Parentes matam homem na frente da filha

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Parentes matam homem na frente da filha

Trio suspeito de assassinar Adão Dornelles na segunda-feira à noite segue foragido

oktober-2024

Lajeado – O jardineiro desempregado Adão Dornelles, 57, estava sentado na sala da casa da companheira quando três pessoas invadiram o local: um homem, (irmão), uma mulher, (irmã), e o marido dela. Nas mãos, carregavam um porrete, um revólver e uma faca de açougueiro.

03Ao avistar Dornelles, iniciaram as agressões. Na casa simples, na rua Bom Jesus, bairro Santo Antônio, estavam mais três pessoas, além da mulher, o enteado, 18, e a filha caçula, de 10 anos.

Eles viram toda a cena. Dois golpes na cabeça deixaram Dornelles tonto. Um disparo foi efetuado, atingindo a parede. Talvez com o propósito de assustar as testemunhas para sair do recinto. Um dos autores desferiu facadas no jardineiro, que morreu nos braços do enteado. Em seguida, chegou outro menor. Também enteado de 16 anos. Ele estava jogando bola com os amigos.

A mulher da vítima pediu para que não fizessem nada na frente da filha. Ainda tentou proteger Dornelles, mas foi empurrada para longe. Enquanto agrediam o homem, os assassinos gritavam: “o que tu fez para as meninas?”

Conforme o delegado Silvio Huppes, uma das hipóteses da investigação aborda como motivo desentendimentos familiares. Dornelles era alcoólatra. Segundo um ex-colega de trabalho, ficava agressivo e tinha comportamentos desadequados quando estava sobre efeito da bebida.

A Brigada Militar e a Polícia Civil fizeram buscas nas casas dos possíveis autores. Ninguém foi encontrado. O trio segue foragido.

Caso se confirme a suspeita da polícia sobre a morte do casal Dullius, ocorrido na terça-feira passada no bairro Moinhos D’Água, esse seria o segundo crime com participação de familiares em seis dias.

“Ele parecia preocupado”

Dornelles não morava na casa da rua Bom Jesus. Estava há três dias na residência, enquanto construía em um terreno de parentes no bairro Santo Antônio. Havia negociado a compra de materiais de construção com o ex-chefe, proprietário de uma floricultura.

Na segunda-feira de manhã, a companheira, que trabalha como faxineira, havia voltado próximo das 11h para casa. Preparou o almoço, arroz, salsichão com salada de repolho, e em seguida voltou para o trabalho.

Antes de sair, estranhou o comportamento de Dornelles. Ele não costumava ficar na casa. “Estava quieto. Ele parecia preocupado.” O enteado mais novo também percebeu a mudança. Tentou conversar com o padrasto, mas ele não disse o que lhe incomodava.

Ano mais violento desde 2004

O jardineiro foi a 20ª vítima de assassinato neste ano em Lajeado. Na terça-feira passada, o casal João e Isolde Müller Dullius foi morto dentro de casa. A suspeita recaí sobre o genro e a filha dos aposentados.

Comparando com outros anos, conforme estatística da Secretaria de Segurança Pública do Estado, este primeiro semestre de 2014 é o mais violento da última década, passando todo o ano de 2004, quanto 19 pessoas foram assassinadas em Lajeado.

“Estamos valendo muito pouco hoje”

Agressividade, choro compulsivo, isolamento estão entre os possíveis sintomas de uma criança que passou por uma situação traumática ocasionada pela violência. A psicóloga Graziela Ely analisa o impacto no desenvolvimento infantil.

A Hora: Quais os tipos de trauma que uma criança leva para vida ao ver uma cena de tamanha violência?

Graziela Ely: Todos os possíveis. Primeiro por essa violência partir da família, justamente o porto- -seguro das crianças, seja um tio, primo. É o primeiro grupo ao qual pertencemos na vida. Uma criança não espera algo assim. Uma violência cometida por pessoas conhecidas.

Em um segundo lugar ver o pai morrendo. O sentimento de impotência da menina, que não poderia fazer nada para salvá-lo. Depois, ver o sangue, o corpo dentro de casa. Esse é um choque que de repente pode levar dias para se manifestar.

Se trata de um trauma emocional muito forte, ainda mais para uma criança. Até se espera algum desentendimento, briga, isso é normal dentro de todas as famílias. Mas chegar à brutalidade, ninguém espera.

Como fica o comportamento de uma criança de 10 anos ao vivenciar fatos como o dessa segunda-feira à noite? Como isso interfere na escola, na relação com amigos, com a família, irmãos, mãe?

Graziela: Neste momento, qualquer comportamento fora do normal é esperado. Se ela era calma, pode ficar agressiva, se não chorava, pode ficar mais sensível. Mostrar coisas que não fazia até então. Inesperado seria se ela agisse com indiferença. Agora, como vai evoluir isso, tudo depende do acompanhamento. Ela terá de passar por alguma assistência, primeiro com um psicólogo, uma assistente social, para ajudá-la a superar. Se for grave, também encaminhamento ao psiquiatra, para tomar alguma medicação. O problema disso é que os remédios reduzem os sintomas, mas não apagam o sentimento.

Como isso interfere na formação do caráter dela?

Graziela: Não tem como a gente dizer se vai ou não se recuperar. O ser humano se adapta. Tudo depende de como será o acompanhamento. Mas pode deixar traumas para toda a vida. Mas não há como avaliar agora. O que se tem de fazer é acompanhar, reduzir o sofrimento para que não interfira no futuro dela.

Reforço ainda que não é só a menina que vai precisar de ajuda profissional. Todo o grupo familiar deve passar por isso.

Este ano tem sido o mais violento. Lajeado chega a 20 assassinatos. Na semana passada, teve a morte do casal Dullius. A recorrência desses crimes pode incitar, no imaginário coletivo, mais casos de homicídios na cidade?

Graziela: Hoje é ligar a TV e está lá. O que acontece em Lajeado, não é só aqui. A cidade segue o que ocorre no mundo. Em uma era da informação, parece que a vida perdeu importância. Vemos que o outro também tem menos valor. Falta diálogo para resolver as coisas de maneira racional. Agora as decisões estão cada vez mais extremas. Vemos comportamentos violentos devido a essa falta de apreço ao outro. Precisamos retomar o respeito, a comunicação. Estamos valendo muito pouco hoje.

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