Vale do Taquari – Quase 600 alunos dos ensinos Fundamental e Médio, de escolas estaduais de Lajeado, Teutônia e Estrela discutiram ontem sobre bullying no ambiente escolar, com o jornalista Fabrício Carpinejar.
O evento ocorreu no colégio Nicolau Müssnich, em Estrela, dentro das atividades dos Comitês Comunitários de Prevenção à Violência nas Escolas (Copreve), organizado pela Secretaria Estadual de Educação e Secretaria da Justiça e dos Direitos Humanos do Rio Grande do Sul.
Ao todo, são 30 palestras programadas pelo Estado, sendo a única no Vale do Taquari. Por duas horas, o escritor interagiu com os alunos, respondendo dúvidas e sugerindo dicas para enfrentar o bullying, a partir das próprias experiências.
Para Carpinejar, o diferencial está em desafiar o preconceito. “O pior do bullying é o autobullying. A gente não pode sofrer por coisas imaginárias”, diz. Segundo ele, o silêncio de vítimas de agressões verbais garante mais espaço ao agressor. Por isso cita necessidade de resposta e, ao mesmo tempo, um trabalho paralelo realizado em conjunto com o colégio.
Segundo a coordenadora da 3ª CRE, Marisa Bastos, a iniciativa instiga o diálogo nas escolas e serve de preparação aos professores e estudantes. Cita o trabalho realizado com o corpo docente na formação continuada, com troca de experiências e orientações. Mesmo assim, vê a participação dos alunos como fundamental no combate mais eficaz aessa violência.
“Apesar das particularidades, somos iguais”
Para o estudante Gelson Daniel Cunha, 16, o bullying precisa ser mais trabalhado nas escolas, com mais atuação em conjunto. Presenciou chacotas e gracinhas com uma colega deficiente mental. Segundo ele, as pessoas a evitavam e riam dos que se aproximavam dela. “Sempre busquei interagir com ela, por que apesar das particularidades somos iguais.” Pensa que a vida da colega e demais vítimas do bullying seria diferente se não houvesse esse preconceito.
A palestra de ontem auxiliou alunos como Ana Carolina Selke, 14. Relata ter sofrido com exclusão na infância e por gracinhas na adolescência, ao ser chamada de gorda por estudantes de diferentes turmas. Por causa disso, não gostava de ir à escola e tinha dificuldades de se relacionar.
“As pessoas que fazem também sofrem, por isso fazem”, cita. Antes fingia não ouvir. Depois da palestra, pretende enfrentar as agressões com a linguagem.
Esquadrão anti-bullying
Na escola Érico Veríssimo, em Lajeado, uma das alternativas adotadas pelos estudantes foi a criação do Esquadrão anti-bullying. Em 2010, depois de uma palestra na escola, seis alunos se reuniram para conversar sobre o tema e auxiliar vítimas. Hoje passam de 30 integrantes.
Conforme a orientadora educacional, Ana Célia Thomas, o grupo tem apoio da direção e conselho. “A partir da colaboração dos alunos, pela fiscalização e apoio às vítimas, conseguimos reduzir os índices”, afirma. O trabalho é feito também com agressores, evitando reincidências.
Consequências e dicas
O bullying se carateriza pela violência física ou psicológica, de forma intencional e continuada, de um indivíduo ou grupo contra alguém, sem motivo claro. Até pouco tempo, era visto como um fato isolado, tornando-se um problema crônico nas escolas.
Conforme a psicóloga Ana Paula Holz, as formas de agressão variam: empurrões, insultos, espalhar mentiras para implicar com a vítima, inventar apelidos que ferem a dignidade, ameaçar ou excluir. Aparecem também nos diferentes contextos, como trabalho e lar.
Como consequência, cita a distorção da autoimagem, devido ao sentimento de opressão, podendo desencadear doenças a partir da baixa autoestima, ansiedade e depressão. Além da exclusão, cita o reflexo em notas baixas e dificuldades de aprendizado e relacionamento.
Aconselha pais e professores a observarem as mudanças de comportamento dos adolescentes. Sugere uma atuação integrada, tendo os pais como principais agentes, na imposição de limites e no diálogo com os filhos.
“Linguagem é o melhor golpe”
Fabrício Carpinejar é jornalista e escritor. Ministrou ontem a palestra sobre bullying no ambiente escolar. Abaixo, dá dicas para enfrentar as agressões e fala sobre as experiências no colégio.
Jornal A Hora – Quais são suas dicas para superar o bullying?
Fabrício Carpinejar – Primeiro reconhecer aquilo que tu tem medo em ti. Segundo mostrar isso no responder. Usar o riso como uma arma, não contra o outro, mas contra si mesmo. Muitos adolescentes acham que se fizer algo vai ficar marcado pra sempre e não vai, as pessoas esquecem. Devemos saber que a vida é provisória, nada é definitivo. Não há maior beleza do que a confiança.
A.H. – Como é para você, que conta no livro Filhote de Cruz-credo o bullying sofrido na adolescência, estar em outdoors de campanhas publicitárias?
Carpinejar – Quem diria que um dia eu estaria fazendo propaganda de moda masculina. A gente tem que quebrar os moldes estéticos, até porque um homem é bonito pela atitude, segurança que transmite. Sempre que sofria bullying eu era o primeiro a sair, mudei quando descobri que podia responder. Quem pratica o bullying não é inteligente e não espera por uma resposta. Não há melhor golpe que a linguagem. Usar o senso de humor desarticula qualquer vexame.