MP denuncia fraude em concurso público

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MP denuncia fraude em concurso público

Exames teriam sido direcionados para nomear cabos eleitorais do prefeito e vice. Envolvidos negam as acusações do MP

Boqueirão do Leão – O Ministério Público de Venâncio Aires (MP) pede ao Judiciário a anulação do concurso público realizado em fevereiro de 2014. A solicitação decorre de uma ação civil pública acompanhada de um inquérito civil, no qual foram apontadas irregularidades tanto na contratação da empresa responsável quanto na realização dos exames.

04A Promotoria pede ainda a condenação de seis réus por atos de improbidade administrativa, entre eles o prefeito Luiz Augusto Schmidt e o vice Ademir Dalbosco, os sócios da empresa Projetos.Com., além de um dos servidores aprovados em concurso que, supostamente, foi beneficiado conscientemente das irregularidades.

As investigações começaram ainda em março de 2014, após denúncia de supostas fraudes no concurso para: motorista, operário especializado, operário, operador de máquinas, magistério e médico. Os primeiros problemas percebidos pelo promotor Pedro Rui da Fontoura Porto foram na contratação da empresa Projetos.Com Assessoria e Serviços Ltda., cuja principal atividade é consultoria em gestão empresarial e “não possui experiência na área de concursos” nem tem entre os objetivos sociais a realização deste tipo de trabalho “altamente especializado”.

A contratação ocorreu por meio de dispensa de licitação por R$ 7 mil. Mas Porto considera ilegal a prática, já que a justificativa foi informal, sem que fosse caracterizada situação de emergência para a realização do concurso. “A decisão sobre o concurso, contratação e abertura do edital, ainda em janeiro, revelam a deliberação de direcionar a contratação para a Projetos.Com. Não se oportunizou sequer possibilidade de concorrência ou de participação de outros interessados.”

Além disso, no que tange a questões contratuais, a empresa também teria descumprido requisitos previstos no contrato com a administração municipal. Segundo a investigação, a Projetos.Com deveria “contratar todo o pessoal necessário para a aplicação, fiscalização e apuração dos resultados das provas dos concursos”. Mas na realidade, apenas três pessoas trabalharam pela empresa, enquanto que a maioria dos fiscais foi composta por Cargos de Confiança (CCs) nomeados pelo prefeito.

O município também descumpriu com o contratado. Deveria fiscalizar os serviços por meio da Secretaria da Administração e Planejamento. Para isso, três servidores foram escalados. Contudo parte da comissão foi substituída pelos CCs, que conforme o promotor, acompanharam apenas parte do certame. “O afastamento de servidores de carreira do acompanhamento e sua substituição por CCs é indício de que se buscava manipular os resultados.”

O concurso não foi divulgado na internet e existiam cargos de nível superior como o de médico, que só teve um candidato (que já prestava serviços ao município), enfermeiro ou professor, pessoas que, para o promotor, melhor remuneradas podem se deslocar para cidades menores a fim de iniciar uma carreira. O promotor pede a revogação de todas as nomeações.

Exames direcionados e gabarito corrigido

Para Porto, o concurso foi planejado e executado para beneficiar candidatos previamente indicados, a maioria cabos eleitorais da coligação à frente do governo municipal. Entre eles Silvano Rois Cunha, principal idealizador da campanha de Schmidt, que prestou concurso para motorista.

O concurso se dividia em duas provas: escrita com peso de 30%, e prática, 70%. Cunha foi o primeiro a concluir o primeiro exame (em cerca de 10 minutos e preenchendo apenas o gabarito), podendo em seguida realizar a segunda parte. “É significativo e indicia a ocorrência de fraude a circunstância de que Silvano supostamente marcou sua grade sem que tivesse feito qualquer anotação no texto da prova, contrariando toda a expectativa lógica”, observa Porto.

Conforme o inquérito entregue ao Judiciário em anexo à ação civil pública tal fato permite concluir que a grade de respostas da prova de Cunha foi substituída por Marcius Corbellini para elevar a nota na avaliação escrita que representava alto grau de dificuldade.

“Se a grade foi substituída, ainda mais fácil foi direcionar a avaliação prática realizada diretamente pelo demandado Maico Juarez Berghann, o qual, mesmo sem notícia de qualquer experiência como orientador de autoescola ou similar, foi o avaliador da prova de motorista.”

De acordo com Porto, o candidato seguiu logo após a prova escrita para o parque de máquinas onde estava Berghann, um dos sócios-proprietários da Projetos.Com. “Para que este realizasse sua prova, de preferência sem a atenção de outros candidatos, o que de fato ocorreu. Neste caso, sem assistência, não é de se admirar que Silvano, superando outros candidatos com larga experiência na condução de caminhões foi o único a tirar nota máxima nesta prova.”

Cunha não teria cobrado nada pelos serviços durante a campanha eleitoral, conforme apontam as investigações. “Ficou em primeiro lugar no concurso para motorista, deste modo, recompensando por seus esforços durante o pleito eleitoral”, afirma Porto.

“O examinador deixou de descontar pontos”

Outra irregularidade apontada no inquérito, também no concurso para motorista, o examinador deixou de descontar pontos na prova prática de Dionatan da Rosa. Conforme Porto, Dionatan admitiu em depoimento haver efetuado acentuada curva à direita, invadindo a pista oposta, passando à esquerda de um poste no meio da rua.

Na mesma curva, o avaliador descontou pontos de outros concorrentes pelo fato de invadirem parcialmente a pista oposta com a frente do caminhão ou dar marcha à ré para evitar esta invasão, “o que se tornava imprescindível tendo em conta o ângulo da inflexão, as dimensões do cargueiro e a existência de um canteiro com poste no meio da avenida”.

O candidato, segundo seu próprio depoimento, mantinha convivência com o prefeito e vice, pois fora contratado durante algum tempo como estagiário do município e seu pai fizera campanha em favor de Schmidt.

“Não houve direcionamento”

O prefeito Schmidt nega qualquer interferência no resultado do concurso e garante estar de “consciência limpa”. “Como funcionário público, e as pessoas sabem da minha índole, eu não iria interferir em nada em respeito às pessoas que prestaram o concurso. Não acho isso correto. Não estaria arriscando meu cargo.”

Cita que no fim do ano passado, o promotor Porto sugeriu a anulação do concurso ao apontar diversos fatores. “Em detrimento àquelas pessoas que passaram, eu optei por não anular. Aí que reafirmo minha posição.”

Quanto a conhecidos que foram nomeados, o prefeito aponta que em cidades pequenas sempre haverá no poder público pessoas favoráveis ao partido e outras contra. “Passaram algumas em meu favor, sim, mas também passaram contra.” Como exemplo, cita a primeira colocada na disputa pelo magistério: era secretária de Educação do governo anterior e mulher de um candidato à majoritária no último pleito. “Com isso afirmo que da minha parte não foram beneficiados. Tanto que a minha irmã fez para o magistério e ficou em 14º lugar.”

Sócio-proprietário da Projetos.Com, Berghann desconhece o teor da denúncia. Confirma ter sido examinador, mas rechaça qualquer indício de irregularidade. “Fizemos tudo dentro da legalidade. São indícios apenas.” No que tange ao suposto favorecimento no exame prático de motorista, cita que sequer se recorda de quem foram os candidatos. “Foram mais de 40 pessoas e segui a planilha (de pontuação). Ele (o promotor) joga no ar, acho até que precipitado, tem que provar também.”

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