Descaso com patrimônio histórico persiste

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Descaso com patrimônio histórico persiste

Um ano após reportagem mostrar abandono de prédios antigos, a situação piorou

Vale do Taquari – Sem uma legislação que proteja os prédios antigos do município, a história dos primeiros moradores de Lajeado segue ameaçada. Em fevereiro de 2012, administração municipal e Ministério Público (MP) anunciavam a criação de leis para preservar os patrimônios culturais do município. Um ano depois, o cenário é ainda pior.

pDos 35 prédios históricos catalogados no inventário em 1992 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Cultural do Estado (IPHAE), 12 foram demolidos. Outros estão em situação precária e com suas estruturas ruindo.

Em 2009, parte da platibanda – parede ou grade de pequeno porte que esconde o telhado – de uma antiga casa na rua Júlio de Castilhos caiu sobre uma lanchonete vizinha. Ninguém estava no local no momento da queda.

A situação de um dos patrimônios mais emblemáticos da cidade piorou nesse último ano. Localizada na Rua Osvaldo Aranha, a antiga residência do ex-prefeito lajeadense e deputado estadual pela União Democrática Nacional (UDN), Bruno Born, é uma das mais antigas na cidade. Lá funcionou, também, a agência do “Deustche Bank”, o Banco Alemão.

Com janelas e portas quebradas, o prédio foi invadido por usuários de drogas e serve de moradia para moradores de rua. A estrutura está a venda, e até os proprietários temem ir até o local. Mãe da dona da casa, Leonice Purper lamenta a situação. Diz que diversos móveis, objetos e documentos que estavam no local foram furtados. “Fizemos diversos Boletins de Ocorrência (BO), mas não adianta.”

A residência encabeça a lista de prédios históricos do inventário cultural do município. Em fevereiro de 2012, a administração municipal anunciou a intenção de comprar o imóvel por R$ 135 mil. “Por meio de emendas, tentaremos recursos para reformá-lo”, afirma na época o então secretário de Cultura e Turismo (Secultur), Gerson Teixeira. Uma das ideias seria transformá-lo em um museu.

O negócio emperrou e foi esquecido. “A venda estava definida, mas na última hora nos disseram que não havia dinheiro”, lembra Leonice. Ela se queixa da falta de incentivos para manter a estrutura em boas condições.

Afirma que a família dispõe apenas de um desconto no IPTU, mas em função da presença de árvores nativas no terreno. “É triste, mas como reformaremos sem incentivos.”

“É preciso uma lei que proteja os patrimônios”

A presidente do Conselho Municipal de Cultura, Ana Lúcia Pretto, defende a criação de um lei municipal que proteja os patrimônios históricos. Marques de Souza e Itapuca são duas cidades próximas que possuem essa legislação.

Dessa forma, o Executivo poderia repassar recursos para auxiliar nas reformas e manutenções do prédio. Também serviria para evitar que as estruturas originais fossem modificadas.

Hoje, todos os prédios catalogados podem ser demolidos ou remodelados. “Se não fizermos algo, em poucos anos perderemos nossas referências históricas.”

Sobre o Inventário do Patrimônio Cultural, diz que o trabalho foi realizado com critérios “duvidosos”. Lamenta o fato do documento não constar no Plano Diretor do município. “Isso evitaria demolições e modificações das estruturas originais.”

A historiadora defende a atualização do inventário. Lembra que houve negociações com o IPHAE e que o órgão se mostrou disposto. Falta apenas a iniciativa do poder público. “Muitos municípios despertaram para o valor histórico, e hoje o turismo gera renda para eles.”

Para a presidente do conselho, o exemplo de preservação do Parque Histórico Municipal de Lajeado é questionável. “Se trata de um parque temático, mas não histórico.” Ela afirma que os prédios antigos perderam parte de seus valores históricos ao serem retirados do local de origem.

Segundo a historiadora, o entorno e as localidades ondem as casas se encontravam também fazem parte do contexto avaliado por historiadores. “Em função disso, o parque teve negados diversos processos para angariar recursos.”

“A ideia de que o tombamento congela a edificação não é verdadeira”

Entrevista com o diretor do IPHAE, Eduardo Hahn

Qual a importância do tombamento de um prédio?

O tombamento reconhece a importância de uma edificação para a sociedade. A partir da sua finalização, o imóvel pode se utilizar das Leis de Incentivo à Cultura Estadual – LIC ou Federal – Lei Rouarnet, para a sua restauração. Tanto o poder público quanto os proprietários podem se utilizar de tais recursos. Centenas de edificações foram restauradas por todo o estado utilizando estes recursos.

Quem pode executar o tombamento?

O tombamento pode ser executado pelos municípios, por meio de sua secretaria ou conselho competente, pelo estado, por meio do IPHAE ou pela União, por meio do IPHAN.

O que é preciso para tombar um prédio?

Para tombar uma edificação em nível estadual é necessária uma solicitação formal, por meio de um documento, que será utilizado para a abertura de um processo administrativo que visa à análise do mérito da solicitação. Este processo deverá ser instruído com documentos necessários para a compreensão da edificação, de seu entorno e seu contexto histórico e social.

O que não é permitido fazer com um prédio tombado?

O tombamento impõe limitações quanto à demolição ou transformação do mesmo. Cada caso é avaliado individualmente quanto à riqueza de elementos decorativos, integridade da mesma, importância dos elementos existentes, etc. A ideia de que o tombamento congela a edificação não é verdadeira. São permitidas alterações visando a sua melhor utilização social, desde que não descaracterizem os elementos considerados relevantes durante o processo de tombamento.

Como você avalia o fato de apenas um prédio ser tombado pelo Estado na região do Vale do Taquari?

O fato pode representar o pouco valor dado pela sociedade local para os seus imóveis e para a sua história, o que resulta em uma busca de reconhecimento ineficiente. Grande parte do patrimônio do estado é desconhecido, pois a quantidade de inventários finalizados é pequena. O inventário deve ser utilizado como forma de proteção, e ser encaminhado, inclusive, para as Instituições Jurídicas, que podem auxiliar na proteção do patrimônio regional.

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