Lajeado – O processo licitatório para concessão dos serviços de transporte público poderá ser decidido na Justiça. O edital elaborado pelo Executivo, com auxílio de uma consultoria técnica, desrespeita lei municipal aprovada em 2012 e mantida em vigor por unanimidade na câmara de vereadores durante sessão extraordinária nessa sexta-feira. Agora, setor jurídico do governo busca anular a norma no Judiciário.
A discussão gira em torno da modalidade da concorrência. Pelo edital, cujas propostas serão recebidas no dia 28, vencerá a empresa ou consórcio que apresentar o menor preço da tarifa. No entanto, a lei prevê que “o edital de licitação obedecerá ao tipo maior oferta e melhor técnica, com tarifa fixada no edital, balizada a oferta mínima pelo valor das indenizações.”
Há dois anos, o Executivo encaminhou projeto para tentar anular a regra. Não houve acordo para a votação. Em março deste ano, nova proposta foi protocolada na câmara, mas o texto só foi ao plenário nessa sexta-feira, a pedido do prefeito. A intenção era regularizar a situação para deixar de acordo com o edital.
Segundo o assessor jurídico, Juliano Heisler, manter a modalidade de “melhor técnica” poderá causar judicializações da concorrência. “Deixará muitas margens para protestos devido à superficialidade. É difícil definir o que é a melhor técnica”, justifica. A medida é uma sugestão da Dirigida Consultoria, contratada para produzir o edital.
Heisler demonstra preocupação com a possibilidade de suspensão do edital. Para tentar evitar a decisão, que protelaria ainda mais a regularização dos serviços exigida pelo Ministério Público (MP), o Executivo pretende protocolar, já nesta segunda-feira, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) junto ao Judiciário. “Tentamos via câmara, agora será via judicial.”
Segundo o assessor, a lei municipal estaria sobrepondo-se à lei federal de licitações. “A legislação do município não pode condicionar um processo licitatório. Isso é inconstitucional”, alerta.
A Adin será feita, diz, para pedir uma liminar que suspenda os efeitos da norma, para depois seguir com o edital.
Caso a Adin seja indeferida pela Justiça, a administração municipal deverá suspender o edital, pois as propostas serão balizadas pelo documento licitatório. “A empresa de consultoria trouxe exemplos de Porto Alegre, onde a cobrança pela melhor técnica causou confusão. Tentar mudar a lei causará menos impacto do que uma possível judicialização por superficialidade do objeto”, sustenta.
Derrota na câmara
A derrubada do projeto de lei encaminhada pelo Executivo à câmara causou surpresa.
A sessão extraordinária foi solicitada pelo prefeito, especialmente para votar a proposta de anulação da norma efetivada em 2012.
No entanto, nenhum vereador da base governista apoiou a administração municipal.
O projeto foi reprovado por unanimidade. Antes disso, Ildo Salvi (PT) pediu vistas – indeferida pois se tratava de sessão extraordinária – e Ernani Teixeira (PDT), o líder de governo no Legislativo, tentou retirar a proposta da pauta.
O pedido foi negado e a sessão ficou dez minutos suspensa para esclarecimentos. “Não faz sentido cobrar menor preço apenas. Daqui a um ano a empresa pedirá reequilíbrio financeiro e aumentará o valor. E a qualidade do sistema, como fica?”, questiona.
Círio Schneider (PP) insinua que o governo, com a medida, quer trazer outra empresa para Lajeado. “Isso é uma vergonha.” Lorival Silveira (PP) disse não entender a convocação da extraordinária de “supetão”. “Se fosse uma coisa urgente eu até ia entender, mas um projeto que eu votei contra em 2012?”, questiona.
O vereador Sérgio Kniphoff (PT) diz que o Executivo tem direito de chamar reunião extraordinária e que o processo licitatório do transporte público é uma exigência do Tribunal de Contas do Estado (TCE).
Ele também rebateu insinuações de que empresas de fora seriam beneficiadas na licitação. “Dizer isso é uma irresponsabilidade.”
“Indenização é ilegal”
Salvi critica também o item 14 do edital, que prevê pagamento de indenização pelo consórcio vencedor aos atuais operadores quanto aos bens amortizados, pessoal operacional, administrativo e de manutenção. Segundo o documento, esse valor será divulgado pela administração municipal em um prazo de até 360 dias após assinatura do novo contrato.
“Dessa forma a empresa que hoje mantém o contrato larga em vantagem na licitação. Pois se vencer não terá custo algum a quitar. Ao contrário de todas as demais”, observa o petista. “É como pagarmos por todos os canos da Corsan após findar o contrato com a estatal”, exemplifica.
Segundo Heisler, a medida não trará prejuízos aos participantes. “O valor será facilmente diluído durante o contrato. Tudo esse custo já está previsto no estudo e as empresas foram informadas.” A indenização se refere a custos de perdas tarifárias, bens reversíveis, desmobilização das atuais operadoras, incluindo rescisórias trabalhistas, depósitos e multa de FGTS, entre outras.