Jornada mundial tenta aproximar jovem da Igreja

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Jornada mundial tenta aproximar jovem da Igreja

Em meio à queda de fiéis nas últimas décadas, o primeiro pontífice sul-americano prega humildade para aproximar Igreja dos devotos. Dados do IBGE mostram que em 1970 o número de católicos era de 91,8% da população. No último censo, o percentual reduziu para 64,6%

Vale do Taquari – O papa Francisco desembarcou ontem no país para uma das maiores missões da Igreja Católica: tentar aproximar as novas gerações da vida religiosa e estancar a diminuição do número de católicos. Na Jornada Mundial da Juventude (JMJ) fica uma semana em contato com os peregrinos.

Com a promessa de uma Igreja mais simples, em favor dos pobres e próxima do Evangelho, o ex-arcebispo de Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio, deve atrair dois milhões de pessoas ao Rio de Janeiro. Uma demonstração de poder no país com maior número de católicos no mundo, mas enfraquecido pelo distanciamento entre instituição e sociedade moderna.

pNos 36 municípios do Vale do Taquari, conforme o censo 2010, são mais de 247 mil católicos. Frente ao total da população (327,5 mil) representam 75,4% dos habitantes.

Dado superior à pesquisa do Datafolha realizada em junho. O estudo aponta que 57% dos brasileiros maiores de 16 anos declararam católicos. É o menor índice da história. Em levantamento semelhante, realizada em 2007, o percentual apontou 64%. Em 1994, eles eram 75%.

Ao passo que poucos fiéis vão às missas e colaboram com o dízimo, os templos correm riscos de desabar. Nas comunidades do interior do Vale do Taquari, prédios centenários sofrem com a ação do tempo.

Em algumas paróquias, como na Igreja Matriz São Francisco Xavier, em Santa Clara do Sul, os cupins destruíram parte da madeira dos pilares, do assoalho e atacam bancos e aberturas.

Segundo o presidente da comunidade, Charles Thomas, o quadro se estende há anos, sem que a igreja tenha condições técnicas e financeiras de combater a praga com eficiência.

As dificuldades aumentam com o desinteresse das famílias. “Vemos que na igreja são sempre os mesmos.” Para ele, uma das formas de mudar esse quadro é abrir espaço aos jovens, dar liberdade para eles organizarem celebrações e missas.

Doutor em sociologia e professor do Departamento de Ciências Humanas da Unisc, Cesar Goes, concorda com a avaliação de Thomas. Para ele, a Igreja Católica demora a se modernizar. “O mundo avançou. As questões do cotidiano interferem na vida das pessoas, enquanto a Igreja segue fechada.”

Assuntos como o casamento gay, o uso de métodos anticonceptivos e o aborto são combatidos pela doutrina. Esse comportamento, coloca a instituição em um patamar parcial e fundamentalista, diz Goes.

Cerca de 123 milhões de brasileiros se declararam católicos em 2010, (64,6% da população). Em 1970, eram 91,8%. A religião com maior aumento de adeptos são as evangélicas. Passaram de 5,2% em 1970 para 22,2% em 2010.

Francisco segue tradição

Encontro promovido pelo papa João Paulo II, em 1984, deu início à JMJ. Na época, foi entregue a Cruz da Jornada, um dos principais símbolos do evento e em 1985 foi declarado Ano Internacional da Juventude pelas Nações Unidas.

A cada dois ou três anos, o papa participa da jornada. A última edição ocorreu em agosto de 2011, em Madri, na Espanha, e reuniu adeptos de 190 países.

Natural de Travesseiro, Júnior Rodrigo Weizenmann, 26, está no Rio de Janeiro. Ele é um dos voluntários que recepcionará os peregrinos. Membro do grupo de jovens do município, começou a vida religiosa com os pais.

A vontade de ajudar o levou a se inscrever na JMJ. Junto a isso, somam-se a possibilidade de conhecer outras culturas e de estar próximo do Santo Padre. Para ele, a religião ajuda a formar o caráter. “Com esse conhecimento, nos tornamos pessoas melhores.”

Coordenadora do setor Juventude da Diocese de Santa Cruz do Sul, Valéria Fischer, 18, tem expectativas positivas com o encontro. “Acho que será a única oportunidade de chegar perto do papa. Sem dúvida, ficará registrada na memória e no coração.”

Ela esteve em Madri, em 2011. “Foi um momento inexplicável.” Para Valéria, os jovens não acreditam que a Igreja seja um lugar para troca de experiências e expressão de fé. A vida em comunidade, ressalta, fazem diferença, pois mostram o quanto pode ser feito. “As pessoas apresentam mais maturidade, solidariedade e otimismo.”

Na opinião dela, a Jornada deixa um recado. “O jovem quer espaço para expressar sua fé, seu jeito jovem de rezar, de testemunhar.” Outro aspecto destacado é a capacidade da juventude, tanto os voluntários, quanto os peregrinos, em renunciar o conforto de casa para vivenciar a reunião em torno da espiritualidade.

“A modernidade afastou parte da juventude”

O padre Roque Hammes, natural de Arroio do Meio, lembra dos anos de estudante no município. Participavam de jogos e o ponto de encontro era na paróquia.

Nos tempos atuais, a diversidade de alternativas, a internet, o desenvolvimento tecnológico diminuíram a participação dos jovens. Nada que abale o otimismo do pároco. “A modernidade afastou parte da juventude. Mas, por outro lado, temos exemplos bonitos, de expressões de fé dessa parcela da sociedade.”

Segundo ele, a Igreja mudou. Está mais flexível e começa a discutir assuntos que eram considerados dogmas, como a homossexualidade.

Para ele, a presença do papa Francisco no país representa um momento para conhecer melhor o novo pontífice, acompanhar as atitudes e ouvir suas palavras. “Na forma de divulgar essa imagem, em que a sociedade a vê como algo estático, distante.” De acordo com o padre, o pontífice mostrará uma nova face da Igreja. Mais alegre e esperançosa.

Imigração interfere na religião

Nas cidades com descendentes italianos há maior número de católicos, enquanto nas com histórico de imigração germânica a Luterana divide a população. Na região, Relvado tem o maior índice, com 98,8% (confira no boxe).

Destacam-se os municípios de Dois Lajeados (98,4%), Progresso (97,2). Entre as maiores cidades, Encantado ocupa lugar de destaque. Dos 20,5 mil habitantes, 85% se declararam católicos pelo censo de 2010.

Para o pesquisador Goes, em países latinos, há uma maior proximidade dos ensinamentos da Igreja Católica. A colonização do país representa um marco histórico no desenvolvimento religioso.

No Vale, com a imigração, um grande número de famílias protestantes difundiu a prática na colônia alemã. Conforme o sociólogo, com o calvinismo e os anglicanos, essas são religiões étnicas, com forte apego às tradições de um povo.

Para ele, tanto a católica quanto às evangélicas tradicionais tendem a reduzir os adeptos e o motivo está ligado à influência do contexto atual nas novas gerações. Como exemplo, cita a pouca renovação no quadro de sacerdotes.

O sentimento de pertencimento do jovem às doutrinas, fundamenta Goes, não é mais pela tradição dos antepassados ou pela colonização. Esse, na visão dele, é o desafio das Igrejas. Entre as possibilidades, assimilar outras formas de celebração.

Pontífices no Brasil

O papa Francisco é o terceiro pontífice a visitar o país. João Paulo II foi o primeiro a vir ao país, em 1980. Esteve no país outras duas vezes (em 1991 e 1997). Bento XVI visitou o território nacional em 2007.

Na primeira estadia. João Paulo II ficou 12 dias. A visita de Karol Wojtyla ficou marcada pela presença maciça de fiéis nas missas campais e pela extensão do trajeto, ao todo, o pontífice passou por 11 estados brasileiros, além do Distrito Federal.

Em 1991, aos 71 anos, o papa polonês voltou. Em nove dias de missas visitou nove estados. A terceira e última visita de João Paulo 2º, em 1997, durou quatro dias e se restringiu ao Rio de Janeiro, onde desembarcou em 2 de outubro.

Aos 77 anos e com a saúde bastante debilitada, o papa realizou poucos pronunciamentos e apenas uma missa campal no Aterro do Flamengo, à qual compareceram mais de 1 milhão de pessoas.

Quase uma década depois, Bento XVI desembarcou no aeroporto de Guarulhos em 9 de maio de 2007 para uma visita de cinco dias. O papa alemão conheceu as cidades de São Paulo, Aparecida e fez uma breve parada em Guaratinguetá, onde visitou um centro católico para recuperação de dependentes químicos.

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