Estrela – Falta apenas bater o martelo. Envolvida em polêmicas desde o início do ano, a VRS Laticínios será vendida para um grupo de quatro investidores nos próximos dias.
A negociação se iniciou após as recorrentes denúncias de irregularidades por parte do Ministério Público (MP) e foram adiantadas após a interdição da fábrica. Acordo entre os atuais sócios na última sexta-feira deve viabilizar a recuperação judicial da empresa e o pagamento aos credores.
Um dos empresários que pretende comprar a empresa de laticínios confirma que as negociações iniciaram após a interdição da empresa pelo Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal (Dipoa), em agosto.
Segundo ele, o grupo de investidores só aguarda a realização da audiência entre a atual diretoria e o MP, onde será apresentada uma proposta de recuperação judicial da VRS. “Depois de resolver esse impasse, faremos uma proposta aos credores. Mas a compra está definida.”
Na semana passada, o diretor Rui Sulzbach comprou 100% das ações junto ao irmão, Valdir Sulzbach. O acordo pôs fim aos processos existentes entre eles. “Isso facilitou a transação”, admite o comprador.
O empresário acredita na recuperação da marca Latvida. Cita a estrutura de produção e logística como pontos positivos da fábrica instalada na Linha Santa Rita, interior de Estrela.
Sobre as exigências sanitárias do Ministério da Agricultura (Mapa), Promotoria de Defesa do Consumidor e do Dipoa, comenta já terem sido resolvidas pela atual diretoria.
Mesmo assim, reitera que todas as requisições e adequações necessárias serão atendidas pela nova direção. “Tudo será feito dentro das regras e condições exigidas.” Conforme ele, se confirmada a transação, evita-se o pedido de falência da empresa.
Liminar exige R$ 3 milhões da VRS
Caso volte a funcionar, a VRS Indústria de Laticínios terá de cumprir uma série de exigências feitas pela Promotoria de Defesa do Consumidor.
Interditada desde o dia 21 de agosto, após o Dipoa flagrar novamente irregularidades na fábrica da marca Latvida, a empresa precisará adotar mecanismos de controle mais eficazes e realizar calibragem e checagens periódicas dos equipamentos. Caso contrário, pagará multa diária de R$ 500 mil.
A decisão da Justiça acatou pedido de liminar da Promotoria, solicitado após a direção da empresa negar a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).
Das cinco indústrias que tiveram constatada a presença de formaldeído em lotes de leite UHT que chegaram ao mercado de consumo, deflagradas durante a Operação Leite Compen$ado, em maio, a VRS foi a única que não concordou em assinar o documento.
Com a liminar, a empresa precisa adotar mecanismos de controle da origem da matéria-prima recebida na indústria; fazer aferição e calibração periódica de equipamentos para análise de leite; comunicar imediatamente ao órgão fiscalizador quando for constatada a impropriedade dos produtos lácteos; realizar o cadastro dos transportadores e postos de resfriamento, entre outras medidas.
A determinação do juiz da 16ª vara Cível de Porto Alegre, Sandro Silva Sanchotene, exige da empresa – detentora das marcas Latvida, Hollmann, Só Milk, Goolac e Leite da Manhã – o pagamento de uma indenização a titulo de danos morais coletivos em valor não inferior a R$ 3 milhões. Todas as demais fábricas envolvidas na fraude do leite também foram obrigadas a arcar com danos semelhantes.
O TAC assinado com a Brasil Foods S.A, por exemplo, cobrou, a título de indenização aos danos morais coletivos, a doação de R$ 1,8 milhão. Deste total, R$ 500 mil foram destinados ao Fundo Estadual de Defesa do Consumidor do Paraná – onde foram comercializados os lotes impróprios – e R$ 1,3 milhão convertido em doação de equipamentos para órgãos públicos do Rio Grande do Sul.
Segundo o advogado da empresa, Diogo Merten Cruz, a liminar propõe as mesmas exigências do TAC sugerido pelo MP. “Todos os mecanismos de fiscalização já são realizados pela empresa. Não assinamos o TAC pois assim estaríamos admitindo a presença do formaldeído.”
Irregularidades desde 2003
A ação foi ajuizada na manhã de quinta-feira. Diversos fatos foram levados em conta para que o pedido fosse atendido. Documentos remetidos pela Secretaria Estadual da Agricultura (Seapa) demonstraram que, desde 2003, a indústria vem sistematicamente sofrendo autuações.
São diversos os motivos: produtos e água em desacordo; datas de fabricação adulteradas; produtos com adulterações (sacarose, cloro/hipoclorito), produtos refrigerados com temperatura acima da permitida; comercialização de produtos com rótulos não registrados; transporte de produtos mal acondicionados; instalações com higienização insatisfatória; burla à fiscalização; prestação de informações inverídicas aos órgãos de fiscalização, entre outros.
Um dos exemplos mais divulgados ocorreu em 23 de abril deste ano, quando foram apontadas 188 irregularidades na sede da indústria. A fábrica teve suspensa as atividades pelo órgão administrativo estadual.
Foi constatada a adição de formol ao leite UHT Desnatado, da marca Latvida, com fabricação em 16/02/2013, em março deste ano. A empresa nega o fato e apresenta análises com resultados negativos para o produto.
Segundo o advogado, a assessoria jurídica da empresa tem provas judiciais que comprovam a inexistência de formaldeído em todos os lotes divulgados pelo MP. “Comprovaremos o que sempre anunciamos: Nunca existiu a presença de formaldeído em nosso produto. Nos próximos dias vamos divulgar nossas provas.”
Fábrica está interditada
Durante nova fiscalização realizada no dia 21 de agosto, outra vez houve necessidade de interdição da indústria. Na ocasião, por volta da meia noite, a Seapa, acompanhada de policiais da Delegacia do Consumidor, constatou que a empresa estava recebendo, pasteurizando e envasando leite UHT e creme de leite no período noturno em péssimas condições de higiene, sem aviso prévio e presença da inspeção local.
Ainda foram encontradas mais de mil caixas de Leite UHT armazenadas em sacos plásticos que, devido às características, indicavam que haviam sido esvaziadas recentemente e com prazos de validade vencidos.