Vale do Taquari – Uma massa de ar polar “derruba” as temperaturas neste fim de semana. O ápice do frio ocorre na manhã de segunda-feira, com previsão de -5°C em Vacaria e -4°C em Bom Jesus. Na serra do Nordeste e leste do Planalto gaúcho são grandes as possibilidades de nevar. Em outras áreas, de acordo com o meteorologista Rogério Rezende, do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), as geadas serão comuns.
Para nevar, observa o especialista, é preciso que a temperatura da atmosfera e do solo estejam perto ou menor a 0oC, com grande umidade. É essencial que todo o caminho percorrido pelo vapor da água (superfície até as nuvens) esteja gelado para que os cristais não derretam.
No país, as raras precipitações de neve ocorreram em pontos serranos dos estados do Paraná, de Minas Gerais, do Rio de Janeiro, de São Paulo, do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Cidades localizadas em altitudes superiores a 1,2 mil metros acima do nível do mar.
Outro fenômeno que pode ocorrer é a chamada geada negra, afetando agricultura e podendo causar acidentes de trânsito. As condições para que esse fenômeno mais raro ocorra na região aumentam a partir da terça-feira, pois deverá ter a chegada de uma intensa massa de ar polar. Ela se forma quando as temperaturas ficam negativas com quedas muito bruscas. Provoca o congelamento total das plantas, deixando-as mais escuras, sem aquela camada branca de gelo.
Se difere da geada branca, que ocorre com céu limpo, sem a presença de neblina. Para ela se formar não pode haver vento e a temperatura de relva (medida junto do chão) não pode ser maior que 4ºC.
Algumas características do relevo influenciam na formação ou não de geada. Em depressões ou vales, costumam se formar acúmulos de ar frio que desce das montanhas, propiciando o acúmulo de gelo. Regiões montanhosas ou muito altas costumam ter geada regularmente.
Preocupação com os pomares
A ocorrência de geadas nos próximos dias pode comprometer a qualidade dos citros que estão sendo colhidos no Vale do Caí e Taquari.
Conforme o técnico em fruticultura da Emater Regional de Lajeado, Derli Bonine, são cultivados mais de 9 mil hectares, e a projeção é de colher 200 mil toneladas. Deste montante 50% foi colhido. “Uma geada forte seria um desastre. As perdas seriam enormes, como foram na safra passada.”
Quanto ao cultivo de hortaliças, Bonine ressalta o fato da maior parte dos cultivos ser feito a céu aberto e sem proteção. A queimadura das plantas pode provocar uma escassez no mercado e influenciar no aumento dos preços. “É a lei da oferta e procura.”
O frio atrapalhar o desenvolvimento de mudas, como é o caso do tomate. Quanto às pastagens e cereais (trigo, canola e cevada), não devem ocorrer perdas.
Cidades gaúchas cobertas de gelo
O centro de meteorologia Metsul, por meio de sua página eletrônica, descreve o fenômeno de 24 de agosto de 1984, como mágico. A neve cobriu as ruas porto-alegrenses ganhando destaque nacional em vários meios de comunicação.
De acordo com uma reportagem da Zero Hora da época, a temperatura diária começou regular, com forte queda no final da manhã e começo da tarde. Às 15h, fazia 2ºC na capital gaúcha e chovia. Em instantes, a água transformou-se em flocos de neve que cobriram toda a cidade e diversas regiões da área metropolitana. A queda chegou a durar uma hora em alguns locais.
Foi o suficiente para que houvesse acúmulo sobre automóveis, telhados e na vegetação. O espetáculo foi mais bonito em partes altas da cidade como o Morro Santa Teresa, onde moradores chegaram a formar um pequeno boneco de neve sobre os automóveis.
Na Rua da Praia, no centro, os porto-alegrenses incrédulos não podiam acreditar. A neve caía, sem trégua, sobre a Praça da Alfândega e transformava a paisagem.
Alunos dispensados em Santa Clara do Sul
No mesmo dia e horário, o fenômeno surpreendeu os cem alunos da Escola Floriano Peixoto, de Chapadão, em Santa Clara do Sul. Os professores Antônio Darcênio Johann, 66, e Izabela Johann, 58, eram os responsáveis pelo colégio na época.
Era intervalo quando os primeiros flocos começaram a cair. Incrédulos com o acontecimento, os estudantes foram liberados para aproveitar o resto da tarde.
A neve caiu por cerca de 30 minutos. Tempo suficiente para cobrir telhados, árvores ruas e campos. Conforme eles, era possível ver o gelo ainda no domingo à tarde, em locais que pegavam menos sol.
Para os professores, parecia um cenário um filme, com efeitos especiais. Enquanto ela, com um guarda-chuvas, passeava sobre a localidade, Johann foi a Nova Santa Cruz – comunidade vizinha, comunicar o fato para amigos e parentes. Convidou todos para ir até Chapadão. Muitos foram e montaram bonecos de neve e levaram para casa. “Não era um dia tão frio, diferente de como imaginávamos que seria.”
Izabela lembra que havia uma árvore de azaleia muito grande. Com a neve, pensou que todas as flores morreriam. Na segunda-feira, quando retornou ao colégio se surpreendeu com as cores intactas da planta.
Lamenta que sua máquina de tirar fotos, analógica e simples, não tenha funcionado no dia. Mas garante que o cenário está gravado em sua lembrança. “Nem que viva mais 50 anos me esquecerei daquele dia.”
Em Sério, neve começou ao meio dia
No município vizinho de Santa Clara do Sul, em Sério, a queda dos flocos de neve começou por volta das 12h daquele mesmo dia. A professora aposentada, Dolores Kunzler, ministrava na Escola Estadual Pedro Albino Müller.
Recorda-se que na hora do intervalo a camada de gelo era de aproximadamente 15 centímetros. Os estudantes fizeram bonecos e bolas de neve, brincaram a tarde toda. “As crianças ficaram impressionadas, como nós. Foi algo incrível.”
Na época, a professora tinha uma máquina fotográfica a pilhas. De acordo com ela, era incomum as pessoas terem esses aparelhos no interior e fez questão de fotografar tudo.
Para ela, foi prazeroso ter visto o cenário esbranquiçado e compartilhar o momento com seus três filhos, então crianças. Mesmo que caso semelhante seja raro, acredita que o dia se repetirá em Sério algum dia. A neve permaneceu por quase um dia e a sensação térmica era de -1oC.
Na manhã dessa sexta-feira, a temperatura ficou em 0ºC. Esquentou durante o dia, mas a temperatura mais elevada foi de 6ºC, às 13h.
Neve em Ilópolis
No inverno de 2000, foi registrada a ocorrência de neve em Ilópolis. O locutor esportivo Angelo Afonso de Encantado, na época com 5 anos, presenciou o fenômeno. Não lembra detalhes como o mês ou o dia, mas conta que faltou a aula no Colégio Cenecista Mário Quintana devido ao frio intenso. “Foi um fato marcante na minha vida, o primeiro contato com a neve.”