a notificação sobre EPIs. “Além disso, a administração reconhece a execução por empreitada individual, e não global.”
A reportagem tentou contato com o secretário de Governo, Auri Heisser. De férias, ele deve retornar ainda nesta semana. A reportagem tentou contato com o responsável pelo consórcio, Nilson Giovanella, mas não obteve resposta até o fim desta edição.
2011
O então secretário de Obras (Sosur), Mozart Lopes, encaminhou proposta para habilitar o município a receber R$ 15 milhões do governo federal, dentro do PAC 2, para pavimentação de vias de acesso aos bairros de Lajeado. Na época, o município havia custeado todo o projeto técnico necessário para realização das obras.
2013
Quase dois anos se passaram quando, em março de 2013, o governo federal confirmou Lajeado como uma das contempladas pelo PAC 2. Em 21 de agosto daquele ano, a câmara de vereadores aprovou lei autorizando o convênio para financiamento com a CEF. Na época, a contrapartida do município estava orçada em R$ 980 mil.
2014
Em janeiro, Executivo e CEF receberem autorização do Tesouro Nacional para a realização da operação de crédito. A previsão era lançar o edital de licitação em maio daquele ano.
2015
No dia 20 de fevereiro, a licitação para contratar a empresa responsável pelas obras foi suspensa pela segunda vez em menos de quatro meses. Mais de 15 empresas estavam previamente habilitadas. Na ocasião, as razões do Executivo foram diferentes das justificativas apresentadas em novembro. O deferimento parcial atendeu três pedidos de impugnação, solicitando reequilíbrio das planilhas orçamentárias e readequação do cronograma de execução dos serviços. Antes, a razão teria sido a implantação do turno único.
Em 30 de abril, após a terceira licitação, o edital foi homologado, e o Executivo assinou contrato com o consórcio formado pelas empresas Construtora Giovanella e Coesul. O valor ficou 8% acima do preço referência do edital. Apenas o consórcio participou do processo licitatório.
No dia 17 de setembro, em matéria publicada pelo jornal A Hora, o então secretário de Obras, Adi Cerutti, reclamou de cobranças indevidas por parte do consórcio. Segundo ele, notas fiscais estariam superfaturadas. Antes disso, ele havia avisado o prefeito, que teria insistido para que os pagamentos fossem efetuados. Duas semanas depois, o MPF abriu inquérito para investigar as denúncias.