Excutivo e Lenan erram. Contrato emergencial volta

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Excutivo e Lenan erram. Contrato emergencial volta

Executivo erra na elaboração do edital e empresa vencedora percebe discordâncias só após assinatura do contrato, que agora será rompido de forma unilateral. Desde ontem, W.K.Borges atua outra vez de forma emergencial. MP cobra habilitação imediata da segunda colocada no processo licitatório

Lajeado – Uma sucessão de erros e equívocos paralisou no recolhimento de lixo nesse fim de semana, gerando protestos de moradores. Mesmo sob observação constante do Ministério Público (MP) e do Tribunal de Contas do Estado (TCE), o edital de licitação apresentado pelo Executivo ficou confuso. Discrepâncias entre cláusulas e planilha de orçamento impediram a concorrência entre as empresas e deram margens para diferentes interpretações.

lA polêmica se intensificou na última quarta-feira, quando o Executivo autorizou a Ordem de Serviços para a Urbanizadora Lenan, e notificou a empresa lajeadense para que apresentasse a relação de funcionários e veículos. A vencedora do processo licitatório – realizado no dia 27 de agosto – deveria iniciar os serviços de recolhimento de lixo doméstico e seletivo na sexta-feira.

Mesmo com o contrato firmado desde a terça-feira, o diretor da empresa, Gilberto Vargas, decidiu não iniciar a coleta. Durante todo o fim de semana, o lixo se acumulou em lixeiras, árvores e calçadas da cidade. Vargas argumenta haver disparidades entre o número de funcionários exigidos pela administração municipal, e aquilo que constava na Planilha de Orçamento Global do edital.

Esta diferença no número de funcionários é a principal discrepância verificada no edital. De acordo com a cláusula 9 do documento, “a coleta domiciliar deverá ser realizado por sete equipes, sendo cada uma composta de um motorista e três coletores e um supervisor por turno”.

No entendimento da assessoria jurídica da prefeitura, para realizar a coleta domiciliar é preciso sete equipes durante o período diurno e outras sete para o noturno, totalizando 14 por dia. Para atender a essa solicitação, são necessários 58 funcionários. Sete caminhões e outros dois reservas para eventual emergência estão previstos no contrato.

Vargas contesta a interpretação do executivo. Para ele, são necessárias apenas sete equipes por dia. Isso consta na Planilha de Orçamento Global, anexado ao edital de licitação. Conforme especifica o documento, quatro equipes devem trabalhar no período diurno e três durante a noite. Prevê ainda a contratação de apenas um supervisor. A partir disso, seriam necessários 29 funcionários. Metade daquilo solicitado pela administração municipal.

Há também contradição nos critérios definidos para os serviços de coleta seletiva. O executivo solicita duas equipes. Elas devem ser formadas, cada uma, por um motorista, dois coletores e um supervisor, totalizando 8 funcionários. Os números são diferentes da planilha orçamentária do edital. Lá, consta a necessidade de contratar apenas uma equipe, composta de um motorista, um supervisor e três coletores.

W.K.Borges estranha exigência

Um dos diretores da W.K.Borges demonstra surpresa ao ser informado dos critérios exigidos pela assessoria jurídica da prefeitura. Conforme Marcos Borges, a empresa com sede em Porto Alegre sempre utilizou sete equipes para realizar o serviço de recolhimento de lixo doméstico em Lajeado, e uma para a coleta seletiva.

“Sempre atuamos com sete equipes durante todo o dia na coleta domiciliar. Não vejo necessidade para contratação de 14 equipes.” Segundo o empresário, o número de funcionários sempre foi proporcional ao de veículos. Até quinta-feira, a empresa trabalhava com sete caminhões para coleta domiciliar e um para seletiva. Para ele, utilizar todos durante o dia inteiro seria “quase inviável”.

Ele confirma que a proposta da empresa para concorrer no processo licitatório se baseou na Planilha de Orçamento Global, assim como a Urbanizadora Lenan e as três outras concorrentes. E não na cláusula defendida pelo Executivo. “Lembro que a planilha de custo previa quatro equipes de manhã e três durante a noite. Isso, pela nossa experiência na cidade, é suficiente.”

“O município tenta induzir uma inverdade”

Para o advogado da Urbanizadora Lenan, Natanael dos Santos, a administração municipal só poderia exigir 68 funcionários se tivesse especificado essa necessidade na planilha de custos e no edital. “Eles querem induzir e modificar o teor de uma cláusula. Mas a planilha serve justamente para esclarecer qualquer dúvida, conforme atesta a Lei de Licitações.”

Ele discorda da interpretação do executivo para a cláusula do contrato. “Ela cobra um supervisor por turno, o sete equipes durante o dia. Está muito claro.” Santos critica também a antecipação da ordem de serviço. Segundo o advogado, a Lenan possui prazo até hoje para iniciar a coleta. “O contrato prevê um período de até cinco dias entre a assinatura do contrato e o início dos trabalhos.”

Apesar disto, o diretor da Lenan não deverá iniciar os serviços hoje. Segundo Vargas, o contrato com assinatura do prefeito ainda não foi enviado para a empresa. “Não vamos recolher lixo com outra empresa na cidade. E com certeza o aterro sanitário não será aberto para nossos caminhões.”

No fim da tarde de ontem, Vargas entregou ao judiciário os documentos solicitados após ação cautelar movida pelo Executivo contra a empresa. Ele também pretende denunciar a administração municipal ao TCE, ao MPC e ao MP de Lajeado. “Querem me prejudicar, então vou denunciar estas arbitrariedades e entregar gravações que demonstram atitudes ilícitas do governo.”

Administração insistirá nas 14 equipes

De acordo com o assessor jurídico da prefeitura, Juliano Heissler, a intenção de contar com 14 equipes diárias realizando o recolhimento de lixo será mantida. “A proposta vai de encontro ao crescimento urbano. É um novo modelo, e a empresa que quiser atuar aqui terá que se adequar.” Conforme estudos, pelo menos mil novos habitantes são registrados em Lajeado a cada ano.

Heissler lamenta a atitude de Vargas em não iniciar o recolhimento na data prevista. Lembra que, tanto a planilha como as cláusulas do contrato nunca foram contestadas por nenhuma das empresas concorrentes. “A administração quer o serviço realizado. Se houve discrepâncias no processo, o diretor da Lenan deveria ter conversado. Qualquer situação seria analisada.”

A respeito das disparidades entre o edital e a planilha de custos, Heissler não admite erro por parte do executivo. Diz apenas que a planilha é de responsabilidade do engenheiro da prefeitura, e que o executivo confia no serviço prestado pelo funcionário. “O edital foi analisado pelo TCE, pelo MP e pelas empresas. Não houve nenhum apontamento ou discordância.”

Para MP, Lenan errou

O promotor civil, Neidemar Fachinetto, critica a postura da Urbanizadora Lenan. Para ele, a empresa deveria ter iniciado os serviços, mesmo com as dúvidas em relação do número de funcionários. “Se assinou a ordem de serviço, deveria ter iniciado. O município não foi inadimplente, pois realizou todos os trâmites exigidos.”

Sobre as disparidades no número de funcionários, Fachinetto é enfático. “Essa discussão não me interessa. Nossa preocupação é pelos serviços básicos que não podem faltar à comunidade.” Ele relembra que todo o edital foi avaliado de forma preventiva pelo MP e pelo Tribunal de Contas.

Fachinetto demonstra receio com a nova prorrogação do contrato emergencial com a W.K.Borges. Lembra que o próprio MP já se posicionou contrário a esta decisão. No entanto, ele considera inviável outra solução para o momento. “Eu não gostaria de prorrogar, todo nosso trabalho foi contra essa direção. Mas agora há uma situação fatídica que justifica essa contratação.”

O novo prazo que será concedido à W.K.Borges ainda não está definido. Os serviços, que reiniciaram ontem, devem ser normalizados até amanhã. Antes disso, o promotor cobra documentos que justifiquem a rescisão de contrato com a Lenan. Fachinetto considera complicado definir o período disposto para o contrato emergencial, que deve custar em torno de R$ 200 mil mensais aos cofres públicos.

Para o MP, é preciso habilitação imediata da empresa que ficou na segunda colocação da concorrência. Ele alerta ainda para a possibilidade da empresa de Lajeado entrar com liminar, o que atrasaria ainda mais a regularização do serviço.

Entrevista com especialista

Gladimir Chiele, advogado, Diretor Geral da OAB/RS, professor da Escola do Ministério Público e Assessor Jurídico da FAMURS, fala sobre a polêmica

A Hora – A partir dos argumentos defendidos pela empresa e pelo Executivo, quem está com a razão?

Chiele – Em qualquer edital ou contrato, em caso de divergência ou interpretação dúbia entre o contrato (cláusula) e os anexos (planilha de custos), vale sempre o que está no edital ou no contrato. Isso porque o edital faz a regra geral da participação dos interessados e define como deverá ser a proposta do licitante. O anexo é a sustentação técnica para o que está expresso no edital e também no contrato. No entanto, se a divergência é essencial, ou seja, passível de inviabilizar a formulação da proposta, ou tornar uma proposta inexequível por conta da informação equivocada no anexo, o certame é passível de anulação, seja pela via administrativa ou judicial.

A Hora – Especificamente no caso de Lajeado, o que deveria ser feito e o que pode ser realizado a partir de agora?

Chiele – Todos os editais possuem prazo para impugnação. Havendo dúvidas, ele deve ser impugnado para que haja correções ou esclarecimentos sobre pontos controversos. Neste caso se consta na planilha 29 funcionários, e a previsão do edital é de 14 equipes, então há uma discrepância fundamental. Se o contrato está em vigor, deve ser feito um ajuste contratual, através de aditivo, inclusive de preços, sempre levando em conta os comparativos dos demais participantes da licitação. Ou seja, se os demais licitantes levaram em conta a previsão de apenas 29 funcionários, então é possível aditivar. Se os demais calcularam 58 funcionários na proposta, o valor dos demais seria maior. Neste caso, o contrato não pode ser alterado, mas deve ser anulado e refeita a licitação.

A Hora – E se a licitação estiver em curso? Como é possível proceder?

Chiele – Se a licitação está em curso, deve ser paralisada, ajustada a planilha com base no que prevê o edital, sob pena de nulidade do processo, pois a situação dúbia provocada pela planilha pode levar à apresentação de propostas diferentes, com interpretação diversa do edital. Os critérios não podem ser vagos ou imprecisos, devem ser claros. Se ainda há tempo legal, deve ser impugnado mediante procedimento especifico para que a planilha seja ajustada ou seja esclarecido como deve agir o licitante.

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