Haitianos recomeçam a vida na região

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Haitianos recomeçam a vida na região

Cerca de 200 refugiados trabalham em empresas gaúchas desde o início de 2010

Vale do Taquari -Cidades tomadas pela miséria, sobretudo pelos seguidos golpes militares e a dificuldade de implementação de políticas públicas, é cenário que haitianos refugiados no Brasil tentam esquecer. Em busca do recomeço, milhares ingressam no país à procura de trabalho e moradia. No estado são 200, muitos instalados no Vale do Taquari.

hOs primeiros chegaram no fim de 2010, período em que seu país foi devastado pelo maior terremoto registrado pelas Nações Unidas. Jackson Saint Louis, 29, é um exemplo. Ele está há um ano e cinco meses no Brasil. Sua primeira estada foi Tabatinga, no Amazonas.

Deixou para trás a mãe, irmã e namorada. Para ele, o Haiti não oferece condições dignas de se viver. Atribui a causa ao governo e o caracteriza como desorganizado. Lá trabalhava de carpinteiro, mas diz que por mais que as pessoas procurem, inexiste serviço. “A falta de infraestrutura provoca miséria, revolta e trás o caos. Buscamos uma vida nova aqui.”

O primeiro desafio a ser superado é o idioma, pois no seu país a principal língua é o dialeto crioulo haitiano. Aos poucos, tenta se acostumar, embora ainda tenha dificuldade em se comunicar por meio do português. “Nada como um dia após o outro”, acrescenta.

Desde que está no Brasil, já trabalhou em uma empresa especializada em iluminação e em uma fábrica de industrialização de trigo. No mês passado, proposta de uma construtora e fabricante de tijolos e blocos de concreto convenceu Louis a se mudar para Santa Clara do Sul acompanhado por quatro amigos, com idade entre 24 e 38 anos.

A empresa funciona no centro da cidade e buscou a mão de obra dos haitianos mediante a dificuldade de encontrar profissionais na região. O sócio-gerente da Eco Bloco, Paulo Natalício Eifler, 43, elogia o empenho dos cinco compatriotas.

Comprometidos com o trabalho

Uma das principais vantagens apontadas pelo empresário é o comprometimento dos haitianos. “Enquanto isso, os trabalhadores locais não mostram interesse em evoluir. Querem altos salários, mas não querem trabalhar por isso.”

Dos cinco colegas que chegaram à região dia 30 de outubro, só um não tem união estável. Três se comunicam por meio do português. Alguns também dominam o inglês e o francês. Eifler ressalta que inexiste benefício por contratá-los. “As pessoas falam que recebemos (a empresa) redução de impostos e outras coisas, mas são trabalhadores como qualquer brasileiro.”

A fábrica forneceu alojamento equipado com ar-condicionado e internet móvel, para que mantenham contato com os familiares. Oferece, ainda, café da manhã, almoço e lanche da tarde. “Fazemos de tudo para agradar o pessoal e queremos que eles fiquem morando aqui.”

A região contenta Louis. Ele pretende constituir moradia fixa e trazer seus familiares para residir na cidade. Ressalta os benefícios do Vale, como a boa estruturado, segurança e ofertas de emprego. Sem desigualdades.

Chegada ao RS

Em outubro, o sócio-proprietário Fabrício Adams contatou empresas de Lajeado que trabalham com haitianos para saber como contratar os serviços. O pedido foi encaminhado a Manaus e em duas semanas, os compatriotas desembarcaram no Aeroporto Salgado Filho. A fábrica santa-clarense se responsabilizou em pagar todos os gastos de deslocamento para cada um. Eifler lembra que os haitianos estavam há mais de 30 horas sem se alimentar.

Sua permanência no Brasil é livre devido a um decreto de paz, mas cada um precisa se apresentar à Polícia Civil a cada ano ou em caso de troca de endereço.

Entrada no Brasil

São cerca de 200 imigrantes que desembarcaram em solo gaúcho e hoje se espalham por diversos municípios. Cinco mil haitianos chegaram ao país logo após o terremoto que devastou Porto Príncipe, em 2010. A entrada é feita, em especial, pelos estados do Amazonas, Acre e Rondônia.

As cidades de Basileia e Tabatinga são conhecidas nacionalmente pela concentração de imigrantes. As empresas nacionais viram neles uma forma de suprir a falta de mão de obra. Todos os dias, milhares de pessoas se concentram nesses locais na esperança de serem recrutadas.

“Há uma troca de cultura incrível. A única coisa que ouço é pedidos para trazer mais haitianos para servir às empresas. Eles são obstinados e disciplinados”, observa o padre Valdecir Mayer Molinari, responsável pela paróquia São Geraldo, de Manaus, que agencia a entrada dos haitianos no país.

Sobre o Haiti

País mais pobre da América Latina e com uma situação política tão complicada quanto seu quadro social, o Haiti é motivo de preocupação mundial. Tanto que desde 2004 existe a Missão das Nações Unidas para a Estabilização no país (Minustah), que conta com a presença do Exército brasileiro.

Apesar de notar alguns avanços após o período de pacificação, que terminou em 2007, os militares que voltam de lá ainda apontam um cenário de caos na capital Porto Príncipe: esgoto a céu aberto, falta de água, desnutrição e abuso sexual. A situação se complicou ainda mais com o terremoto que matou cerca de 222 mil pessoas em 2010.

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