Sucessão de imperícias resulta em tragédia

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Sucessão de imperícias resulta em tragédia

Excesso de velocidade, sinalização insuficiente e desatenção provocam constantes acidente no local

Vale do Taquari – O trecho da BR-386, entre Pouso Novo e Marques de Souza, é um dos mais temidos por motoristas e agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF). São corriqueiros os acidentes e flagrantes de imprudência na perigosa descida da serra. No início da noite de quarta-feira, o receio virou terror. Após uma série de imperícias, uma das maiores tragédias registradas na região chocou o Estado.

A descida da serra de Pouso Novo possui cerca de oito quilômetros de pista duplicada em ambos os sentidos. O limite máximo de velocidade é 60 Km/h. Há placas de sinalização alertando para a necessidade de cuidados por parte dos motoristas. Muitos caminhoneiros utilizam o “freio motor” para melhor controle do veículo. Outros, não.

01Durante pouco mais de 20 minutos no local do acidente, no fim da manhã de ontem, houve diversos flagrantes de caminhões acima da velocidade permitida. Em um dos casos, o caminhoneiro freou exatamente no mesmo local do desastre de quarta-feira. Pior. Precisou invadir a pista contrária justo no momento em que ela vira faixa única para não se chocar com a traseira de outro caminhão.

No acidente que matou sete pessoas – cinco de uma mesma família –, houve, no mínimo, imperícia semelhante por parte do motorista de caminhão. Ele estava acima da velocidade limite, conforme depoimentos de sobreviventes. Também inexiste marcas de freada no asfalto. Isso pode indicar que o veículo tinha problemas mecânicos. Estava claro no momento do acidente.

O local da tragédia fica a pouco mais de 50 metros do fim da faixa adicional daquele trecho da rodovia. Uma placa, distante 300 metros da pista simples, poderia ter alertado o caminhoneiro com mais antecedência sobre o afunilamento da pista e a necessidade de reduzir ainda mais a velocidade. Mas a sinalização está coberta pelo mato, assim como outras tantas espalhadas pela BR-386.

Em análise preliminar divulgada pela PRF, o motorista do caminhão trafegava a 120 km/h minutos antes do acidente. O dobro do permitido naquele trecho. A informação tem como base as imagens do tacógrafo, que, segundo a Seção de Policiamento e Fiscalização, apresentou falha no momento em que descia a serra.

Caberá ao delegado, José Romaci Reis, titular da Delegacia de Polícia de Estrela, finalizar em até 60 dias o inquérito sobre as prováveis causas da fatalidade. Algumas testemunhas e sobreviventes já finalizaram os depoimentos. A PC aguarda agora a conclusão da perícia mecânica – que inicia em 10 dias – no caminhão. Segundo informações preliminares da PRF, o utilitário teria causado a série de batidas.

Fluxo cresce 43,7%

Desde o fim do pedágio em Marques de Souza, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) contabiliza aumento no fluxo de veículos, em especial de caminhões. Conforme o chefe da 4º delegacia, o inspetor Adão Vilmar Madril, sem a cobrança, caminhoneiros que desviavam do trecho, optando por outras rotas, passaram a usar a rodovia.

A estimativa da PRF é que cerca de 23 mil veículos passem todos os dias pela BR-386. Sete mil a mais do que o registrado até abril de 2013. Um incremento projetado de 43,7%.

O trecho da tragédia dessa quarta-feira, o quilômetro 308, é considerado um dos mais críticos pelo órgão. “Temos histórico de acidentes naquele ponto. Em especial com caminhões”, relata Madril.

Para ele, a duplicação pedida pela comunidade local reduziria os perigos na rodovia.

Além do excesso de veículos no trecho, outro problema derivado do término da praça de pedágios, é o socorro. Na época da concessionária, lembra, havia uma ambulância próxima. Do local do acidente, eram quatro quilômetros. Agora, o atendimento precisa ser deslocado de Lajeado, distante cerca de 40 quilômetros. “Temos essa preocupação com relação ao tempo para o socorro desde o anúncio do fim da cobrança.”

Sobrepeso dos caminhões

A PRF enfrenta dificuldade de fiscalizar o excesso de peso das cargas. Sem a balança, a verificação fica restrita à análise das notas e dos tíquetes emitidos pelas aparelhos das empresas. Estudo do Dnit divulgado no ano passado aponta que 77% dos caminhões no país trafegam com sobrepeso.

Conforme Madril, isso interfere nos freios, embreagem e na suspensão do veículo. Em todo o Estado, há dificuldade para averiguar o peso dos caminhões. São 13 equipamentos, entre móveis e fixos, em funcionamento nas rodovias federais. Pela estimativa, seriam necessários no mínimo 18.

O governo federal estuda implantar sensores eletrônicos para fiscalizar os caminhões nas rodovias. O Dnit projetava a instalação dos aparelhos em 2013. Houve atraso na elaboração da concorrência pública.

Estudo para duplicação

O Dnit elabora projeto para orçar o valor da duplicação dos 350 quilômetros entre Montenegro e Iraí, divisa entre Santa Cataria e Rio Grande do Sul. Em novembro de 2012, a bancada gaúcha na Câmara dos Deputados elegeu a obra entre as prioridades para o orçamento de 2013.

Pelos cálculos, serão necessários no mínimo R$ 15 milhões. O objetivo da Comissão Pró-Duplicação é fazer a obra por etapas. Primeiro conseguir emendas parlamentares para os primeiros 20 quilômetros, até Marques de Souza.

A BR-386 tem mais de meio século e apenas um trecho foi duplicado, entre Canoas e Tabaí. Um segundo, entre Tabaí e Estrela, está com as obras em andamento desde novembro de 2010. A conclusão dos 33,8 quilômetros previstos atrasou e deve ficar para 2014. Há um impasse entre Funai e Dnit para remoção da tribo caingangue em Estrela.

O consórcio contratado para a duplicação de Estrela a Tabaí ameaça abandonar a obra caso os dois quilômetros trancados pela Funai não sejam liberados até maio. Líderes regionais estiveram com o senador Paulo Paim, em dezembro, pedindo para que interceda no impasse.

Roçadas nas margens

Em diversos pontos, há mato encobrindo as placas de sinalização da rodovia. Além disso, irregularidades no asfalto, provocadas pelo fluxo intenso e pela falta de manutenção, deixam o trajeto mais perigoso.

Para Madril, no local do acidente, a falta da roçada não tem interferência. “Temos esse problema, mas naquele ponto a placa está visível.” O Dnit abriu licitação para fazer o recapeamento asfáltico e as roçadas. O processo deve ser encerrado até o fim do mês.

“Ela (carreta) veio montando por cima de nós”

A Hora – Sua família estava voltando do velório da sua avó, em Tiradentes do Sul. Quem viajava com você e quem estava no outro carro?
Vilson Schimitz– Estávamos a mesma família em dois carros. Eu estava no Fiat Prêmio com meu amigo Douglas, que dirigia, e com meus dois irmãos menores. No outro carro (Fiat Tipo) viajavam meu pai, minha mãe, meu outro irmão, que dirigia o carro, e duas tias.
A Hora – O que você lembra do momento do acidente?
Schimitz – Era dia ainda. Umas 19h e pouco da tarde. Estávamos descendo a serra. Nós na frente e o meu pai atrás. Meu irmão estava dirigindo o carro dele. Daí a carreta desceu a serra, embalada, e não venceu segurar os freios. Ela veio montando por cima de nós. Primeiro bateu no carro do meu pai e jogou para a pista contrária. Da outra pista veio o outro carro e também bateu no carro do meu pai. O caminhão também bateu na nossa traseira, e nós rodopiamos na pista umas três vezes. Paramos no acostamento da pista contrária. Foi tudo muito rápido.
A Hora – Como vocês saíram do veículo?
Schimitz – Saímos de imediato, logo depois da batida. Eu saí pela janela do motorista e ajudei meus irmãos a saírem também. Ambos dormiam no momento da batida. O atendimento foi rápido. Só os bombeiros demoraram um pouco mais, pois vieram de Lajeado. A ambulância chegou em menos de 20 minutos. Nos machucamos um pouco. Esfolamentos, mas nada grave. Fomos parar no hospital, e logo nos liberaram. Meus irmãos estão desconsolados. Sou o mais velho. Éramos seis irmãos, mas um faleceu ontem (quarta-feira) e outro já morreu há mais tempo.
A Hora – Quando você saiu do carro, tentou ajudar os familiares do outro veículo?
Schimitz – Sim. Eu logo vi o carro deles, que não tinha pegado fogo ainda. Corri para tentar socorrer e tirar alguém vivo lá de dentro. Achava que estavam vivos, eu queria isso. Mas no fundo sabia que não. Com as duas batidas e o jeito como os corpos estavam esmagados e desacordados, não tinha ninguém vivo. E depois de quebrados, ainda queimaram. Saí do local assim que começou a pegar fogo no carro. A tragédia poderia ser ainda maior.

A Hora – Sua família estava voltando do velório da sua avó, em Tiradentes do Sul. Quem viajava com você e quem estava no outro carro?

Vilson Schimitz– Estávamos a mesma família em dois carros. Eu estava no Fiat Prêmio com meu amigo Douglas, que dirigia, e com meus dois irmãos menores. No outro carro (Fiat Tipo) viajavam meu pai, minha mãe, meu outro irmão, que dirigia o carro, e duas tias.

04A Hora – O que você lembra do momento do acidente?

Schimitz – Era dia ainda. Umas 19h e pouco da tarde. Estávamos descendo a serra. Nós na frente e o meu pai atrás. Meu irmão estava dirigindo o carro dele. Daí a carreta desceu a serra, embalada, e não venceu segurar os freios. Ela veio montando por cima de nós. Primeiro bateu no carro do meu pai e jogou para a pista contrária. Da outra pista veio o outro carro e também bateu no carro do meu pai. O caminhão também bateu na nossa traseira, e nós rodopiamos na pista umas três vezes. Paramos no acostamento da pista contrária. Foi tudo muito rápido.

A Hora – Como vocês saíram do veículo?

Schimitz – Saímos de imediato, logo depois da batida. Eu saí pela janela do motorista e ajudei meus irmãos a saírem também. Ambos dormiam no momento da batida. O atendimento foi rápido. Só os bombeiros demoraram um pouco mais, pois vieram de Lajeado. A ambulância chegou em menos de 20 minutos. Nos machucamos um pouco. Esfolamentos, mas nada grave. Fomos parar no hospital, e logo nos liberaram. Meus irmãos estão desconsolados. Sou o mais velho. Éramos seis irmãos, mas um faleceu ontem (quarta-feira) e outro já morreu há mais tempo.

A Hora – Quando você saiu do carro, tentou ajudar os familiares do outro veículo?

Schimitz – Sim. Eu logo vi o carro deles, que não tinha pegado fogo ainda. Corri para tentar socorrer e tirar alguém vivo lá de dentro. Achava que estavam vivos, eu queria isso. Mas no fundo sabia que não. Com as duas batidas e o jeito como os corpos estavam esmagados e desacordados, não tinha ninguém vivo. E depois de quebrados, ainda queimaram. Saí do local assim que começou a pegar fogo no carro. A tragédia poderia ser ainda maior.

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