Cidade dos churrasqueiros envelhece

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Cidade dos churrasqueiros envelhece

Coqueiro Baixo chega aos 16 anos de emancipação com a maior proporção de idosos no estado, segundo IBGE. Dos 1.528 habitantes, 449 têm mais de 60 anos – um total de 29,38%. O município não atrai indústrias. Na estrada de acesso, o barro e poeira predominam e provocam êxodo desenfreado

Coqueiro Baixo – Centenas de jovens migraram, desde o fim da década de 1960, para outros estados motivados pela oportunidade de trabalhar em churrascarias. A maior leva, segundo o morador Gentil Dalpian, 72, saiu por volta de 1980. Seus quatro filhos são prova da tradição. Todos trabalham em restaurantes paulistas. “Não foram dois ou três. Ônibus lotados partiram em direção ao centro do país.”

cSem diversidade de emprego na cidade, a principal opção, de acordo com Dalpian, é a agricultura. Mas as condições do relevo limitam a atividade. O município é formado por montanhas rochosas de difícil cultivo agrícola. “Quem quiser futuro deve procurar fora. A churrascaria foi uma das alternativas. Aqui é bom de se viver, nada mais.”

Na cidade, apesar da fama, não há churrascaria. A precariedade do acesso restringe investimentos privados. As mais próximas estão em Encantado e Nova Bréscia, municípios vizinhos.

O precursor das churrascarias foi Albino Ongaratto (in memorian). Em 1967, abriu seu restaurante às margens da BR-116, em Curitiba, que teve como primeiro funcionário Adélcio Sestari, 66, prefeito de Coqueiro Baixo de 2008 a 2012.

Dois anos depois, Sestari tornou-se sócio do empreendimento. Juntos ampliaram o negócio e abriram churrascarias em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro – onde lançaram o sistema de rodízios, que até então funcionava por meio de mesas com bufê.

A nova maneira de servir foi um sucesso e, cada vez mais, jovens eram contratados para suprir a falta de garçons. “Meus parentes saíram pobres e hoje voltam riquíssimos. Constroem e gastam por aqui”, afirma o ex-prefeito.

Cita que o primeiro passo para garantir clientela foi a transferência das churrascarias para trevos de acesso a municípios, em vez dos postos de combustível. No local atraía-se motoristas e moradores dos bairros da cidade. Daí vem a tradição de cobrar mais barato para caminhoneiros do que para o motorista de carros. “A regra é que onde tem caminhão estacionado, tem boa carne.”

O próximo passo foi se instalar no centro da cidade. Com carnes selecionadas e preços mais elevados, os lucros ficaram maiores. Conforme Sestari, quem saiu da região há 30 ou 40 anos para construir uma nova vida, hoje retorna para o Vale, que parece um reduto da Itália, onde é mais fácil ouvir o italiano (ou os dialetos vêneto e bergamasco) do que o português.

Apesar da história, Nova Bréscia (município-mãe) detém o título de Capital do Churrasco. Para muitos, a coroação é injusta, pois foi na então localidade de Coqueiro Baixo que surgiram os primeiros especialistas em assar carnes.

Efeito colateral

A saída de jovens deixou o município com a maior proporção de idosos no estado: 29,38% têm mais de 60 anos. A terceira idade recebe atenção especial, pois é capaz de decidir qualquer eleição. Esse índice é quase três vezes maior que a média nacional (10,8% da população é idosa).

Pelas ruas, durante a semana, é difícil encontrar uma pessoa com menos de 40 ou 50 anos. O principal lazer é o carteado. São seis bares no centro. As festas da terceira idade sempre estão lotadas. É comum passar em frente às casas durante a tarde e encontrar um grupo de amigos numa roda de chimarrão.

Além do cenário agradável, de colinas verdejantes, vales floridos e límpidos rios de corredeira, os aposentados participam de cursos, encontros, palestras, bailes, danças e ginásticas (incluindo hidroginástica) promovidos pela administração municipal.

Sete carros oficiais estão à disposição dos 449 idosos locais para deslocamento por razões médicas ou educacionais. O maior desafio de gestores públicos é evitar que a cidade envelheça com seus moradores, correndo o risco de acabar.

Maior empresa fechou há três décadas

A Cooperativa Flor da Serra, fundada na década de 1930, foi a principal atividade econômica da região por quase 50 anos. Mais de 1,3 mil famílias estavam associadas e recebiam serviços e produtos em troca da parceria.

Havia dois moinhos que fabricavam farinha de trigo. O produto era vendido para todo o estado. “Ela sustentava toda a nossa agricultura quando não tínhamos um município formado, dando garantia de lucros aos nossos produtores”, ressalta o prefeito Veríssimo Caumo, 69.

Seu pai esteve à frente da cooperativa por muitos anos, de forma mais atuante na época de fundação. Apesar dos grandes líderes que comandaram o grupo nos primeiros tempos, Caumo diz que os sucessores foram incapazes de manter o cooperativismo. “Por incompetência, a Flor da Serra faliu.”

Os prédios ficaram. Um deles, usado para o depósito de produtos, está abandonado. O município reformou o antigo moinho para a instalação da Secretaria da Educação e o armazém foi adaptado para a instalação do mercado Conte.

O proprietário do estabelecimento, Sidnei Conte, 67, cita que chegou ao município em 2000, pouco antes da primeira administração municipal – o governo se iniciou um ano depois. Vê no cooperativismo a alternativa de garantir a permanência das pessoas. “Como estamos longe de tudo precisamos nos unir.”

Setor primário norteia economia

Desde o fechamento da cooperativa, nenhuma empresa de relevância econômica conseguiu se manter na cidade. Hoje, 90% da arrecadação de ICMS provém do setor primário. Deste montante, a criação de frangos representa 80%, e o restante é dividido entre a suinocultura e atividade leiteira.

Os setores da indústria, comércio e serviços são representados por estabelecimentos de menor porte, ligados aos ramos de alimentos, remédios, combustíveis, oficinas mecânicas, confecções e pequenos alambiques.

Caumo acredita que investimentos em tecnologia no campo são necessários para conter o êxodo rural. Observa que o relevo do município e distância em relação a cidades maiores, como Lajeado e Encantado, afastam mais os jovens.

Segundo ele, a qualidade de vida em Coqueiro Baixo é invejável. “Nossos filhos recebem uma boa educação e, com isso, também querem um futuro profissional melhor. Para eles, não serve o que oferecemos aqui.”

História

O município é desmembrado de Nova Bréscia e Relvado, por meio da da Lei Estadual n.º 10.765 de 16 de abril de 1996. Sua instalação ocorreu em 1º de janeiro de 2001, sob o governo de Veríssimo Caumo, presidente da comissão emancipacionista.

A origem do nome, segundo relato de moradores, se deu em 1850. Na época, chegaram à região os primeiros colonizadores, das famílias Gotardi, Sbaraini, Zanata, Justa, Weit e Propício. Ao se instalarem, perceberam uma grande quantidade de coqueiros e passaram a chamar a localidade de Coqueiro Baixo.

Outra versão informa que os colonizadores se instalaram próximo de um mato onde havia um coqueiro pequeno às margens de um córrego, hoje denominado Arroio Coqueiro Baixo.

O local onde existia a planta fica na bifurcação da Rua Vicente Mânica e a Av. Itália. Servia para o descanso e confraternização de viajantes que transitavam pela localidade com destino para Lajeado, que na época era o maior centro de comercialização de produtos agrícolas como banha, salames, copas, mel, nozes e outros. Em troca, os viajantes traziam sal, açúcar, ferramentas e utensílios usados na lavoura.

Conforme o IBGE, 30% da população reside na zona urbana e 70% na área rural, distribuída entre 16 comunidades.

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