Lajeado – A falta de recursos e projetos de preservação condena prédios históricos. A resistência de proprietários ao tombamento e a demora burocrática do processo agravam a situação. Na região, há dois prédios tombados pelo Estado.
Lajeado tem cerca de 20 imóveis históricos. A maioria aparece em condições precárias. Na quinta-feira, parte da antiga residência do ex-prefeito lajeadense e deputado estadual pela União Democrática Nacional (UDN), Bruno Born, desabou. As aulas da escola infantil ao lado foram canceladas na sexta-feira por imposição da Defesa Civil.
Esse é o terceiro registro de depredação e vandalismo no local. Com janelas e portas quebradas, aparece dominado por usuários de drogas. Em 2013, sofreu um sinistro misterioso, pondo em risco a estrutura. Sem condições de restauro, a família proprietária pôs o imóvel à venda.
Como medida paliativa, funcionários da Secretaria de Obras e Serviços Urbanos estiveram no local e, utilizando de um guincho, derrubaram parte do forro próximo à escola. Atribuem as causas do desabamento aos fatores naturais de degradação, agravados por incêndio anterior, e à utilização do espaço por vândalos.
A secretária da Cultura e Turismo, Neca Dalmoro, relata o interesse do município em comprar o imóvel há dois anos. Segunda ela, a ideia de transformá-lo em museu não vingou. A família recusou o valor.
Neca cita a constante preocupação do governo em manter a história local, tendo como dificuldade a resistência de parte dos proprietários e falta de recursos. “A administração faz de acordo com o que a lei exige, não pode mexer em prédio particular”, diz.
Promessas se repetem
Em fevereiro de 2012, administração municipal e Ministério Público (MP) anunciavam a criação de anteprojetos de lei para preservar os patrimônios culturais do município. Esses, prevendo incentivos financeiros e isenção de taxas para que os proprietários mantenham os prédios históricos em boas condições e proibindo a modificação ou destruição das fachadas originais.
Passados dois anos, as propostas ainda não foram enviadas ao Legislativo. Neca reconhece a estagnação dos projetos. “Tudo falado, registrado, mas na verdade não passou disso”, confessa. Relata a necessidade de reativar o Conselho Municipal de Cultura para retomar a busca pelos tombamentos municipais, com base no inventário realizado em 2011.
Esse atualiza o anterior, feito em 1992 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Cultural do Estado (Iphae). Dos 35 prédios históricos catalogados, o município teve 12 demolidos e outros três modificados pelos seus proprietários nos últimos 19 anos.
“Tenho pena da situação atual”
Antigo morador da área próxima ao rio, Constantino Chiarelli, 74, se entristece ao ver a desvalorização do local onde viveu com a família. “Tenho pena da situação atual.” Os pais Constantino Fausto e Hedi eram donos do antigo hotel e restaurante Pindorama, na esquina da rua Silva Jardim.
Mais velho dos cinco filhos, recorda da casa de alvenaria, repleta de cômodos. Na vizinhança, a praça hoje restrita e tomada por vândalos tinha um campo de futebol, principal atração nos fins de semana. Pelos três trapiches (trilhos de metal utilizados para carga e descarga, puxados por cordas movidas a contração animal) passava toda a mercadoria oriunda da capital, numa época em que o rio era o principal meio de transporte.
Faz 40 anos que a casa não existe mais. Depois da morte do pai, foi alugada e, devido a um misterioso incêndio, ficou comprometida.
Historiadores opinam
Para o professor de História, Wolfgang Collischonn, destruir as casas de valor histórico é desvalorizar o trabalho e contribuição dos colonizadores para o desenvolvimento da cidade. Ao mesmo tempo, ressalta a necessidade de elaboração de bons projetos, conciliando a preservação aos interesses da comunidade. “Tombar e deixar abandonado não serve”, diz.
Em entrevista feita em 2013, o diretor do Iphae, Eduardo Hahn, citou o desconhecimento da história local como principal agravante à desvalorização dos imóveis. “A quantidade de inventários finalizados é pequena, perto do patrimônio existente.”
Dificuldade regional
Em toda região, há dois prédios históricos tombados pelo Estado: a Casa de Cultura de Lajeado e o Taquariense, de Taquari. Outros, como o antigo Mosteiro de São Bento, de Imigrante, aguardam pelo trâmite legal.
Porém os poucos registros de colonização existentes no Vale continuam desaparecendo. Em Encantado, a casa mais antiga do município, com mais de 130 anos, está em degradação. A família Bratti relata falta de recursos para manutenção. Não há projetos municipais. O mesmo ocorre com o moinho próximo, uma das primeiras indústrias da região Alta.
Em Cruzeiro do Sul, aparece a Casa do Morro. Diante das dificuldades do município desenvolver um projeto viável, o MP acompanha o caso. O recurso previsto, devido à falta de liberação bancária, retornou à União, agravando a situação.
Em Marques de Souza, prédio tombado desabou antes de receber o restauro. Conhecido por abrigar a primeira cooperativa agrícola de Tamanduá, foi cenário, em 2002, das filmagens do filme A Paixão de Jacobina.