Vale do Taquari – A greve do servidores do Estado atinge o policiamento ostensivo. Pela primeira vez na história, policiais militares (PMs) ficam aquartelados em diversos municípios gaúchos, entre eles, Lajeado.
De acordo com o comandante do CRPO, coronel Humberto Teixeira Santos, os PMs se apresentaram ao trabalho, mas foram impedidos de sair do quartel por familiares e servidores das demais categorias. “Os manifestantes se posicionaram em frente às viaturas. Dialogamos para evitar atritos.”
Segundo Teixeira, o comando da corporação entrou em acordo com os grevistas para garantir o atendimento de casos de emergência. O coronel afirma que viaturas de Arroio do Meio, Estrela e Cruzeiro do Sul auxiliam no policiamento da cidade.
O comandante diz entender o movimento dos servidores do Estado, mas discorda quanto à adesão de PMs e bombeiros. “É legítimo, mas somos militares, portanto, impedidos legalmente de fazer greve ou aderir a sindicatos.”
Para Teixeira, os trabalhadores da corporação devem cumprir a legislação, uma vez que a sociedade precisa do serviço e confia na BM. “Vale lembrar que estamos todos na mesma situação. Também recebemos apenas R$ 600.”
O protesto em frente ao 22º Batalhão de Polícia Militar começou por volta das 5h20min. A rua Júlio May foi bloqueada na quadra do quartel, entre a av. Benjamin Constant e rua Júlio de Castilhos. Integram o movimento servidores da Polícia Civil, Susepe, bombeiros, professores, estudantes e familiares dos PMs.
Um policial militar que representa o movimento afirma que a manifestação não é apenas pelo parcelamento dos salários. “Queremos chamar atenção pela falta de respeito que atinge os serviços essenciais. Os trabalhadores da saúde, educação e segurança são os principais atingidos.”
Ontem de manhã, as entidades que representam os trabalhadores da BM enviaram nota conjunta de repúdio às decisões do governo. O texto orienta policiais que não tiverem condições de trabalhar, por não ter dinheiro para alimentação ou pagar contas essenciais, a procurar ajuda médica.
“A população do Rio Grande do Sul, que vê a criminalidade se alastrar diariamente, que se proteja como puder face ausência de policiamento nas ruas”, sentencia a nota.
Escolas fechadas
Professores e alunos das escolas Manuel Bandeira, São João Bosco, Fernandes Vieira, Érico Veríssimo, Castelo Branco e Carlos Fett Filho fizeram ato de protesto ao parcelamento.
O grupo se deslocou para a esquina da av. Alberto Pasqualini com a rua Dom Pedro II com bandeiras, apitos e cartazes pedindo esmola. Após, foram até a sede do 22º BPM para integrar a manifestação unificada.
De acordo com o coordenador do 8º Núcleo do Cpers, Oseias Souza de Freitas, ao menos 40% das escolas do Vale do Taquari aderiram à paralisação e ficarão fechadas até amanhã. Segundo ele, além do pagamento parcelado dos salários, os trabalhadores também repudiam as propostas de aumento no ICMS e de congelamento de gastos propostos pela PL 206.
Professores e servidores das demais categorias se reuniram às 14h de ontem no auditório do colégio Castelo Branco para debater as consequências das propostas. Conforme Freitas, a PL 206 é danosa ao funcionalismo, pois prevê a suspensão de concursos e nomeações, além de congelar salários.
Deputado chama servidores de “vadios”
Um dos assuntos debatidos no encontro foi a declaração do líder do PMDB na Assembleia Legislativa, deputado Álvaro Boessio. Em entrevista a uma rádio de Farroupilha, o parlamentar disse ser contra os concursos públicos e chamou parte dos servidores de “vadios.”
Ele ainda criticou os professores por ganharem licença-prêmio de três meses a cada cinco anos de magistério, e disse que existem mais educadores do que o necessário no estado. Ainda considerou desnecessária qualquer redução nos vencimentos dos parlamentares.
Conforme o coordenador do Cpers, a declaração de Boessio ampliou a revolta das categorias e foi um dos motivos para que o movimento tomasse tamanha abrangência. Policiais militares acreditam que a fala do parlamentar motivou o aquartelamento nos municípios do interior.
“Trabalhadores que não sinalizavam adesão às manifestações se indignaram ainda mais”, avalia um PM com 29 anos de corporação. Segundo ele, o único movimento grevista na história da BM ocorreu em 1996, mas não chegou a atingir os quartéis do interior.
O Cpers emitiu nota de repúdio endereçada ao líder do PMDB. Para o sindicato, é inadmissível que, além de receberem míseros R$ 600, os servidores gaúchos têm que passar pelo que a entidade classifica como humilhação.
“O direito constitucional a receber o salário no fim do mês já não está sendo respeitado pelo governo. Não vamos admitir mais essa afronta”, diz o texto. Pelo Facebook, Boessio se desculpou das declarações, dizendo que usou um termo “infeliz.”
“Estamos cobrando por nossa subsistência”
O posicionamento do deputado causou mais desconforto uma vez que os parcelamentos e cortes no Estado atingem exclusivamente o Executivo. Servidores do Judiciário e do Legislativo continuam recebendo salários e demais benefícios em dia.
O professor Gilson dos Anjos classifica a decisão de manter o pagamento integral da Assembleia como inconstitucional. “Para o governador, não pagar eles é inconstitucional, mas deixar de pagar o nosso dinheiro, não.”
Ele reprova a falta de um posicionamento do governo após as demonstrações de insatisfação do funcionalismo. “Só estamos cobrando por nossa subsistência, pois não conseguimos investir em nada com o que ganhamos.”
A representante da Polícia Civil, Magda Lopes, também criticou a falta de participação do Legislativo e do Judiciário na busca de uma solução da crise vivida pelo Estado. Segundo ela, as mobilizações são a única forma encontrada pelos servidores públicos de cobrar melhores condições de manter os serviços.
Crise nas finanças
R$ 5,4 bilhões é o rombo alegado nas contas públicas.
O valor é o equivalente a três meses do pagamento do funcionalismo.
Segundo o governo, cada gaúcho nasce com uma dívida de R$ 6,8 mil